Estoques preocupam indústria e podem atrasar retomada

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A indústria se esforçou para reduzir estoques nos últimos meses de 2011, mas alguns setores importantes entraram neste ano com produtos não escoados ainda acima do desejado, como o têxtil, o químico, o de celulose e papel, o de mobiliário e o de produtos farmacêuticos e veterinários. Com isso, esses segmentos devem levar mais tempo para retomar um ritmo forte da produção, o que pode segurar uma recuperação mais firme da atividade industrial no começo do ano.

No caso da indústria automobilística, para o qual há informações quantitativas de estoques, os dados da Associação Nacional de Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) mostraram queda em dezembro. No entanto, o volume de unidades nos pátios de montadoras e concessionárias segue em níveis altos, ainda que em número de dias de vendas a situação esteja perto da normalidade.

Para o coordenador de sondagens conjunturais da Fundação Getulio Vargas (FGV), Aloisio Campelo, a indústria terminou o ano passado com uma situação de estoques mais equilibrada do que no terceiro trimestre, auge do problema, mas alguns setores importantes ainda enfrentam dificuldades. Há aqueles que não conseguiram reduzi-los, como o têxtil, e os que tiveram alta forte no fim do ano, como químico e o de mobiliário.

O setor químico viu o número de empresas que relatam inventários indesejados na sondagem da FGV saltar de 3,2% para 10,4%, feito o ajuste sazonal, bastante acima da média de 4,2% registrada desde janeiro de 2003. Para completar, a fatia de companhias do segmento que informaram estoques insuficientes caiu de 1,1% para 0,3%.

Já o setor têxtil, que em setembro tinha 24,8% das empresas com estoques excessivos, encerrou o ano com 27,8% delas nessa situação, percentual bastante acima da média de 18,7% observada desde 2003. A fatia das companhias que relataram estoques insuficientes caiu de 6,4% em novembro para 3,6% em dezembro.

O têxtil é um dos quatro setores que, segundo Campelo, estavam "superestocados" em setembro, ao lado de metalurgia, material de transporte (onde está a indústria automobilística), e vestuário e calçados. Desses quatro, apenas o têxtil não conseguiu vender suas mercadorias no quarto trimestre.

Campelo vê dois motivos principais para o acúmulo de estoques a partir da segunda metade do ano passado. O primeiro, uma demanda mais fraca do que a estimada pelas empresas - no terceiro trimestre, o consumo das famílias recuou 0,1% em relação ao trimestre anterior, feito o ajuste sazonal, enquanto o investimento caiu 0,2%. Além disso, o aumento das importações também rouba espaço do produto nacional, podendo ter contribuído para a formação de inventários indesejados.

O setor de mobiliário terminou o ano com uma situação de estoques semelhante ao do setor têxtil. Em dezembro, 26,5% das empresas relataram à FGV ter inventários exagerados, enquanto apenas 1% informou que eles eram insuficientes.

O diretor da Associação Brasileira das Indústrias do Mobiliário (Abimóvel) em Brasília, Lipel Custódio, diz que o setor de fato virou o ano com estoques acima do desejado. O varejo segurou encomendas e o consumidor ficou um pouco mais retraído, em função das notícias sobre a crise internacional, acredita ele, citando também o mau desempenho das exportações. Para Custódio, a situação deve estar normalizada depois do Carnaval. Janeiro e fevereiro, segundo ele, são meses naturalmente de produção mais fraca. A queda dos juros iniciada em agosto pode ajudar nesse movimento, se implicar condições mais favoráveis de crédito, diz Custódio.

No setor metalúrgico (que engloba o setor siderúrgico), o quadro é bem mais favorável. Em setembro, 18,7% das empresas consultadas pela FGV relataram estoques excessivos, e nenhuma informou ter inventários insuficientes. Já em dezembro, as companhias que reclamavam de estoques indesejados eram 9,8%, perto da média de 9,5% registrada desde janeiro de 2003, enquanto 4,3% informavam um volume insuficiente.

O presidente do Instituto Nacional dos Distribuidores de Aço (Inda), Carlos Loureiro, diz que o seu segmento encerrou 2012 com estoques praticamente ajustados, equivalentes a três meses de vendas. Segundo ele, o setor considera normal algo entre 2,5 e 2,8 meses. Como em dezembro as vendas são tradicionalmente um pouco menores, Loureiro diz que não há problemas no nível do fim de 2011. Para janeiro, ele espera que os estoques recuem para o equivalente a algo como 2,7 meses de vendas. Na distribuição de aço, o nível mais alto de 2011 foi atingido em março, com estoques próximos a cinco meses. Ao longo do ano, porém, os estoques foram sendo ajustados, com produtores e distribuidores locais ganhando espaço do aço importado, que havia crescido muito em 2010, por conta da diferença de preços. "Em 2011, a importação caiu quase 50%, e a distribuição nacional, por sua vez, cresceu pouco mais de 10%", diz Loureiro.

Para 2012, ele espera uma expansão de 6%, com expectativa de demanda mais forte da construção civil residencial, infraestrutura e de quem produz equipamentos para esses segmentos. Não há mais espaço para um ganho tão fácil em cima dos importados, diz.

No caso da indústria automobilística, a situação é um pouco dúbia. Na sondagem da FGV, a fatia de empresas do setor de material de transporte (em que se destaca a indústria automobilística) que informam estoques excessivos ficou em 10,2% em dezembro, metade dos 20,5% registrados em setembro e abaixo da média de 11,4% da média desde 2003.

Números da Anfavea, porém, mostram um quadro menos claro. O número de veículos nos pátios das montadoras e concessionárias recuou de 373,5 mil em novembro para 347,7 mil em dezembro. Em termos de dias de vendas, a queda foi de 35 para 30 dias, nível tido como normal pelo setor.

O economista-chefe da corretora Convenção Tullett Prebon, Fernando Montero, contudo, acha que o número em termos absolutos ainda é alto, especialmente para o último mês do ano. Ele observa que, em geral, os estoques sobem de dezembro para janeiro. "De 2002 para cá, isso só não ocorreu em 2009." Para Montero, uma parte razoável já ajustou estoques, mas esse não parece ser o caso do setor automobilístico.

O economista Aurélio Bicalho, do Itaú Unibanco, também não vê um quadro dos mais positivos em termos de estoques para a indústria automobilística. Nas suas contas, eles aumentaram em dezembro, feito o ajuste sazonal. É um sinal desfavorável para a produção de veículos em janeiro, que veio de uma alta forte no mês anterior, de 6,6% sobre novembro na série calculada pelo Itaú Unibanco.



Veículo: Valor Econômico


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