O novo modelo de tributação de bebidas frias, já acordado entre o governo e empresas, aumentará a carga do setor em 10% já no próximo ano. A mudança trará um adicional de arrecadação de R$ 1,5 bilhão em 2015.
O governo espera, porém, que o aumento não seja repassado para os preços - o entendimento é que já houve um reajuste nas bebidas este ano com a expectativa de alta de impostos. O setor de bebidas frias inclui cerveja, água, refrigerantes, energéticos e isotônicos.
A mudança na tributação - que será apresentada como emenda à Medida Provisória 656, que aguarda votação no Congresso Nacional - deve aumentar ainda mais a arrecadação do governo federal nos anos seguintes, já que o novo modelo será implementado gradualmente. Como antecipou o Valor PRO, serviço de informações em tempo real do Valor, na terça-feira, o imposto a pagar será reduzido em 5% a 20%, de acordo com o produto, até 2018, quando serão cobradas as alíquotas cheias.
"Fizemos esse desconto para não ter impacto grande no preço", explicou uma fonte envolvida na negociação.
Outra novidade do modelo é que as distribuidoras também serão tributadas, para evitar sonegação. Isso porque a tributação será "ad valorem", ou seja, uma alíquota fixa incidirá sobre o preço dos produtos.
Como na maioria das vezes indústria e atacadistas são do mesmo grupo, o governo temia que, se não fosse cobrada uma alíquota na distribuição, o preço no fabricante poderia ser subfaturado para reduzir a base de cálculo tributária.
As alíquotas das contribuições incidentes na fabricação e importação de bebidas frias será de 2,32% para o PIS/Pasep e 10,68% da Cofins. No caso de vendas feitas na distribuidora atacadista, a alíquota é reduzida: 1,86% para o PIS/Pasep e 8,54% da Cofins. Com isso, será gerado um crédito tributário para a distribuidora que deverá ser igual ao valor pago na indústria, ressarcindo totalmente o valor pago pelo atacadista e resultando em uma carga de 10,4% sobre toda a cadeia nas duas contribuições.
Já o recolhimento do IPI será feito apenas na fabricação. Será cobrada alíquota de 6% sobre cervejas e 4% nas demais bebidas.
A avaliação no governo e no setor é que a tributação "ad valorem" será mais justa e beneficiará os pequenos produtores. Até agora, a tributação no setor de bebidas é feita por um regime "ad rem", em que é realizada uma pesquisa de preços médios que são definidos como base de cálculo para a incidência dos tributos. No modelo atual, a alíquota de IPI varia de 10% a 15%, a de PIS/Pasep é de 2,5% e a da Cofins 11,9%, mas há diferentes redutores da base de cálculo de acordo com o tipo de bebida.
Isso beneficia os grandes produtores, que têm preço mais alto em seus produtos "premium" e, proporcionalmente, acabam pagando menos impostos.
O novo modelo pretende reduzir as distorções competitivas e dar mais previsibilidade para o setor. Com as alíquotas fixas, paga mais quem cobra mais.
O governo estipulou ainda valores mínimos para a cobrança dos tributos, estabelecidos em R$/litro. Tal valor só será cobrado nos casos em que a alíquota incidente sobre a venda resultar em um montante menor. Segundo o Valor apurou, a medida não é arrecadatória, mas visa inibir o subfaturamento.
Haverá ainda um desconto para cervejas produzidas por microcervejarias, consideradas na legislação "cervejas especiais". Para quem produz até 5 milhões de litros por ano, a redução no imposto a pagar será de 20%. Entre 5 milhões e 10 milhões, o desconto cai para 10%.
Inflação e câmbio preocupam setor
O setor de bebidas obteve em novembro uma notícia favorável - o governo federal e representantes das indústrias de bebidas frias chegaram a um consenso sobre o novo modelo tributário que vai vigorar a partir de 2015. O setor terá um aumento gradativo nas alíquotas de PIS/Pasep, Cofins e IPI e a cobrança seguirá o sistema "ad valorem", em que alíquotas fixas incidem sobre o valor de venda dos produtos.
Para representantes do setor, o novo modelo simplifica e torna mais previsível a cobrança de impostos, o que favorece as indústrias na definição dos investimentos. Paulo Petroni, presidente da Associação Brasileira da Indústria da Cerveja (CervBrasil), disse que o novo modelo tributário trouxe alívio ao setor, mas ainda há preocupações em relação à inflação. Procuradas, as cervejarias preferiram não comentar o assunto.
Outro motivo de preocupação são as incertezas em relação ao patamar que o câmbio pode alcançar em 2015, disse. Atualmente, em torno de 35% do custo de produção da indústria de cerveja é de itens cotados em dólar.
Neste ano, esperava-se que as cervejarias cresceriam em torno de 10%, após fechar 2013 com queda em vendas. O clima mais quente e a realização da Copa do Mundo no país ajudariam a impulsionar o desempenho - o que aconteceu no primeiro semestre. O cenário político incerto antes das eleições e a inflação alta, no entanto, provocaram retração no consumo.
O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) da cerveja, medido pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), acumulou uma alta de 7,15% de janeiro a outubro, acima da inflação geral, de 5,05% no período.
"Como a cerveja não é um produto de primeira necessidade, se há menos renda disponível e aumento de preços, há impacto direto no consumo. Em 2013 o aumento de preços foi um dos fatores responsáveis pela queda do consumo, ao lado de oscilações climáticas e aumento de tributos", afirmou Renata Benites Martins, analista de pesquisa de mercado da Euromonitor International.
A analista também observou que, para economizar, consumidores têm optado por se reunir em casa com os amigos e comprar cerveja nos supermercados, em vez dos bares. De acordo com o IBGE, a inflação da cerveja fora de casa foi de 7,21% no acumulado de janeiro a outubro.
Thiago Duarte, analista do BTG Pactual, informou em relatório que espera novos aumentos nos preços da cerveja em dezembro e não há certeza se, para as indústrias, o aumento de preço compensará o volume fraco de vendas.
De acordo com dados do Sistema de Controle de Produção de Bebidas (Sicobe) da Receita Federal, em novembro, a produção de cerveja somou 1,31 bilhão de litros, o que representou um aumento de 6,2% em relação a outubro, e alta de 1,9%% ante novembro do ano passado. No acumulado do ano, a produção apresenta alta de 5,2%, somando 13,96 bilhões de litros.
Nos meses de outubro e novembro, observou Petroni, o setor incrementou a produção para atender à demanda durante o verão. Para o ano, no entanto, o crescimento será menor que o acumulado até novembro, girando em torno de 2% a 3%.
Veículo: Valor Econômico