Com escassez de itens da cesta básica no país de Chávez, importações de açúcar aumentam 250% em valor, e as de gado vivo, 70%
Governo atribui problema à especulação; para analistas, tabelamento e dificuldade em acessar divisas para importação explicam escassez
A escassez de itens da cesta básica na Venezuela, como carne e açúcar, tem favorecido o Brasil. De janeiro a abril, aumentou em 70% o valor pago pelo país de Hugo Chávez para a compra de gado em pé (antes do abate) em relação ao mesmo período de 2009. No caso do açúcar, a alta foi de 250%.
Outro produto que rareia nos supermercados é a farinha de milho, base da alimentação local. O grão, que não aparecia na lista dos produtos mais vendidos pelo Brasil em 2009, agora é o quinto do ranking.
O governo venezuelano diz que a escassez de alguns itens é fruto da especulação. Para analistas, o problema é resultado de alguns fatores:
1) a dificuldade para ter acesso a divisas para importação;
2) a resistência de produtores a vender nos preços tabelados pelo governo ante uma inflação que bateu 5,2% só em abril -a alta chegou a 11,2% para alimentos;
3) problemas na produção e na distribuição de itens por empresas estatais.
No caso do açúcar, as duas principais usinas do país foram ocupadas por agentes governistas neste ano, acusadas de se negarem a entregar o produto ao mercado. Também contribuiu para a queda de produção local a seca, que se reflete na crise energética (70% do abastecimento é hidroelétrico).
O preço da carne, por exemplo, está congelado há dois anos. No começo do mês, a polícia chegou a prender açougueiros que vendiam o produto além do valor estabelecido.
Para aumentar a oferta de carne, o governo anunciou acordo com a Asofrigo (Associação Venezuelana de Frigoríficos e Matadeiros Industriais) para aumentar em 66% ao mês a importação de gado em pé (50 mil cabeças) do Brasil.
O presidente da associação, Gonzalo Asuaje, afirma que Caracas se comprometeu a acelerar a liberação de divisas pelo Cadivi (Comissão de Administração de Divisas) -a falta de dólares no mercado é um dos elementos da atual crise cambial.
As importações são feitas tanto por entes estatais -o governo Chávez tem uma rede de supermercados a preços subsidiados- como por privados.
Fator político
Para analistas, a preferência pelo produto brasileiro responde a fator político. "Importar do Brasil, dada a amizade entre Lula e Chávez, é mais bem-visto que importar da Colômbia", diz Hugo Farias, professor do Iesa (Instituto de Estudos Superiores de Administração).
A simpatia, afirmam os analistas, reflete-se nas filas do Cadivi, ainda que empresas brasileiras também tenham queixas pontuais por atrasos.
A Venezuela não tem peso minoritário na balança comercial brasileira. Entre janeiro e abril, o saldo no comércio bilateral foi de US$ 816 milhões -38% do saldo total.
O Brasil teve saldo de US$ 3,01 bilhões no comércio com a Venezuela em 2009, 12% do superavit total, fatia só menor que a da China (16%). Mesmo com queda do PIB de 3,3% em 2009 e com redução de 30% na balança bilateral no ano passado, Caracas respondeu por 37% do saldo total do Brasil com os países da Aladi (América do Sul mais México e Cuba).
Veículo: Folha de São Paulo