O secretário-adjunto da Receita Federal, Luiz Fernando Teixeira Nunes, disse que o Fisco concluiu os estudos sobre os cenários econômicos e medidas que podem ser implementadas para elevar a arrecadação este ano e compensar o aporte adicional de R$ 4 bilhões que o Tesouro fará ao setor elétrico, anunciado no último dia 13. As análises preveem elevação de impostos de setores como cosméticos e bebidas frias (refrigerantes, cervejas, isotônicos, energéticos e água).
O socorro total anunciado no último dia 13 foi de R$ 12 bilhões. Desses, R$ 8 bilhões dizem respeito a financiamentos que poderão ser contratados no mercado pela Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), para que as distribuidoras possam pagar as geradoras. A proposta orçamentária fechada em agosto do ano passado destinava um aporte do Tesouro de R$ 9 bilhões na Conta de Desenvolvimento Energético (CDE). Com a promessa de um adicional de R$ 4 bilhões, o valor chega a R$ 13 bilhões. Mas o mercado estima que esse montante pode chegar a R$ 18 bilhões no fechamento do ano.
Ao anunciar o novo socorro ao setor elétrico, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, informou que o custo adicional será compensado pelo aumento de tributos e também com a reabertura de programas de parcelamentos de dívidas tributárias, como o Refis da Crise.
"Dentro das demandas colocadas, apresentamos alguns cenários, construímos alguns cálculos, algumas medidas que estão em via de implementação. Enquanto as medidas não forem implementadas, não temos como afirmar que tributos (vão subir) e em que momento isso vai acontecer", disse o secretário da Receita nesta terça-feira. "São setores que vocês já conhecem, cosméticos, bebidas frias", acrescentou Teixeira Nunes.
Ele ressaltou que, agora, a decisão cabe ao Ministério da Fazenda e à Casa Civil. "Os estudos foram feitos e a construção de cenários foi realizada", ressaltou.
O governo enfrenta um cenário difícil este ano para o cumprimento das metas fiscais. Com o corte de R$ 44 bilhões no Orçamento anunciado no mês passado, o governo federal fixou em 1,9% do Produto Interno Bruto (PIB), ou R$ 99 bilhões, a meta de superávit primário do setor público consolidado - que inclui governos central, estaduais, municipais e empresas estatais. O objetivo dessa economia é pagar juros da dívida pública e permitir a redução da dívida líquida do país em proporção ao PIB.
Entenda a crise
O nó vivido atualmente pelo setor elétrico, um dos grandes motivadores da redução da classificação do Brasil pela agência de risco Standard & Poor's, é uma combinação de três grandes problemas: interferência política, falta de chuvas e atrasos em investimentos. Ninguém sabe ainda, ao certo, qual será o tamanho do rombo no setor. Embora o governo fale em R$ 9 bilhões, há quem diga que a conta pode superar os R$ 21 bilhões, algo semelhante ao orçamento do "Minha Casa, Minha Vida", programa "xodó" da presidente Dilma Rousseff, ou o suficiente para bancar dez meses do Bolsa Família.
O problema começou em meados de 2012, quando o governo decidiu forçar uma queda no preço da energia elétrica para famílias e empresas. A redução perseguida era de 20% e seria obtida com a antecipação da renovação das concessões das empresas do setor elétrico, que teriam maior prazo para atuar em troca de uma queda nos preços. Três grandes empresas estatais estaduais (Cesp, Cemig e Cepal, coincidentemente de três estados administrados pela oposição ao governo federal) não aderiram ao polêmico programa, mas o governo decidiu, mesmo assim, manter o patamar de redução perseguido, o que iniciou o processo de subsídios no setor.
Em 2013, o país começou a sofrer falta de chuvas e aumento de consumo - grande parte deste aumento incentivado pelo próprio governo com o preço da tarifa menor, com a redução de tributos sobre eletrodomésticos e com o programa "Minha Casa Melhor", que visava equipar de eletrodomésticos as residências do "Minha Casa, Minha Vida".
Para piorar, diversas obras do setor elétrico estão atrasadas e há casos, inclusive, de geração eólica em funcionamento, mas que não atendem ninguém por falta de linhas de transmissão. Segundo especialistas, as obras emperradas poderiam abastecer até 25 milhões de pessoas, ou 12% da população nacional. Para dar conta da demanda crescente, o governo decidiu ampliar o uso de usinas termelétricas, que tem custo de geração de energia mais caro que o das hidrelétricas. Pelas regras do setor, os desequilíbrios entre os custos e os valores obtidos pelas empresas são equalizados no ano seguinte.
Porém, 2014 começou com mais problemas: a estiagem ficou mais forte e os reservatórios de algumas hidrelétricas chegaram aos piores índices desde o racionamento de 2001. Assim, a conta das termelétricas, que já era alta, só fez aumentar: atualmente, quase toda a capacidade disponível deste tipo de energia está em operação. E o governo decidiu não repassar aos consumidores as contas do setor de 2013 devido ao impacto impopular desta medida em ano eleitoral. Para especialistas em contas públicas, este rombo inviabiliza o cumprimento da meta de superávit do ano, de 1,9% do PIB, por si só considerada baixa, inferior à esperada pelo mercado, de 2,1% do PIB e muito aquém dos superávits da década passada, próximos de 3% do PIB. E, fontes do setor, lembram ainda que, mesmo com tudo isso, não está descartado um racionamento, pois os níveis dos reservatórios seguem baixos e o consumo continua crescendo, como fez no verão com a onda de calor recorde no país.
Veículo: Diário de Pernambuco