Preços dos alimentos contagiam inflação no atacado e no varejo

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Os alimentos são hoje os principais vilões para o bolso do consumidor brasileiro. Além de pressionarem os índices de inflação no atacado e no varejo, os preços dos alimentos não dão mostras de que vão ceder muito até o fim do ano. Ao contrário - as sinalizações, segundo os economistas consultados pelo Valor, são de que os preços de produtos essenciais, como grãos e alimentos processados, continuarão subindo. Em deflação desde a metade de junho, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo-15 (IPCA-15) voltou a acelerar entre meados de agosto e a primeira metade de setembro, registrando alta de 0,31%. Já a segunda prévia do Índice Geral de Preços-Mercado (IGP-M), também divulgado ontem, acusou alta de 1,03%, superior aos 0,99% da primeira prévia.

 

Tanto no IPCA-15 quanto no IGP-M são os preços dos alimentos que elevaram os índices gerais. No varejo, apurado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que calcula o IPCA-15, a maior reversão de agosto para setembro ocorreu nos preços dos alimentos, que passaram de -0,68% para 0,30% no período. No atacado, apurado pela Fundação Getulio Vargas (FGV), que calcula os IGPs, os preços dos produtos agrícolas ampliaram em setembro a forte alta já registrada na segunda prévia de agosto, de 3,28% para 3,47%. Mesmo entre os produtos industriais no atacado, a alta mais proeminente ocorreu com os alimentos processados, que passaram de 0,38% para 3,88%.

 

O resultado mais forte, no IPCA-15, foi no item vestuário, que passou por alta de 0,50%, à frente de transportes, que registrou 0,33% - apenas 0,02 ponto percentual acima da variação registrada nos alimentos. Já no IGP-M, composto por preços no atacado (IPA), ao consumidor (IPC) e na construção civil (INCC), as elevações mais fortes foram verificadas nos atacados agrícola e industrial.

 

O horizonte para os preços dos alimentos não é benigno, avaliam os economistas. Segundo elenca Tatiana Pinheiro, analista do Santander, a cana-de-açúcar inicia período de entressafra em outubro - fase que se estende até março do ano que vem -, a carne de boi antecipou a alta de preços que sazonalmente ocorre entre outubro e novembro e os hortifrutis continuam pressionados pelos problemas de clima. Além disso, os preços de grãos como soja e milho continuam em elevação, devido ao efeito em cascata provocado pela forte alta nos preços do trigo, influenciados pela Rússia, importante produtor mundial, que passa pela maior seca em 150 anos.

 

"A alta do IPCA-15 mostra, principalmente, que a demanda permanece muito aquecida, porque de outra forma não haveria repasses de preços praticados no atacado e no mercado externo", diz Tatiana, para quem o dado divulgado ontem liquida um quebra-cabeça para os economistas. "Por três meses a concessão de crédito, o consumo das famílias, a contratação de pessoal e os salários continuaram subindo, mas ainda assim o IPCA ficou próximo de zero. Agora fica claro que a demanda está pressionando, o que enfraquece o discurso mais otimista para inflação", avalia.

 

Para Bernardo Wjuniski, economista da Tendências Consultoria, o IPCA deve oscilar em níveis próximos a 0,5% no último trimestre, depois de atingir algo em torno de 0,4% neste mês. "As elevações dos IGPs não costumam ser inteiramente repassadas ao IPCA, por isso os resultados costumam ser tão distintos. Um dos poucos repasses evidentes é o de preços agrícolas no atacado", diz o economista.

 

O cenário para a inflação em 2011 é "muito menos benigno do que foi em 2010", avalia Wjuniski. Segundo o economista, não só os preços dos alimentos continuarão pressionados na passagem de ano, enquanto as condições estruturais, como renda e crédito em alta, se mantêm aceleradas. Além disso, diz ele, "os preços administrados serão reajustados por um IGP-M na casa dos dois dígitos, como deve fechar em 2010, diferente do que ocorreu neste ano, quando os preços foram reajustados por índices fracos, uma vez que em 2009 o IGP-M acumulou -1,72%".

 

Depois de elevar a taxa de juros básica em dois pontos percentuais entre abril e julho, o Banco Central decidiu manter a Selic estável em 10,75% ao ano em sua reunião mais recente, no início de setembro. Os economistas não apostam em novas elevações em 2010, mas estimam que a Selic voltará a subir já no início do próximo ano. Embora uma alta em janeiro não esteja descartada, dizem os analistas, as previsões são de que o BC aja em segunda reunião de 2011, que ocorrerá em março. "Caso Henrique Meirelles continue no cargo, fato não descartado pelo mercado, o BC pode elevar a Selic já em janeiro. Um presidente recém-empossado não deve elevar juros logo em sua primeira reunião", diz.

 

Veículo: Valor Econômico


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