Na semana passada, mais dois fabricantes acordaram e sentiram o cheiro do café - ou das caras cápsulas de café que proporcionaram no ano passado mais de 3,5 bilhões de francos suíços em vendas para a Nestlé, a maior companhia de alimentos do mundo.
A máquina de preparar café Nespresso da Nestlé foi chamada pelo analista Jamie Isenwater do Deutsche Bank de "a coisa mais parecida com uma marca de luxo dentro do segmento de bens de consumo de rápida circulação". Ela opera em um sistema "fechado" de máquina e cápsula que visa impedir o uso de um café concorrente. O modelo de negócio resulta em uma maior densidade de vendas em suas lojas do que na Louis Vuitton, diz Isenwater.
Na semana passada, a Starbucks e a Dualit, companhia britânica de capital fechado conhecida por suas torradeiras de visual retrô, anunciaram esforços para abocanhar mais participação neste mercado que movimenta cerca de US$ 6 bilhões ao ano.
A Nestlé não vê nada de lisonjeiro nesse tipo de imitação e vem lutando contra ela nos tribunais, e também através de uma comercialização e distribuição altamente controlada.
Alex Gort-Barten, diretor da Dualit, compara o sistema fechado da Nestlé a "eu dizer a você que você só pode colocar meu pão em uma torradeira Dualit". Ele acrescenta: "Trata-se de um monopólio totalmente cativo, mas ele está começando a enfraquecer nas pontas porque as pessoas estão encontrando meios de burlar o sistema".
A Dualit, além de lançar suas próprias cápsulas, pretende lançar suas próprias cafeteiras este ano. A Starbucks, que começou a vender cápsulas no fim do ano passado, está lançando suas máquinas Verismo através de uma aliança com a Krueger, uma companhia de capital fechado da Alemanha.
"O sofisticado segmento 'single-cup' é o negócio que mais cresce na indústria mundial do café", disse na quinta-feira Howard Schultz, presidente da Starbucks, ao anunciar o lançamento de sua cafeteira.
Projeções da Euromonitor indicam que o mercado estará movimentando US$ 8,5 bilhões por ano dentro de cinco anos.
A Europa passa por um momento de austeridade e não tem sido um mercado animador para muitos fornecedores de bens de consumo, mas é onde a guerra do café vem ocorrendo de maneira mais feroz. Supermercados, que estão lançando suas próprias versões e enchendo as prateleiras com cópias das cápsulas da Nestlé.
A Ethical Coffee Company, criada por Jean-Paul Gaillard, um ex-diretor da marca Nespresso, espera mais que dobrar as vendas de suas cápsulas este ano e também está criando sua primeira cafeteira, que vai aceitar as cápsulas dos concorrentes, e deverá ser lançada no Reino Unido e na Bélgica este ano.
Gaillard não se deixa abater pela série de patentes registradas e processos movidos por sua ex-empresa. A Ethical Coffee está com seu próprio caso contra um réu não revelado na França, por supostos atos de espionagem industrial e calcula que existem apenas seis patentes principais sobre as cápsulas da Nespresso, sendo que ele considera metade delas irrelevantes. "Resumindo, temos mais processos contra a Nestlé do que eles contra nós. Não estamos infringindo nenhuma de suas patentes", afirma ele.
A Nestlé discorda. "Enquanto líderes da categoria, continuaremos adotando as medidas apropriadas para proteger a propriedade intelectual que vem conduzindo o crescimento e a inovação tanto para a Nespresso quanto para o segmento de café em porções", disse a companhia no ano passado.
Essa proteção é tão forte que a Nestlé nem mesmo revela se a Nespresso funciona com as cápsulas concorrentes. A resposta, segundo comerciantes varejistas das máquinas e concorrentes como a Dualit e a Ethical Coffee, é sim.
Os sinais bem iniciais de que os concorrentes estão mordiscando o território da Nespresso podem ser vistos no ainda vigoroso, mas em desaceleração, crescimento das vendas. Em 2006, o sexto ano consecutivo de alta nas vendas de mais de 30%, o faturamento superou 1 bilhão de francos suíços. Em 2010, o crescimento das vendas, sobre o mesmo período do ano anterior, ficou acima de 20%; no ano passado foi de cerca de 20%.
É claro que isso ainda representa uma grande distância da maioria dos outros produtos de consumo. Também representa um adicional de 500 milhões a 700 milhões de francos em vendas a cada ano, segundo cálculo do Deutsche Bank, a partir de uma base elevada e mais do que suficiente para pagar as despesas legais.
Nestlé defende patente na Justiça
No quarto de século desde o lançamento da marca Nespresso, a Nestlé vem buscando proteger sua "mina de ouro" através de uma série de patentes, que ela vem defendendo com firmeza nos tribunais.
Milhares de patentes separadas envolvem tanto as cápsulas individuais de café e sua composição, como o "sistema de liberação" das máquinas, que injeta vapor e água no produto. Embora as cápsulas sejam produzidas pela própria Nespresso, que agora está investindo cerca de 500 milhões de francos suíços (US$ 544 milhões) em uma segunda fábrica, substancialmente maior que a primeira, as máquinas são fabricadas por terceiros.
No entanto, a infantaria da proteção legal da propriedade intelectual da Nestlé não conseguiu impedir as cópias. Hoje há cerca de 50 sistemas diferentes no mercado.
As atenções da Nestlé estão voltadas para os concorrentes que estão produzindo cápsulas que podem ser usadas nas suas máquinas. Invariavelmente, estas são mais baratas que as cápsulas Nespresso, às vezes até 50%.
Há três desafios legais importantes para a Nestlé. Na Suíça, a Denner, subsidiária de produtos de baixos custos da Migros, maior rede de supermercados do país, lançou no ano passado concorrentes compatíveis a preços menores. A Nestlé venceu as rodadas iniciais da disputa legal.
Um segundo desafio vem da Ethical Coffee Company, criada por um ex-executivo da Nespresso. Na França, Bélgica e Holanda, a Nestlé moveu ações legais contra a companhia Sara Lee.
Os planos de produtos representam os segredos mais bem guardados da Nestlé. Mas especulações indicam que a companhia está desenvolvendo uma tecnologia de identificação que permitirá às futuras cafeteiras reconhecer e funcionar apenas com as cápsulas da Nespresso. De uma maneira que lhe é característica, a Nespresso não quis comentar o assunto.
Veículo: Valor Econômico