População passa a ter menos acesso ao crédito e disposição para comprar bens duráveis de alto valor.
A prorrogação da alíquota reduzida do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) anunciada na quarta-feira passada pode não aumentar o volume de vendas no comércio e, conseqüentemente, a produção industrial, da maneira esperada. Segundo especialistas, a medida atiçou, em um primeiro momento, o ânimo dos consumidores, que nos últimos meses correram às concessionárias, lojas de móveis e eletrodomésticos na esperança de adquirir produtos mais baratos. Agora endividada, a população passa a ter menos acesso ao crédito e disposição para comprar bens duráveis de alto valor.
"A extensão não deve trazer os efeitos que o governo deseja", resume o professor de Economia da Fumec Fernando Nogueira. Para ele, a medida já cumpriu o objetivo de reduzir os impactos da crise financeira internacional na economia doméstica. Ele ressalta que, ao optar pela prorrogação, o governo está abrindo mão de bilhões em arrecadação tributária.
Para Nogueira, o Executivo, ao conceder o benefício, deveria garantir algumas contrapartidas, sobretudo da indústria automobilística, setor âncora da economia. Entre elas, o especialista destaca a diminuição da margem de lucro, que pode extrapolar os 100%, a manutenção do nível de emprego nas fábricas por um período bem superior à isenção do encargo, a garantia de novos investimentos no país, além do desenvolvimento, em território nacional, de veículos com maior grau de tecnologia agregada.
O professor de Economia e Finanças da PUC Minas Ário Andrade concorda que a prorrogação da medida é arriscada, uma vez que, de acordo com ele, as despesas do governo cresceram 12% no último ano, enquanto a receita foi ampliada em apenas 7% no período.
Duráveis - O especialista ainda frisa que, embora o segundo semestre seja uma época mais favorável ao consumo, em decorrência do recebimento do 13º salário e de outras gratificações, as altas taxas de endividamento e inadimplência podem afetar o desempenho do comércio, sobretudo de bens duráveis que demandam financiamento, como os que são contemplados pelo incentivo fiscal.
Ele ainda observa que o país vem observando uma redução no ritmo dos investimentos privados, questão que, na visão do economista, seria solucionada apenas por meio de uma ampla e profunda reforma tributária. Apesar de a carga de impostos do país ainda ser uma das mais elevadas do mundo, Andrade elogia alguns programas, como o Plano Brasil Maior, que desonera a folha de pagamento de alguns setores, ao excluir a contribuição previdenciária. "Mas, de qualquer maneira, é preciso adotar uma política que beneficie todos os segmentos, simultaneamente", opina.
A professora de Economia da FGV/IBS Vireme Roxo Matesco também acredita que, em um primeiro momento, a estratégia de estimular a economia via consumo em momentos de incertezas, ajuda a solucionar o problema em curto prazo. No entanto, ela acredita que a presidente falha ao privilegiar setores específicos.
"O papel do governo não é eleger segmentos, mas atuar sobre toda a economia. As medidas de longo prazo têm que começar a ser implantadas e, para isso, elas exigem um setor público eficiente, o que não se verifica na prática", critica.
Para o coordenador do curso de Administração do Ibmec, Eduardo Coutinho, o Executivo, ao acatar reivindicações e adotar medidas como o corte do IPI, está mais preocupado com aspectos políticos, que com os estruturais, capazes contribuir de maneira eficaz para solucionar de vez os principais gargalos que barram o desenvolvimento do país. "Agora, o governo tenta manter ativo um setor que emprega uma parcela significativa da população (o automobilístico). Porém, é necessário discutir de maneira mais ampla a cadeia produtiva", alerta.
Veículo: Diário do Comércio - MG