Crescem preocupações com a oferta mundial de cereais

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Vlademir Klevtsevich desistiu de esperar a chuva. Em vez disso, o fazendeiro russo resolveu começar a plantar a próxima safra de trigo.

 

Ele resolveu semear apenas 8.000 hectares de suas terras castigadas pelo sol. Até recentemente, ele esperava poder plantar 11.000 hectares. Mesmo assim, Klevtsevich não tem certeza se as sementes que plantar vão render muito.

 

"Estamos nos arriscando muito com essa safra, porque não há irrigação suficiente", disse Klevtsevich, cuja cooperativa, a Agroholding, tem cerca de 40.000 hectares perto de Saratov, na região do Rio Volga. "Simplesmente não chove."

 

O sucesso de Klevtsevich e outros produtores como ele terá consequências muito além das fronteiras russas. Investidores focados na oferta mundial de alimentos têm acompanhado as últimas estimativas do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos, conhecido pela sigla USDA, sobre produção de trigo e milho. Embora o departamento tenha informado sexta-feira que a oferta de trigo continua robusta, diminuiu a previsão do milho, o que impulsionou a cotação da commodity para o maior nível desde 1o de outubro de 2008.

 

Como a Rússia ganha um papel cada vez mais importante na cadeia mundial de suprimento alimentar, a saúde da nova safra de trigo de inverno está sendo acompanhada de perto por operadores, empresas de alimentos e agências de auxílio alimentar no mundo inteiro, em meio aos temores de que o mundo pode enfrentar uma nova escassez de alimentos ano que vem.

 

"Temos de acompanhar a temporada de plantio com muita, muita atenção mesmo", disse Mayo Schmidt, diretor-presidente da Viterra Inc., um conglomerado canadense do setor agrícola. "Não apenas eles precisam de água, mas tem que ser no momento certo."

 

A seca já arrasou a safra de milho de primavera no país, levando o governo a suspender as exportações. Os produtores estão tentando semear a safra de inverno, geralmente maior que a da primaveira, mas com o solo seco e poucas chances de chuva no futuro, parece cada vez mais que a próxima safra também será escassa.

 

E o problema não é só na Rússia. Na Austrália, gafanhotos ameaçam a safra de trigo, e a Argentina pode enfrentar um período de secas por causa do fenômeno La Niña. O governo americano diminuiu a previsão da safra de milho, mas ainda espera uma colheita recorde.

 

"Existem todas as condições para que os governos comecem a entrar em pânico" se houver outro choque além do russo à oferta mundial de alimento, disse Scott Irwin, economista agrícola da Universidade de Illinois em Urbana-Champaign.

 

As cotações de alguns produtos agrícolas, que já subiram bastante este ano, podem aumentar ainda mais se a oferta diminuir mais uma vez. "Uma pequena redução nas perspectivas de produção e nos estoques pode gerar uma alta considerável no preço", disse Irwin.

 

A cotação do milho subiu 1,7% em Chicago na sexta-feira, para US$ 4,64 o bushel (25,4 kg), depois que o USDA divulgou previsão de que os produtores americanos colherão 157 kg por hectare a menos que o previsto anteriormente. O milho já subiu 12% este ano e 45% frente à cotação mais baixa registrada recentemente, no fim de junho.

 

O governo continua prevendo uma safra recorde de 335,3 milhões de toneladas, com uma média de 10,2 t por hectare. Mas alguns especialistas esperam que a previsão de rendimento por hectare diminua ainda mais, por causa do clima desfavorável. A Universidade de Illinois prevê 9,9 t por hectare, o que pode diminuir a safra em 9,1 milhões de toneladas, disse Irwin.

 

O tamanho da safra americana de milho é crucial para determinar o cenário mundial em termos de oferta, porque o país exporta mais da metade do milho do mundo, usado principalmente como ração para animais. Se o trigo e o milho ficarem escassos, a demanda do milho aumenta ainda mais.

 

Enquanto isso, a cotação do trigo ficou praticamente estagnada na sexta-feira, já que o USDA aumentou sua estimativa da oferta mundial. A cotação já subiu 30% este ano e 65% em relação ao preço mais baixo recente, registrado no início de junho.

 

Outros temem que a previsão da safra russa também seja otimista. O Ministério da Agricultura da Rússia ainda prevê que os produtores vão plantar 18 milhões de hectares de trigo para a safra da primavera do ano que vem. Eles só plantaram 3,5 milhões de hectares até agora, ante 5,3 milhões no mesmo período do ano passado, disse Pyotr Chekmaryov, chefe do departamento de produção agrícola do ministério, na quarta-feira.

 

O mínimo previsto pelo governo russo é 12 milhões de hectares.

 

O número menor "é muito mais próximo da realidade", disse Andrei Sizov, diretor executivo da SovEcon, uma firma de pesquisa agrícola.

 

A safra e o volume estocado podem determinar se a Rússia vai continuar bloqueando suas exportações até 2011. Por isso que as decisões de produtores como Klevtsevich são tão importantes.

 

"Estamos felizes que muitos produtores estão começando a semear sem esperar pela chuva", disse segunda-feira o vice-ministro da Agricultura, Alexander Petrikov.

 

O trigo russo é cultivado em várias regiões do vasto território do país, e em algumas delas já voltou a chover. Mas outras regiões, como a área nos arredores de Saratov, continuam secas.

 

Plantar sem chuva é arriscado. Klevtsevich, de 46 anos, é o economista-chefe da Agroholding e está plantando em solo seco na esperança de que chova ou que o solo tenha umidade suficiente. Mas ele sabe que se arrisca a obter uma colheita fraca quando o brutal inverno russo derreter no ano que vem.

 

"Esperamos que o trigo de inverno brote na primavera, quando há umidade e calor", disse ele. "Não estamos contando muito com a chuva, mas claro que seria bom."

 

As previsões do tempo no curto prazo não são favoráveis. O site Gismeteo.ru, que usa dados oficiais, não previa chuva para Saratov no fim de semana passado e só prevê precipitação em 18 de setembro, no mínimo. (Colaboraram Anna Masterova e Olga Padorina)

 

Veículo: Valor Econômico


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