Com redução das tarifas de energia e pressão menor dos alimentos, IPCA- 15 recua em março
Com queda nas tarifas de energia, o IPCA- 15, prévia da inflação oficial, ficou em 9,95% nos últimos 12 meses. O alívio nos preços dos dois principais vilões da inflação no ano passado — energia elétrica e alimentos — trouxe a taxa acumulada em 12 meses de volta a um dígito. O Índice de Preços ao Consumidor Amplo 15 ( IPCA- 15), considerado uma prévia da inflação oficial no país, ficou em 0,43% em março e em 9,95% nos últimos 12 meses. No mês anterior, chegara a 10,84%. Foi reflexo da redução da bandeira tarifária ( cobrança extra) na conta de luz e da desaceleração dos preços dos hortifrutis.
A inflação de março ficou abaixo das expectativas do mercado, e a tendência de pressão menor nos preços deve ser manter nos próximos meses. Mas, segundo economistas, isso não será suficiente para que a taxa fique dentro do teto da meta estabelecida pelo governo para este ano, de 6,5%. Eles estimam um IPCA entre 7%e 8% ao fim de 2016. Isso porque o índice ainda está muito alto para um período de recessão, quando o consumo cai, e os preços deveriam cair junto.
— Temos uma inflação muito alta quando comparada ao centro da meta, de 4,5%, e a um segundo ano de recessão, com o último PIB ( Produto Interno Bruto) negativo em 3,8%. Já era para estar com inflação mais baixa — avalia a técnica do Ipea Maria Andréia Parente.
Impacto do consumo menor
Alberto Ramos, do Goldman Sachs, destacou que, apesar da recessão e da deterioração do mercado de trabalho, a inflação continua generalizada, ou seja, atinge grande parcela dos produtos pesquisados pelo IBGE. “A difusão da inflação ficou em 71,5% em março, abaixo dos 77,5% de fevereiro, mas acima dos 69,3% de um atrás, um sinal de que as pressões inflacionárias continuam intensas e generalizadas”, afirma o analista em relatório.
Para André Braz, economista da Fundação Getulio Vargas, há um conjunto de fatores mantendo a inflação:
— Os efeitos naturais da recessão estão sendo segurados pela alta taxa de câmbio, pela indexação, pelo alto gasto público. Tudo isso faz com que repasses aos preços continuem, mesmo com menos pessoas consumindo.
O economista Leonardo França Costa, da Rosenberg Associados, consegue ver um respingo da queda da demanda nos preços da alimentação fora da casa, que desacelerou de alta de 1,08% em janeiro para de 0,44% em março. Foi a menor taxa para o grupo nos últimos 12 meses:
— Ainda é cedo para afirmar, mas a diminuição da demanda pode estar impactando no preço da alimentação fora de casa.
A energia elétrica foi a principal responsável por puxar o IPCA- 15 de março para baixo, com queda de 2,87% frente a fevereiro, por causa da redução no preço da bandeira tarifária. A cobrança adicional sobre a conta de luz baixou R$ 3 para R$ 1,50 a cada 100 kW/ h.
Os preços dos alimentos, responsáveis por 46% do índice do mês, também tiveram forte desaceleração. O aumento médio baixou de 1,92% em fevereiro para 0,77% este mês. O tomate e a batata, por exemplo, que vinham de uma trajetória de alta, tiveram deflação de 19,21% e 4,61%, respectivamente.
Para Costa, os alimentos já estão se livrando dos efeitos da alta do dólar, sentida em janeiro e fevereiro:
— A oscilação do dólar é rapidamente sentida nos alimentos. E o pico de mais de R$ 4 do último trimestre começa a desaparecer. Nos dois primeiros meses do ano, os preços ainda estavam refletindo essa alta. E isso começa a desaparecer.
Segundo André Braz, também aliviou o preço dos alimentos o fim do período intenso das chuvas de verão, que acabam prejudicando as lavouras.
O impacto positivo no bolso, no entanto, ainda deve demorar a ser sentido pelo consumidor. Para o economista da FGV, os preços estão num patamar tão elevado que seriam necessários anos de inflação convergindo ao centro da meta e um freio na queda da renda para haver uma percepção de que a inflação cedeu.
— O que as pessoas sentem no bolso é taxa acumulada em 12 meses, que continua perto dos 10%. Esse recuo de março não é suficiente para neutralizar isso. O que houve é uma dança da cadeira entre os preços. Esse troca- troca não alivia a pressão inflacionária sobre o bolso. O patamar dos preços está muito alto, e teríamos de ter anos de inflação convergindo para o centro da meta para sentir o alívio — diz.
Ao fazer compras, ontem, a dona de casa Maano ria Pereira, de 74 anos, de fato, não percebeu o recuo nos preços de alimentos:
— Os preços continuam altíssimos. Agora mesmo eu gastei R$ 45 no supermercado só em leite e algumas frutas — reclamou.
Sem impacto sobre os juros
Apesar de esperar um movimento de queda da inflação este ano, a técnica do Ipea diz que há duas ameaças, que podem distanciar a taxa das previsões do mercado: uma possível piora considerável do mercado de trabalho, fazendo com que o consumo despenque e leve os preços a baixar mais do que o esperado, e uma nova disparada do dólar, que pode pressionar no sentido contrário.
Luiz Roberto Cunha, economista da PUCRio não acredita que esta tendência de desaceleração da inflação fará o Banco Central mudar os planos de manutenção da Selic no patamar atual, de 14,25%:
— Em nada muda a posição do BC, porque a estabilidade política tem mais importância nesse momento para a expectativa dos empresários e consumidores. É muito difícil separar a estabilidade política da econômica, e, nesse momento, a inflação é totalmente coadjuvante nesse quadro, que é preocupante.
Para a inflação fechada de março — o IPCA 15 mede a variação entre os dias 15 de cada mês —, Cunha projeta taxa ainda mais baixa, entre 0,35% e 0,40%. Isso porque o impacto da bandeira tarifária será ainda maior no período de 30 dias do mês. Para o ano, prevê IPCA de 7%. Já a Rosenberg Associados tem uma expectativa maior, de inflação de 8% este ano.
Veículo: Jornal O Globo