Economistas avaliam que processo de recuo inflacionário é consistente, pois principais fatores de pressão, como os administrados, já se diluíram; maioria aposta em corte de 0,25 ponto na Selic
São Paulo - O processo de redução da inflação no País é consistente, o que deve abrir espaço para o início do ciclo de corte na taxa básica de juros (Selic) a partir de amanhã, de acordo com a avaliação de economistas consultados pelo DCI.
O patamar dos juros será definido pelo Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) na próxima quarta-feira. A Selic se encontra, hoje, em 14,25% ao ano e a maior parte dos especialistas aponta para um corte de 0,25 ponto percentual (p.p.) na taxa. No entanto, há quem projete uma diminuição mais "forte" nos juros, de 0,50 ponto já neste mês.
É o caso do professor de economia da Fundação Getulio Vargas (FGV) Mauro Rochlin que já vê condições econômicas mais favoráveis para juros mais baixos. "O núcleo da inflação, hoje, apresenta uma queda bastante consistente, o que mostra que o processo de redução de preços veio para ficar", destaca o professor da FGV.
"Esse indicador são os preços que sobram após o BC expurgar os 20% dos custos que mais sobem e os 20% que mais caem", acrescenta Rochlin, afirmando que a redução das taxas de juros no mercado futuro são outro sinal do início de redução da Selic nesta semana.
Já o professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie Pedro Raffy Vartanian aposta em um corte menor nos juros, de 0,25 ponto na quarta-feira. Ele avalia que os principais riscos de pressão inflacionária já se diluíram na economia, apesar de ponderar que o Índice de Preços ao Consumidor (IPCA) ainda deve fechar acima do teto da meta (6,5%) no final deste ano, em 7,04%, em 12 meses.
Em janeiro de 2016, o IPCA acumulava alta de 10,71%, em 12 meses. "A Selic em 14,25% ao ano não se justifica mais, já que o processo de redução da inflação é consistente. O realinhamento dos preços administrados [iniciado em 2014] já surtiu efeito na economia. Não existe mais pressão vinda daí."
Os preços administrados são aqueles controlados pelo governo, como os de energia elétrica, combustíveis e transporte público, por exemplo. No entanto, algumas estatais têm autonomia para definir a política de preços, como é o caso da Petrobras desde o último sábado. Esta decidiu reduzir os preços da gasolina e do diesel.
Sobre isso, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, comentou na sexta-feira que a decisão da estatal será positiva para a inflação. "Não há dúvidas de que neste caso específico a decisão é favorável do ponto de vista da inflação", declarou Meirelles. Nas refinarias, a redução média do diesel será de 2,7% e da gasolina em 3,2%. Essa é a primeira diminuição do preço combustível desde 2009, e o impacto nas bombas de combustíveis pode chegar a R$ 0,05 tanto para a gasolina quanto para o diesel.
Salários menores
Vartanian, do Mackenzie, lembra que não há mais pressões inflacionárias oriundas do mercado de trabalho. "Muitos trabalhadores estão desempregados e a renda da população caiu muito", ressalta. "Portanto, os salários não são mais fonte de pressão inflacionária", complementa o professor.
Dados mais recentes do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) mostraram que durante o primeiro semestre de 2016, 40% das negociações salariais resultaram em reajustes abaixo da inflação. No mesmo período de 2015 e de 2014, essa porcentagem era de 15% e 3%, respectivamente.
O economista Andrew Storffer, da Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac), comenta que a manutenção da Selic no patamar atual de 14,25% traz mais prejuízos do que benefícios para a economia brasileira. Ele prevê um corte de 0,25 pontos na taxa de juros nesta quarta.
"Os juros altos são ruins para o próprio fiscal do governo federal. No ano passado, a União pagou R$ 500 bilhões de juros. Atualmente, não temos capacidade de gerar superávit que dê conta de minimizar essa conta", comenta. O superávit primário é a economia que o governo faz para pagar os juros da dívida. Em 12 meses até agosto, os juros do endividamento federal chegaram a R$ 418 bilhões, enquanto o déficit primário é de R$ 170 bilhões.
Storffer acrescenta que o corte dos juros se faz necessário para a retomada da economia e do emprego. "Precisamos reduzir a Selic para que o investimento se desloque da especulação para a economia real [produção industrial, por exemplo]", ressalta ele.
PEC 241
Vartanian analisa que a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 241, que institui um teto para o crescimento dos gastos públicos, se aprovada, pode contribuir para a continuidade da redução da Selic em 2017. Isso porque o endereçamento do fiscal sinaliza responsabilidade na gestão das contas públicas, reduzindo o fator risco da taxa de juros.
Para ele, o único risco de cortar a Selic neste momento seria se houvesse um descontrole fiscal maior do que o esperado associado a um aumento da taxa de juros dos Estados Unidos. "Esse cenário poderia afugentar capital do Brasil. Por outro lado, mesmo com a elevação dos juros norte-americano, a Selic ainda continuará atrativa", relativiza o professor do Mackenzie.
Na avaliação do Itaú Unibanco, o BC deve cortar a Selic em 0,25 pontos. "A manutenção dos juros no patamar atual aumentaria o risco de inflação substancialmente inferior à meta na parte mais distante do horizonte de projeção", afirma o banco em nota. Para a instituição, um corte em 0,50 pontos já nesta reunião seria inconsistente com o grau de incerteza remanescente tanto sobre o processo de ajuste fiscal quanto sobre o ritmo da desinflação de serviços.
Fonte: DCI