Andrews Bortey escolhe, junto com a esposa, uma mesa no Tsui Anaa - um pub cuja tradução é algo como "A Paciência Compensa" - em Accra, a capital de Ghana, depois de um dia de trabalho como pescador. Ele pede uma Chibuku e dá uma chacoalhada vigorosa na cerveja antes sorver a bebida densa e de aparência leitosa. A Chibuku, vendida em embalagens de papelão azul e branco, é chamada de "Shake-Shake" pelos aficionados porque os ingredientes tendem a se separar, deixando uma pasta parecida com iogurte no fundo. Esse resíduo pode incomodar alguns apreciadores de cerveja ocidentais. Mesmo assim, a SABMiller, conhecida por cervejas límpidas como a Peroni, a Grolsch e a Miller Lite, além da Castle Lager da África do Sul, está contando com a bebida favorita de Bortey para entrar no mercado de cerveja do continente africano, que vem crescendo em ritmo acelerado.
Com a desaceleração do consumo de cerveja na Europa ocidental e nos Estados Unidos, fabricantes globais de cerveja como SABMiller, Diageo e Heineken esperam ganhar participação de mercado entre a crescente classe média na África. A receita obtida pela SABMiller no primeiro semestre do ano passado com os países africanos, excluindo a África do Sul, cresceu 22% para US$ 1,8 bilhão. (Uma encarnação anterior da companhia vem vendendo cerveja na África do Sul desde 1895.)
Com a Chibuku, a SABMiller está tentando conquistar os africanos de baixa renda, mais acostumados com as cervejas "informais", de produção caseira. "Isso está atraindo consumidores de um novo nível de renda para a categoria", afirma Michael Steib, analista do Morgan Stanley. "Com o aumento da renda, há espaço para melhorar o padrão dos consumidores."
A SABMiller, a segunda maior fabricante de cerveja do mundo, perdendo apenas para a Anheuser-Busch InBev, está investindo US$ 260 milhões na África este ano, em parte para ampliar a produção da Chibuku, vista como uma alternativa comercial a uma bebida à base de milho e sorgo chamada Brukutu, tradicionalmente produzida e consumida em casa. "Ela tem o sabor da Brukutu", diz Bortey. Sua esposa, Patricia Kaa, acrescenta que a bebida da SABMiller não só é mais fácil de ser encontrada, como também é melhor produzida. "Ao contrário da Brukutu, sabemos que a Shake-Shake é preparada sob condições ideais de higiene", diz ela.
A Chibuku chega a custar 40% menos que as cervejas tradicionais, segundo Wes Tiedt, diretor-gerente da National Breweries, uma unidade da SABMiller. Bares de Gana vendem a embalagem de papelão de 1 litro por 1 cedi (58 centavos de dólar) a 1,3 cedi. A bebida tem uma vida útil de cinco dias, uma vez que continua fermentando dentro da embalagem de papelão, tornando-se mais alcoólica - a graduação é de 3%, podendo chegar a 5% - e mais amarga. O estilo de cerveja densa foi formalizado na Zâmbia na década de 1950, quando o mestre-cervejeiro Max Heinrich escreveu a fórmula e os habitantes locais a batizaram de chibuku, que significa "de acordo com o livro". Hoje, ela está bem estabelecida em Malawi, Botsuana e Zâmbia. A SABMiller pretende vender a bebida em 12 países africanos dentro de três anos.
A SABMiller não é a única fabricante de cerveja que almeja crescer na África. A Diageo, mais conhecida por sua vodca Smirnoff e pelo uísque Johnnie Walker, comprou uma cervejaria na Etiópia por US$ 225 milhões em janeiro. E a holandesa Heineken adquiriu cinco cervejarias na Nigéria e duas na Etiópia no ano passado. Mas elas estão basicamente se atendo às cervejas ao estilo ocidental.
O potencial de vendas das cervejas africanas mais densas não é pequeno. A SABMiller previu em 2009 que o mercado africano de cervejas de produção caseira pode estar avaliado em US$ 3 bilhões ao ano. Tiedt estima que o mercado de cervejas informais é cerca de quatro vezes maior que o das cervejas claras na África. A National Breweries tem cerca de 60% do mercado das cervejas opacas na África e uma capacidade anual de produção de 1,8 milhão de hectolitros. "Somos os únicos a fazer isso comercialmente", diz Tiedt. "Trata-se de uma oportunidade enorme."
A maneira como os aficionados consomem a Chibuku varia de país para país. Em Malawi, a parte de cima da embalagem de papelão é cortada e a cerveja é passada entre amigos. Em Zâmbia, a cerveja é bebida em copos. O sabor também varia de mercado para mercado, uma vez que a SABMiller atende as preferências locais e usa ingredientes como milho e sorgo maltado produzidos perto das fábricas, diz Tiedt.
Distribuir uma cerveja com prazo de validade de apenas cinco dias é difícil, especialmente nas áreas rurais, que não possuem vias pavimentadas, o que limita o mercado da SABMiller. Mary Abotse começou a vender a Chibuku em seu pub Tsui Anaa, em Accra, em julho. Ela diz que embora os clientes estejam entusiasmados com a bebida, ela não forma estoque devido ao seu prazo de validade curto. "Compro um engradado com 15 unidades", diz ela. "Meu estoque acaba em quatro dias."
A SABMiller acredita ter a solução para este problema: a Chibuku Super. O produto, que está passando por um teste de mercado em Zâmbia, é vendido em embalagens plásticas à prova de vazamentos e tem validade de 21 dias. "Acho que isso vai mudar o jogo para nós. Não se trata mais necessariamente de uma bebida de consumo presencial", diz Tiedt.
Veículo: Valor Econômico