Nos EUA, consumidor é rastreado e estratégia muda rapidamente

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Na internet, cada clique e zigue-zague do mouse ajuda as empresas de varejo a personalizar sites e maximizar a probabilidade de compra. As lojas físicas tradicionais há muito desejam acompanhar os consumidores de forma parecida, mas acompanhar átomos é bem mais complexo do que acompanhar bits. Na maioria das vezes, as lojas convencionais se contentaram em recorrer a pesquisas sobre os consumidores, diz Herb Sorensen, assessor da empresa de analises de mercado TNS Retail & Shopper, em Londres. "O problema com pesquisas é que o consumidor pode dizer uma coisa e fazer outra."

Para entender melhor os clientes on-line, as operadoras de shopping centers vêm monitorando o comportamento dos consumidores com aparelhos que acompanham os sinais dos celulares, enquanto varejistas, como Montblanc, T-Mobile e Family Dollar Stores, encontram novos usos para antigas ferramentas como as câmeras internas de segurança. O objetivo é adivinhar que variáveis afetam as compras e, então, agir com rapidez, deslocando homens de vendas, alterando mostradores ou colocando blusas vermelhas em vez de azuis. Até recentemente, as "lojas eram como um buraco negro", diz Alexei Agratchev, CEO da consultoria RetailNext. "As pessoas se convenciam de que algo era verdade e gastavam dezenas de milhões com base nisso", sem evidências que as sustentassem.

A Montblanc começou a testar a análise de vídeos da RetailNext em Miami há seis meses e as vendas cresceram 20%

Agratchev diz que a RetailNext foi fundada em 2007 para mudar isso. A empresa ajuda varejistas a entender melhor o comportamento dos consumidores. Na maioria dos casos, a empresa recorre a vídeos dos sistemas de câmeras de segurança que as lojas já têm. Esses dados servem para alimentar um software da RetailNext, que analisa os vídeos e os relaciona com os números de vendas. O programa pode integrar dados de aparelhos como chips de identificação de radiofrequência (RFID, na sigla em inglês) e sensores de movimentos que detectam, por exemplo, quantas vezes uma caixa de determinada marca de cereal é levantada ou quantos clientes viram à esquerda quando entram na loja.

A empresa tem 40 clientes varejistas, entre os quais a American Apparel e a Family Dollar, além de 20 que estão testando o sistema. Por exemplo: empresas de alimentos pagam a mais para que seus produtos sejam expostos no fim de corredores. Segundo a RetailNext, porém, o consumidor presta mais atenção em produtos colocados no centro dos corredores.

A varejista de artigos de luxo Montblanc começou a testar a análise de vídeos da RetailNext em uma loja em Miami há seis meses. Os funcionários usam o serviço para criar mapas mostrando que partes da loja têm mais tráfego de pessoas e decidir onde colocar as decorações internas, vendedores e mercadorias. Rodrigo Fajardo, gerente de marcas da Montblanc em Miami, diz que as análises ajudam a tomar decisões com mais rapidez. "Não levamos seis meses para fazer mudanças", diz. "Analisamos uma semana e na semana seguinte estamos fazendo as mudanças." Ele diz que o software ajudou a elevar as vendas em 20% e que a Montblanc pretende expandir seu uso para mais de dez pontos de venda.

A T-Mobile emprega uma tecnologia similar, da 3VR, uma fabricante de sistemas de segurança de San Francisco. Há dois anos, executivos da 3VR perceberam que suas câmeras poderiam ser usadas para reunir dados sobre o consumo, de acordo com o CEO da empresa, Al Shipp. Ele diz que a T-Mobile, em Bellevue, Washington, usa a tecnologia em algumas de suas lojas de varejo para acompanhar como as pessoas se locomovem, quanto tempo ficam em frente aos mostradores e que telefones pegam para ver de perto e por quanto tempo. A T-Mobile não quis comentar o assunto.

Shoppings alertam clientes para desligarem o celular se não quiserem ser monitorados, mas prática é polêmica

Atualmente, a 3VR testa um software de reconhecimento facial que pode identificar o gênero e idade aproximada do consumidor. O programa dará aos varejistas mais conhecimento sobre as faixas demográficas dos clientes e ajudará a fazer promoções sob medida, diz Shipp. "Algum dia, teremos capacidade para avaliar cada indicador imaginável. Estamos apenas começando a conhecer a superfície."

Alguns varejistas vêm instalando equipamentos para acompanhar os compradores via celulares. A Path Intelligence, empresa de Portsmouth, na Inglaterra, começou a vender uma tecnologia em 2009 que detecta o sinal de celulares e pode rastrear a movimentação de quem estiver com o telefone dentro de um prédio. Atualmente, o sistema é usado principalmente em centros comerciais na Europa. Segundo a empresa, é possível detectar a locomoção de mais de 1 milhão de clientes por dia. Alguns varejistas usam os dados para definir onde instalar lojas, segundo a CEO da Path Intelligence, Sharon Biggar. Outros usam o sistema para descobrir a nacionalidade dos clientes, detectando o código do início dos números de telefone.

Os shopping centers que usam o sistema, chamado FootPath, colocam placas na entrada e nos mapas de localização das lojas informando os clientes de que seus celulares estão sendo rastreados e que devem desligar os aparelhos se não quiserem ser monitorados. Rastreamentos desse tipo preocupam grupos de defesa da privacidade. David Jacobs, pesquisador do Electronic Privacy Information Center, diz que é "impraticável" sugerir aos consumidores o desligamento dos celulares.

A Path Intelligence informa que não grava a identidade de ninguém e altera alguns dos dígitos dos números de celular antes de armazená-los. "Projetamos este serviço de forma que seja impossível detectar qualquer informação pessoal ou associar o número a uma pessoa", diz Biggar.

Nem todos se sentem confortáveis com a ideia. Em novembro, o Short Pump Town Center, em Richmond, Virgínia, e o Promenade Temecula, na Califórnia, começaram a testar o FootPath pela primeira vez nos Estados Unidos. O teste foi cancelado um dia depois, por reclamações do senador Charles E. Schumer (democrata por Nova York) de que a tecnologia poderia comprometer a privacidade dos consumidores. "Gostaríamos de resolver as preocupações sobre privacidade antes de seguir adiante", diz Julia Yuryev, da Forest City Commercial Management, proprietária dos dois centros comerciais. A J.C. Penney testou a tecnologia em uma loja, mas não tem planos para efetivá-la, segundo Rebecca Winter, porta-voz da rede. "Quanto mais se foca no comprador, maiores são os riscos", diz Jacobs. Mark Rasch, diretor de segurança on-line e privacidade da CSC, uma consultoria em Falls Church, Virgínia, diz que rastrear telefones ou usar câmeras "não é mais invasivo do que [as práticas que] as varejistas on-line fazem".

Essas ferramentas deverão tornar-se mais comuns se outros varejistas puderem repetir o sucesso da Montblanc no aumento das vendas. "É realmente uma experiência que muda as regras do jogo e este é apenas o começo", diz Fajardo, da Montblanc. "Antes, estávamos trabalhando apenas com base em certo know-how e intuição. Isto se trata de planejar o negócio de varejo com base em estatísticas reais." (Tradução de Sabino Ahumada)


Veículo: Valor Econômico


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