O mercado não está mesmo convencido de que as chamadas medidas "macroprudenciais", de aumento no compulsório e nas necessidades de capital dos bancos para créditos mais longos, vão ser suficientes para conter as pressões inflacionárias. Por isso, reviu para cima as estimativas da inflação medida pelo IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) para este ano e também para 2011. "Esse será o grande dilema não só para o Brasil mas para todos os países emergentes daqui para a frente: como controlar a inflação sem ao mesmo tempo jogar mais lenha da fogueira da valorização cambial", diz Marcelo Carvalho, economista-chefe para a América Latina do banco BNP Paribas.
Ele lembra que a política monetária e fiscal nos Estados Unidos vai continuar, sem dúvida alguma, expansionista durante o ano que vem. O Fed, banco central americano, está injetando US$ 600 bilhões no mercado por meio da compra de títulos do Tesouro americano até meados de 2011 e o Congresso dos EUA acaba de manter os cortes de impostos do governo Bush. Com a crise de dívida na Europa, os países emergentes continuarão a ser o principal destino dos recursos resultantes de toda essa expansão, acredita Carvalho.
Alta na taxa Selic pode jogar lenha na fogueira do câmbio
Para ele, o temor de uma nova recessão nos Estados Unidos, tão presente durante o início de 2010, foi afastado. A previsão de crescimento no Produto Interno Bruto do país do BNP Paribas em 2011 é de 1,6%, nas outros bancos já falam em mais de 3%. "Mas o desemprego continua recorde, quase batendo nos 10%, e não vejo qualquer expectativa de aperto de liquidez."
Com o crescimento forte dos países emergentes, é justamente aí que reside o perigo. "Os governos poderão se ver forçados a não subir os juros tanto quanto necessário e a inflação poderá crescer", diz. Para ele, esse risco é maior até mesmo do que o risco de um agravamento da crise de dívida nos países da zona do euro que poderia provocar uma escassez de dólares.
Carvalho lembra que a inflação na China já passou 5% e se aproxima dos 6% ao ano, mas o banco central no país também optou por medidas "macroprudenciais", como aumento do compulsório. Na Turquia, afirma ele, os compulsórios também foram usados como uma forma de conter o crescimento econômico e o crédito e os juros foram até mesmo reduzidos.
Para Carvalho, a economia brasileira já está mostrando "superaquecimento". Segundo lembra, o desemprego está na mínima histórica e a renda continua a crescer. "Mas o governo está reticente em subir os juros e ampliar, dessa forma, o fluxo externo", acredita.
O presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, entrou no debate ao afirmar, em evento em São Paulo, que acredita que o país apresenta as condições necessárias para manter a trajetória de redução dos juros verificada nos últimos anos.
O boletim "Focus" mostrou ontem que o mercado compartilha as mesmas dúvidas. As apostas para a inflação deste ano medida pelo IPCA passaram de 5,85% ao ano na semana passada para 5,88% ao ano ontem. Para elaborar o "Focus", o BC ouve cerca de 100 bancos, corretores e consultorias. Há 4 semanas, as estimativas eram de IPCA de 5,58%.
Para 2011, o mercado continua apostando em inflação acima do núcleo da meta, que é de 4,5% ao ano. As estimativas foram de 5,21% ao ano no "Focus" da semana passada para 5,29% no boletim de ontem. E isso apesar de as apostas de alta nos juros básicos Selic no "Focus" terem sido mantidas: as previsões são da taxa de 12,25% ao ano no final de 2011, um aumento de 1,50 ponto percentual em relação aos 10,75% ao ano atuais.
A piora nas expectativas inflacionárias teve impacto no mercado de juros futuros. Os contratos para vencimento em janeiro de 2012 projetavam taxas de 11,89% ao ano ontem, acima das registradas na sexta-feira, de 11,85%. O dólar terminou em queda de 0,40%, cotado a R$ 1,708.
Veículo: Valor Econômico