Sob a batuta do ex-presidente Lula, o governo mobiliza os ministérios para desengavetar todas as medidas que possam criar um cenário positivo às vésperas da votação do afastamento da presidente Dilma Rousseff. A estratégia traçada pelo Palácio do Planalto é o atendimento de pleitos de setores que, até agora, não encontravam eco no governo para suas demandas. Agora, estão sendo analisadas, a toque de caixa, mesmo com um rombo nas contas públicas que pode chegar a R$ 100 bilhões este ano. O plano seria por em prática várias medidas esta semana. Nem todas, porém, serão divulgadas.
As edições do Diário Oficial da União nos próximos dias, dizem técnicos da área econômica do governo, será o melhor termômetro desse movimento. Além de aumentar o espaço para mais gastos no projeto de revisão da meta fiscal deste ano, o governo trabalha para elevar o remanejamento das despesas do Orçamento e, dessa forma, atender a pleitos mais específicos.
Na área econômica, essa movimentação ganhou o apelido de “pacotão do impeachment”. Há, porém, uma grande preocupação com o impacto do custo das medidas para as contas públicas. Técnicos estão preocupados em referendar essas ações, que podem depois ser questionadas pelos órgãos de controle.
O Estado apurou que servidores do Tesouro Nacional manifestam desconforto com a iniciativa. Eles querem evitar o que ocorreu com as “pedaladas fiscais”, manobras feitas para maquiar o resultado das contas públicas que foram condenadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU). Servidores do órgão sofreram processo de responsabilização pelo tribunal e poderão ser punidos em julgamento que ainda não terminou.
Negociação. Em uma das frentes, o governo negocia com parlamentares a flexibilização de exigências cobradas pelo Ministério da Fazenda para conceder alívio no caixa dos Estados, que pode chegar a R$ 45 bilhões nos próximos três anos. As contrapartidas são justamente as medidas que os governadores teriam de adotar para controlar gastos com pessoal. Por pressão de sindicatos, a bancada do PT apresentou emendas que desfiguram o projeto do governo. O medo era perder apoio em setores da população que tradicionalmente são aliados do partido.
A equipe econômica estuda injetar mais recursos no microcrédito, com a liberação de parcela do compulsório - dinheiro que os bancos são obrigados a deixar no BC - para crédito a pequenas empresas. Atualmente, os bancos são obrigados a destinar 2% dos depósitos à vista a esse tipo de operação. A maior parte, porém, não aplica o mínimo exigido por lei, sendo punida com retenção do dinheiro no BC. Banco do Brasil, Caixa e Banco do Nordeste concentram a maior parte das operações.
Segundo o presidente do Sebrae, Guilherme Afif Domingos, com a ampliação da exigência para 4% e novas regras para definir os tomadores (com aumento do teto de faturamento para R$ 360 mil dos atuais R$ 120 mil por ano), haverá um incremento de até R$ 3 bilhões. Outros R$ 5 bilhões devem vir de uma nova linha para capital de giro, com recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) e do Fundo PIS/Pasep.
Especialista em contas públicas, o economista-chefe da corretora Tullett Prebon, Fernando Montero, observa os sinais de afrouxamento fiscal, embora ainda veja alguma resistência na Fazenda. “Mas sem dúvida, sim, há esse movimento. Até secretários de Fazenda dos Estados posicionam-se contra dar a folga agora e discutir as contrapartidas depois”, diz.
O economista Mansueto Almeida avalia que a crise do impeachment está dificultando cortes adicionais em programas do governo. Mas sua preocupação maior é com transferência de custos para outras esferas, como o FGTS, que podem se transformar em mais esqueleto fiscal no futuro. “O governo não tem condições de fazer política anticíclica com a trajetória explosiva da dívida.”
Veículo: Jornal O Estado de S. Paulo