A forte alta de preços de insumos industriais nos últimos meses não se traduziu em alta expressiva da inflação dos bens finais no atacado e nem dos produtos industriais no varejo. Enquanto a variação em 12 meses das cotações de bens intermediários e matérias-primas para a indústria no Índice de Preços ao Produtor Amplo - Disponibilidade Interna (IPA-DI) passou de 1,4% em fevereiro de 2010 para 11,6% em fevereiro deste ano, a dos bens finais nesse indicador saiu de uma queda de 0,5% para uma alta modesta de 2% no período, mostra um estudo do Credit Suisse. No caso dos bens industriais do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), o nível de inflação em 12 meses caiu de 3,9% em fevereiro do ano passado para 3,6% em fevereiro de 2011, na mesma base de comparação.
Para o economista-chefe do Credit Suisse, Nilson Teixeira, o aumento da participação dos importados no consumo interno nos últimos anos tem um peso decisivo para diminuir o repasse das altas de insumos tanto para os preços dos bens industriais no atacado como no varejo. Esse processo, segundo ele, também é facilitado pelo maior controle dos preços, o que ajuda a reduzir a inércia inflacionária, processo pelo qual a inflação passada alimenta a futura.
Para 2011, Teixeira espera que os preços de bens industriais no varejo continuem comportados, mas considera "pouco provável que a desaceleração da atividade da indústria diminua significativamente a inflação de produtos industriais no IPCA nos próximos meses". Ele projeta uma alta de 3,1% para esses bens neste ano, apenas um pouco abaixo dos 3,5% de 2010. "O ponto é que a elevação de preços industriais está muito mais associada ao aumento dos preços de commodities que ao ritmo de expansão do consumo", afirma Teixeira.
Alguns dos setores industriais em que os preços subiram com força são os que têm o algodão como principal insumo, destaca o estudo do Credit Suisse. As cotações de bens intermediários e matérias-primas do setor de produtos têxteis, por exemplo, subiram 27% nos 12 meses até fevereiro. No mesmo período, os bens finais no atacado desse segmento tiveram alta de 14%. No caso dos produtos químicos, muito influenciados pelas cotações do petróleo, os preços de bens intermediários e matérias-primas do segmento aumentaram 6,8%. Os bens finais avançaram menos - 3,6%. No segmento de borracha e plástico, os preços dos bens finais no atacado subiram 6,6%, até mais que a alta de insumos do segmento, de 5,8%.
Já em setores como máquinas, aparelhos e materiais elétricos e máquinas e equipamentos, a elevação das cotações de insumos não foi acompanhada por alta relevante dos bens finais. No primeiro, os insumos aumentaram 15,8%, sempre nos 12 meses até fevereiro, mas os produtos finais subiram 4,4%. Trata-se de um segmento em que a participação dos importados no consumo interno ganhou bastante espaço nos últimos anos, diz Teixeira. Os números mostram, segundo ele, a dificuldade da maior parte da indústria para repassar aumentos de custos.
"As importações têm peso grande nesse processo, uma vez que elas ameaçam o produto nacional em todas as etapas do processo produtivo e por isso dificultam o repasse, mesmo no atacado", diz a economista-chefe da Rosenberg & Associados, Thaís Zara. "A boa notícia é que, se não fosse isso, a inflação estaria ainda mais alta."
A pressão sobre os insumos eleva o risco de repasse para os bens industriais no varejo nos próximos meses, mas a análise feita pelo Credit Suisse do comportamento dos dois indicadores sugere que não há grande motivo para preocupação.
O estudo do Credit Suisse mostra que houve uma queda expressiva no repasse da inflação de insumos para os produtos industriais no IPCA nos últimos anos, analisando o que ocorria entre 1996 e 2002 e de 2003 a 2011. No primeiro período, um aumento de 1 ponto percentual nos preços dos insumos industriais produzia um impacto de 1,95 ponto na inflação de produtos industriais no IPCA nos 12 meses seguintes. De 2003 a 2011, o impacto caiu significativamente, para apenas 0,32 ponto.
A presença crescente das importações é fundamental para entender esse fenômeno, diz Teixeira, ressaltando também a importância da diminuição da inércia inflacionária no período mais recente. A manutenção da inflação em níveis elevados por mais tempo, porém, pode realimentar a inércia. O IPCA, que fechou 2010 em 5,9%, deve fechar 2011 próximo desses níveis, de acordo com a maior parte dos analistas.
Uma novidade de 2011 é que, tudo indica, o câmbio não deve se valorizar como nos anos anteriores. O Banco Central (BC) parece fazer de tudo para impedir a queda do dólar abaixo de R$ 1,65. Desse modo, se houver uma alta mais forte de preços dos produtos importados, as cotações convertidas reais desses bens tenderiam a subir. Em vez de importar deflação, o país poderia começar a importar inflação. O risco, porém, não parece exagerado. Thaís lembra que, com exceção das commodities, os preços dos produtos importados ainda estão em patamar muito baixo.
Já o professor Luciano Nakabashi, da Universidade Federal do Paraná (UFPR), nota que o câmbio está bastante apreciado se comparado com a média dos últimos 10 ou 20 anos. "A manutenção do câmbio valorizado vai manter a pressão para que não ocorra o total repasse da elevação dos custos aos preços."
Veículo: Valor Econômico