Numa assembleia que já durava quase dez horas até o fechamento desta edição, credores do Independência tentavam deliberar ontem sobre o plano modificado de recuperação judicial do frigorífico. O plano inicial, apresentado na primeira reunião em Cajamar (SP) no fim de setembro, foi totalmente alterado e os credores fizeram novas sugestões de mudanças, que ainda precisariam ser apreciadas pela assembleia. A pressa do Independência era grande, já que na segunda-feira termina o prazo de 180 dias para aprovação do plano. Se isso não acontecer, a empresa fica sujeita a pedidos de falência.
Com o rechaço pelos credores financeiros da proposta inicial de criação de nova empresa pelo Independência e de uma dívida perpétua que ficaria na companhia antiga, o frigorífico propôs, no plano alterado, um deságio de 50% sobre o valor atualizado do crédito desde a data do pedido de recuperação judicial, em 27 de fevereiro.
Pela proposta, o pagamento do principal para esses credores será feito em uma única parcela em 30 de dezembro de 2016, e dos juros e das dívidas em reais (com taxa de 14% ao ano) em parcelas semestrais a partir de 1 de julho do ano que vem. No caso das dívidas em dólar, a taxa sobre o pagamento dos juros é de 12% ao ano. O perdão de 50% das dívidas com os credores financeiros significa uma redução de cerca de R$ 1 bilhão na dívida total do Independência, que é de cerca de R$ 3 bilhões.
A assembleia começou no fim da manhã, mas os representantes dos credores financeiros, que tinham virado a noite discutindo o plano com os advogados do Independência, retiraram-se da reunião para avaliar a última versão do documento e discuti-la com credores internacionais. Houve novas divergências. Os credores começaram a votar pela aprovação ou não do plano por volta das 22h00. Até o fechamento desta edição, votaram pela aprovação, com ressalvas, Unibanco, Bradesco, Citibank, JP Morgan, BBM, Modal e Barclays. Votaram contra o Banco Votorantim, Banco do Nordeste, Banco da Amazônia, Banif e HSBC. O Golman Sachs votou a favor, e fornecedores também estavam divididos. Só dois pecuaristas votaram contra.
Como o plano modificado do Independência prevê que os sócios controladores "obrigam-se " a buscar a venda do controle da empresa, os credores financeiros propuseram que a companhia emitisse um bônus de subscrição para essas instituições antes da eventual venda. O bônus seria uma espécie de ação à que os credores teriam direito no caso de alienação ou não do controle e que poderia ser negociado no mercado.
"Como o credor financeiro é o único que está dando 50% de desconto, com juro de 1% ao ano, pedimos que, se a empresa tiver o controle vendido por um valor criado pelo desconto, que esse valor seja dividido com os credores quirografários [sem garantias]", disse Eduardo Matar, representante do comitê dos credores financeiros, antes da votação.
Pela sugestão, os credores financeiros teriam direito a negociar esse bônus mesmo que a empresa não seja vendida, operação que tem prazo até 30 de junho de 2011 para ocorrer, conforme o plano. Luis Fernando Paiva, advogado do Independência, respondeu que a proposta de emissão de bônus seria aceita. Assim, se a empresa for vendida, 50% do valor da operação serão destinados aos credores financeiros. Mas se o controle não for vendido, os credores financeiros não terão direito aos 50% da empresa e o controle seguirá com os acionistas atuais. Uma cláusula que estava no plano e que os credores financeiros conseguiram barrar é a que previa um "valor mínimo de saída" aos atuais controladores no caso de um eventual venda.
Outros dois pontos desagradaram aos credores financeiros e provocaram celeuma quando a assembleia parecia se encaminhar para uma definição. O advogado Thomas Felsberg, que representa o JP Morgan, afirmou que seu cliente não aceitava duas cláusulas claramente favoráveis ao Independência e pediu que elas fossem retiradas do plano.
Teve apoio de vários outros credores, inclusive pecuaristas. Uma das cláusulas define que após a aprovação do plano deverão ser suspensas todas as ações de cobrança, execuções judiciais ou qualquer outra medida judicial ajuizada contra o Independência, Nova Carne e/ou seus respectivos sócios, inclusive sócios controladores e cônjuges e empresas coligadas e controladas, os seus administradores e/ou garantidores.
A outra cláusula define a extinção de "obrigações solidárias, acessórias e outras" assumidas pelos mesmos descritos acima no caso de cumprimento integral das obrigações previstas no plano. Paiva, advogado do Independência, rejeitou a retirada e disse que essa era uma contrapartida para os atuais controladores. "A alternativa é a rejeição do plano".
Nas mudanças realizadas no plano de recuperação, o Independência elevou de R$ 80 mil para R$ 100 mil o valor mínimo a ser pago aos pecuaristas até o dia 31 de janeiro de 2010, com possibilidade de prorrogação para 31 de março. O saldo será dividido em 24 meses. No caso de um evento de liquidez antes desse prazo, o pagamento seria antecipado.
A venda do controle tornou-se o foco do Independência, que nega negociações em curso para esse fim. Recentemente, houve rumores de que o frigorífico estaria negociando com JBS, Marfrig e Brasil Foods. Além de tentar vender o controle, o Independência definiu que venderá parte dos ativos, num total de R$ 110 milhões, para pagar dívidas com fornecedores e voltar a operar. Para isso, precisa de R$ 260 milhões. Por isso, também deverá obter novos financiamentos na forma dívida ou aportes de capital, conforme o plano. Os ativos do Independência são estimados hoje em R$ 1,1 bilhão.
Veículo: Valor Econômico