Foi no filme "Lost in Translation" (Encontro e Desencontros) da diretora Sofia Coppola que a destilaria japonesa Suntory ficou mais conhecida ao redor do mundo. Na obra de 2003, Bill Murray interpreta um ator decadente que vai ao Japão gravar um comercial de uísque da marca. Um ano depois, em 2004, a companhia, que por três décadas vinha exportando bebidas ao Brasil, decidiu sair do mercado brasileiro. Volta, agora, e estuda engarrafar aqui o uísque fabricado no Japão.
A engarrafadora seria a primeira da Suntory fora do Japão. Desde dezembro, a empresa vende dez produtos no Brasil, importados e distribuídos pela Tradbras. A meta para 2015 é importar 50 mil caixas com 12 garrafas e faturar US$ 10 milhões no Brasil.
"A companhia pensou em uma engarrafadora. O Brasil seria o primeiro lugar a ter isso", disse ao Valor o presidente da Suntory Brasil, Tatsushi Yoshida. "Ainda não decidimos. Mas ainda é uma opção."
A ideia de engarrafar no Brasil surgiu quando a Suntory decidiu voltar ao país, onde vendeu seus produtos durante três décadas. Em 2004 deixou de operar aqui. "A economia do Brasil não estava tão boa e a inflação era alta", diz Yoshida. Naquela época, fechou também o restaurante Suntory, nos Jardins, em São Paulo, do qual era proprietário. No local, funciona o Shintori, com novos donos.
O portfólio da Suntory no Brasil tem dez produtos: cinco uísques, dois licores e três "schochu", destilado parecido com o sakê (fermentado) e concorrente da vodca. O Kakubin é o uísque mais barato; o Hibiki 17 anos custa R$ 650.
Se o plano vingar, o rótulo a ser engarrafado aqui deve ser o Kakubin, produto mais popular do grupo. No filme de Sofia Coppola, é o Hibiki 17 anos que aparece.
Engarrafar no Brasil permitiria à Suntory reduzir o preço da garrafa do Kakubin, em torno de R$ 120, e posicionar a bebida junto às marcas que dominam o mercado brasileiro de uísque. A principal é a Johnnie Walker, da Diageo. Os rótulos de oito e 12 anos da Johnnie Walker custam até R$ 100. Outro uísque 12 anos popular no Brasil, o Chivas Regal, da Pernod Ricard, também sai por este preço no varejo. "[O Kakubin] Ainda é caro em comparação com Johnnie Walker", diz Yoshida.
A empresa atua em diversos setores. Fabrica bebidas alcoólicas, sucos e cosméticos e gerencia redes de restaurantes. Em 2012, as vendas do grupo somaram US$ 21,8 bilhões, e o lucro líquido chegou a US$ 423,1 milhões.
Segundo a consultoria Euromonitor, o mercado de uísque no Brasil cresceu 1,9% em valor, para US$ 2,8 bilhões, e 4,4% em volume em 2012. Foi a única categoria entre os destilados (considerando também "aperitivo", rum, tequila e vodca) analisados que cresceu em valor comparando com 2011, e foi a terceira maior alta em volume.
Yoshida diz que há espaço para competir com marcas tradicionais, pois os destilados premium crescem 25% ao ano enquanto a venda de bebida barata encolhe. "A economia brasileira está crescendo e o mercado premium cresce com ainda mais força. E nossos produtos são premium."
A comunidade japonesa de São Paulo é a maior fora do Japão e a Suntory quer aproveitar isso como canal de introdução dos produtos. "A Diageo é grande concorrente. Mas não batemos de frente. A nossa concorrência não foca em nada japonês", diz Yoshida, acrescentando que os clientes de restaurantes japoneses estariam mais propícios a provar o uísque da Suntory. "Não é competir, mas dar ao consumidor a oportunidade de conhecer outra categoria de produtos", diz Miki Shimizu, diretora de marketing da Suntory.
A expansão da Suntory não se limita ao Brasil. Em setembro, o conselho de administração aprovou oferta de compra de duas marcas de bebidas pertencentes ao grupo GlaxoSmithKline por 1,35 bilhão de libras (US$ 2,11 bilhões). A empresa também foca em Taiwan, diz Yoshida: "Estamos tentando aumentar nossas vendas em geral, não de apenas uma marca".
Por um ano, a Suntory estudou o mercado brasileiro. Liderados por Yoshida, executivos visitaram Rio e São Paulo para observar o potencial de consumo de clientes endinheirados de bares e restaurantes. "Em 2004 a culinária japonesa não estava tão em alta", diz ele. "Agora vemos jovens em restaurantes muito caros, e assumimos que nosso uísque teria público".
Importação e distribuição estão a cargo da Tradbras, que já fez este trabalho na primeira fase da Suntory no Brasil. Por enquanto, três pessoas tocam o escritório da multinacional em São Paulo. No mundo, são 28 mil funcionários.
Veículo: Valor Econômico