Em vez de aquisições, foco da P&G é mudar hábitos de consumo

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Todas as segunda-feiras de manhã, o CEO da Procter & Gamble, Bob McDonald, reúne-se com meia dúzia de executivos em torno de uma mesa oval como uma bola de futebol americano na sede da empresa em Cincinnati. Ele e sua equipe observam um mapa-múndi digital de 360 graus e confabulam as próximas jogadas. As áreas vermelhas no mapa indicam regiões em que a Procter & Gamble enfrenta a concorrência mais acirrada da Unilever, Kimberly-Clark e outras. As áreas em que a empresa atingiu ou superou as metas estão destacadas em verde.

 

McDonald, formado na academia militar de West Point, nos Estados Unidos, prepara a estratégia da Procter & Gamble como se fosse uma campanha militar. Depois de assumir o leme da empresa há dois anos, o executivo de 57 anos, apostou que poderia desenvolver a gigantesca empresa pelo caminho mais difícil - convertendo à Procter & Gamble sistematicamente cada vez mais pessoas. Ao contrário do antecessor, A. G. Lafley, que em 2005 gastou US$ 57 bilhões para comprar a Gillette - responsável em 2010 por mais de 10% da receita de US$ 78,89 bilhões da P&G -, McDonald não está atrás de alguma grande aquisição. Em vez disso, conta com ampliações das marcas existentes. Isso significa levar adiante tarefas como persuadir os homens na Índia a se barbearem com aparelhos descartáveis, convencer as mulheres africanas dos benefícios dos produtos de cuidados pessoais ocidentais e vender mais branqueadores dentais aos americanos.

 

"É responsabilidade minha e de outros executivos descobrir como conseguir chegar a nossas metas de crescimento sem aquisições", diz McDonald, que passou 8 de seus 31 anos na Procter & Gamble trabalhando na Ásia, além de também ter passado pelo Canadá e Europa. "Ao propor-se a fazê-lo, acaba-se descobrindo como". O padrão a ser alcançado é alto, diz. "Temos tantas oportunidades que, qualquer aquisição que surja, temos de calcular o valor dessa aquisição em comparação a, por exemplo, [o potencial de] entrar em higiene oral no Brasil."

 

Na Índia, onde 50% dos homens vão a barbearias, uma campanha da P&G incentiva a prática de barbear-se em casa

 

É por isso que McDonald adotou o plano de "atender mais consumidores em mais partes do mundo, tanto nas camadas de preço mais altas como mais baixas". Para fazer isso, McDonald caminha pelos corredores de supermercados e farmácias quando viaja pelo mundo, para certificar-se de que os produtos da Procter & Gamble são exibidos com destaque. Ele envia e-mails regularmente para os maiores clientes varejistas da empresa, seja em Boston ou em Bangalore, e para os consumidores comuns. E analisa incansavelmente dados recolhidos nos próprios sistemas computadorizados de informações de marketing, que podem digerir até 10 mil cenários de forma simultânea e prever, por exemplo, se fraldas de altos preços terão grande aceitação no Marrocos ou o impacto que uma promoção de pastas de dente pode ter no Brasil.

 

O foco de McDonald no crescimento orgânico traz vários riscos. Primeiro, o tamanho colossal da Procter & Gamble significa que precisa de um fluxo extraordinário de novas vendas - superior à receita total da concorrente Church & Dwight, fabricante da linha Arm & Hammer - apenas para alcançar o crescimento de 4% previsto por analistas para este ano. A atual estratégia de expandir-se mais em mercados fora dos EUA - que já são fonte de 60% das vendas da Procter & Gamble - também significa que a empresa enfrentará um caminho árduo para elevar os lucros, uma vez que suas margens no exterior são mais baixas do que nos EUA. É por isso que alguns investidores temem que o foco do crescimento orgânico de McDonald possa não ser suficiente para sustentar as ações da empresa, atualmente cotadas em torno a US$ 65, bem abaixo da marca de US$ 73 atingida em dezembro de 2007.

 

"Não vimos um catalisador de curto prazo que os ajude a progredir", diz Peter, administrador de recursos na Fifth Third Asset Management, que possui 1,9 milhões de ações da Procter & Gamble. "É difícil, neste momento, dizer 'Uau, isso aqui vai trazer grandes progressos'."

 

McDonald prevê que a Procter & Gamble terá 5 bilhões de consumidores em 2015, acima dos 4,2 bilhões de 2010. Atualmente, oferece apenas metade de suas 38 categorias de produto em vários de seus 50 principais mercados. O executivo diz que levar o consumo de produtos da Procter & Gamble na China, Índia, Indonésia e África Subsaariana para o mesmo nível que empresa atingiu no México geraria vendas anuais adicionais de US$ 60 bilhões.

 

É por isso que ele trabalha duro para atrair consumidores de mercados emergentes com produtos que são sucesso nos mercados desenvolvidos. Na Índia, onde 50% dos homens vão a barbearias quando querem barbear-se, a Procter & Gamble lançou em 2010 a campanha "Mulheres contra a barba mal feita", para incentivar a prática em casa. Foram exibidas pesquisas mostrando que as mulheres preferem homens bem barbeados e comerciais de TV em que mulheres chegavam em vans e agarravam homens com barba de alguns dias para barbeá-los com Mach3, aparelho da Gillette situado na faixa média de preços. A campanha, ao lado de outra que exibia um aparelho de preço mais baixo, ajudou a Procter & Gamble a capturar quase a metade das vendas do setor no país em menos de dois anos, informa a empresa.

 

As vendas de fraldas descartáveis cresceram com anúncios que relacionam o uso do produto ao sono dos bebês

 

Para conquistar as mães na Índia e levá-las a comprar suas fraldas descartáveis, a Procter & Gamble optou por um marketing diferente do utilizado em casa. Em vez de enfatizar a conveniência das Pampers, destacou pesquisas mostrando que bebês usando fraldas descartáveis à noite dormem melhor - e consequentemente se desenvolvem melhor. O resultado: a Procter & Gamble agora tem a maior participação nas vendas de fraldas no país, informa a empresa.

 

Mesmo com McDonald defendendo que os funcionários passem mais tempo nas casas dos consumidores, observando como limpam os pisos ou tingem os cabelos, ele também usa cada vez mais meios tecnológicos para obter dados. O executivo aliou-se à Cisco Systems, SAP e outras empresas para desenvolver sistemas de tecnologia da informação que ajudem a Procter & Gamble a decifrar suas amplas pesquisas com consumidores e dados de vendas de seus produtos. Observando o mapa digital durante as reuniões, os executivos da Procter & Gamble podem clicar em um país e ver o que os consumidores estão comprando, que promoções funcionam bem, que estoques precisam ser reabastecidos e como as vendas se saem em relação ao planejado.

 

Nos últimos meses, McDonald e sua equipe debateram o lançamento de uma linha de fraldas de baixo preço na Alemanha, quando os dados indicavam que começariam a perder clientes em seis meses, caso não preparassem alguma ofensiva. Decidiram, então, lançar uma marca mais barata juntamente com uma linha de alto padrão. Acabaram conquistando quase 70% do mercado na Alemanha, um recorde.

 

Em março, a Procter & Gamble acertou acordo com a Teva Pharmaceutical Industries, de Israel, maior fabricante mundial de remédios genéricos, para desenvolver em conjunto medicamentos vendidos sem receita. O acordo pode expandir o mercado de produtos de área de saúde da Procter & Gamble, como a linha Vick, para resfriados e tosse. Embora o retorno por investir no desenvolvimento de novas marcas possa levar mais tempo, McDonald diz que vale a pena. Ele também começou timidamente a fornecer serviços por meio de duas franquias nos EUA criadas a partir de produtos de sucesso da Procter & Gamble, a Mr. Clean Car Washes, de lava-rápidos, e a Tide Dry Cleaners, para lavar roupas. As duas redes terão, respectivamente, 15 e 7 lojas até agosto.

 

"Não vou discutir que a Mr. Clean Car Wash que temos aqui em Cincinnati ou as lojas da Tide Dry Cleaners serão a próxima Swiffer", referindo-se ao imenso sucesso do esfregão que se tornou uma marca bilionária para a Procter & Gamble. "Mas esse é um exemplo de até que ponto estamos dispostos a ir para continuar aprendendo e experimentando coisas novas."

 

Qualquer produto lançado pela Procter & Gamble - muitas vezes após pesados gastos em pesquisa - pode ser rapidamente copiado por fabricantes de produtos de marca própria, que oferecem imitações a preços menores. A dona de rede de farmácias CVS Caremark, por exemplo, vende seu próprio pacote com 56 tiras de branqueamento de dentes por US$ 17, enquanto um pacote de 20 Crest 3D White Whitestrips, da Procter & Gamble, sai por US$ 28. Ainda assim, McDonald diz que não planeja reduzir o orçamento anual de pesquisa, de quase US$ 2 bilhões, porque ajuda a gerar produtos novos e aperfeiçoados, que dão vantagem à Procter & Gamble. Esse é um dos motivos pelos quais, em 2010, "crescemos de participação nos EUA e Europa Ocidental, enquanto a participação de marcas próprias caiu na Europa e ficou estagnada ou em queda nos EUA".

 

Conquistas como essa demoram a chegar. Roger L. Jenkins, reitor da Farmer School of Businesses, na Miami University, em Ohio, no entanto, compara a ênfase de McDonald no crescimento lento e constante à parábola da tartaruga e da lebre: "Bob é como a tartaruga - ele vai chegar lá."

 

Veículo: Valor Econômico


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