Cada vez mais acostumados a tratar de questões "fora da porteira" de suas fazendas, os produtores de algodão anunciaram ontem o lançamento de uma ampla campanha de mídia para reforçar a imagem do produto e estimular o consumo pela indústria nacional.
Muito aceita e valorizada em todas as camadas sociais, a fibra é associada a conceitos altamente positivos, como limpeza, versatilidade, delicadeza, durabilidade e modernidade. Mas a indústria tem dificuldades em estabelecer um elo desses predicados com o consumo interno do algodão.
"O consumidor gosta da camiseta, da toalha, do lençol, mas não sabe exatamente o porquê", afirma o presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Algodão (Abrapa), Haroldo Cunha. Daí, a necessidade de "ligar" os atributos da fibra ao tecido comprado pelo consumido cotidianamente.
Uma pesquisa qualitativa feita com grupos vendedores, jovens e donas de casa, no Rio e em São Paulo, mostrou a "desconexão" do dia a dia das pessoas de imagens, como leveza, maciez, suavidade e resistência. "Temos que tirar a noção de matéria-prima e passar a realçar o produto final, o que pesa na decisão de compra", diz Cunha. Em parceria com indústrias têxteis e o Instituto Brasileiro do Algodão (IBA), a Abrapa estimulará o uso da "marca algodão" nas etiquetas das roupas e nas vitrines do varejo.
A iniciativa da Abrapa tem objetivo de conter a redução do consumo de algodão no país. Nos últimos cinco anos, o uso da fibra natural caiu de 55% para menos de 50% na indústria. "Nosso grande competidor é a fibra sintética", resume Haroldo Cunha. No mundo, o consumo industrial da fibra estacionou ao redor 35%. O executivo lembra que os Estados Unidos têm, desde antes dos anos 1970, um organismo (Cotton Inc.) para cuidar da promoção do algodão.
A Abrapa comemora, de forma cautelosa, o atual momento do cenário internacional. Com os melhores preços da história, o algodão ostenta margens de lucro excepcionais ao produtor. Desde 8 de outubro, a cotação da fibra subiu 32% para entrega em julho de 2011. O preço bateu em US$ 1,50 por libra-peso na Bolsa de Nova York. O índice Esalq subiu a R$ 2,68. "É algo nunca experimentado, mas perigoso. Porque da mesma forma que subiu rápido, pode descer ainda mais rápido", analisa Haroldo Cunha. E isso pode "deixar alguém de fora" da festa e provocar descumprimento de contratos entre indústrias e produtores. "Se comprou a US$ 1,50 e lá na frente, na entrega, o preço cair a US$ 1,20, podemos ter problemas. A indústria pode não querer pagar esse preço assim como o produtor não quis entregar por preço menor quando a cotação explodiu lá atrás", alerta o executivo.
A Abrapa informa que quase metade da produção brasileira de algodão, estimada em 1,7 milhão de toneladas, foi vendida a uma média de US$ 0,75 por libra-peso. "Com o dólar a R$ 1,80, estava bom", diz Cunha. Outras 200 mil toneladas foram comercializadas a US$ 1 por libra-peso. Há mais 700 mil toneladas da pluma a serem vendidas nos próximos meses, o que pode significar grandes margens aos produtores. "Mas vai depender do dólar. Se cair a R$ 1,60, por exemplo, já fica apertado, mesmo com preços históricos", avalia.
Veículo: Valor Econômico