Capacidade instalada avança e se aproxima de nível pré-crise

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Conjuntura: Ociosidade menor deve impactar inflação, ainda que mercado de trabalho pressione mais

 

A ociosidade na indústria diminuiu nos últimos meses, acentuando os riscos de pressões inflacionárias decorrentes do descompasso entre oferta e demanda. Em abril, o nível de utilização de capacidade instalada (Nuci) da indústria de transformação alcançou 85,1%, feito o ajuste sazonal, uma alta significativa em relação aos 84,3% de março, segundo números da Fundação Getulio Vargas (FGV). Ainda que o mercado de trabalho aquecido seja hoje o principal gargalo do ciclo de expansão da economia, esse aumento recente da capacidade instalada também exerce uma influência desfavorável sobre a inflação. O quadro é mais delicado nos setores de bens de consumo e material de construção.

 

Alguns fatores, porém, ajudam a relativizar esse aumento do nível de utilização na indústria. O primeiro é que as importações têm crescido muito, complementando a oferta doméstica. Além disso, está em curso na economia um ciclo forte de investimentos, que, uma vez maturados, elevarão a capacidade produtiva das empresas. Outro ponto é que não se espera um crescimento tão forte da atividade econômica no resto do ano como o registrado no primeiro trimestre.

 

O economista Júlio Callegari, do J. P. Morgan, acredita que a utilização de capacidade em alta é uma fonte de pressões inflacionárias que merece bastante atenção. Ele destaca que os segmentos mais pressionados - bens de consumo e material de construção - são puxados pela demanda doméstica, que esteve forte nos últimos meses e tende a continuar firme daqui para frente, ainda que deva haver alguma desaceleração. Ou seja, mais pressão virá por aí, aposta Callegari. No setor de material de construção, a capacidade instalada atingiu 89,4% em abril, não muito distante dos 91% de agosto de 2008, a máxima no período anterior ao agravamento da crise global, e bem acima da média de 2004 a 2008, de 84,6%, quando a economia cresceu a um ritmo robusto.

 

No setor de bens de consumo, o Nuci também está num patamar alto - 86,3%, a menos de 1 ponto percentual do pico pré-crise, de 87,1%, atingido em setembro de 2008. Callegari nota que esse segmento e o de material de construção são os mais diretamente ligados à inflação ao consumidor.

 

Ainda há uma ociosidade razoável em alguns segmentos da economia, principalmente no de bens de capital e, em menor medida, no de bens intermediários (insumos como aço, produtos químicos, borracha e plástico e celulose). No de bens de capital, o Nuci em abril ficou em 83,4%, muito abaixo dos 89,6% atingidos em julho de 2008. O setor sofre com a concorrência externa, num cenário de câmbio valorizado. No caso de alguns segmentos de bens intermediários, como o de metalurgia (onde está a siderurgia), as exportações têm peso importante, e elas ainda patinam, porque a recuperação global não é das mais intensas.

 

O economista-chefe do Banco Fator, José Francisco de Lima Gonçalves, diz ser inegável que a alta do nível de utilização de capacidade na indústria tem algum impacto sobre a inflação, mas chama a atenção para o forte aumento de importações. No primeiro trimestre, o volume de compras externas de bens de consumo duráveis (como automóveis e eletroeletrônicos) subiu 84% em relação ao mesmo período do ano passado. "Importações ajudam a segurar preços, ainda mais crescendo nesse ritmo", diz Gonçalves.


 
Alta deve continuar, mas em ritmo mais moderado

 


Se mantido o ritmo de alta observado em abril, o nível de utilização de capacidade da Fundação Getulio Vargas (FGV) igualará em dois meses o recorde histórico alcançado em junho de 2008, de 86,7%. A expectativa dominante, porém, é de que isso não ocorrerá tão rápido, porque se espera alguma desaceleração da atividade econômica daqui para frente.

 

O economista Fábio Ramos, da Quest Investimentos, observa que, no primeiro trimestre, a produção industrial e as vendas no varejo cresceram muito, em parte por conta do movimento de antecipação de consumo causado pela iminência do fim da vigência do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para bens de consumo, como eletrodomésticos da linha branca e veículos. Esse ritmo forte não deve se repetir no resto do ano, diz ele. "Com isso, o Nuci não deverá aumentar como nos últimos meses." Para Ramos, a maior fonte de pressão inflacionária vem do mercado de trabalho. O desemprego está nas mínimas históricas, a geração de vagas formais é recorde e a renda cresce com força.

 

Além da redução do ritmo de crescimento, também deve ajudar a moderar a alta da ocupação de capacidade instalada a maturação de investimentos, que devem crescer na casa de 20% neste ano. A própria alta do Nuci é um fator importante para impulsionar as inversões. A questão é que isso leva algum tempo ? o economista Júlio Callegari, do J.P. Morgan, estima que eles começam a ter impacto sobre o nível de utilização depois de seis meses e um ano. "O efeito do atual ciclo de investimentos será mais sentido a partir de 2011."

 

Na série da Confederação Nacional da Indústria (CNI), a utilização de capacidade também teve alta forte, subindo de 81,1% em fevereiro para 82,6% em março, feito o ajuste sazonal (o número de abril ainda não foi divulgado). A LCA Consultores nota que ele é superior à média de 2004 e 2008, de 81,6%, e "próximo ao patamar do período pré-crise, de 83,2%, no primeiro semestre de 2008". (SL)

 

Veículo: Valor Econômico

 


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