Aumento da renda alavanca comércio de rua

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O aumento da renda das classes emergentes tem feito com que os centros comerciais de rua sejam alvos de reformulação, em busca de investimentos para atender novos nichos de consumidores que buscam ficar retidos em suas regiões de origem, como acontece seja entre as classes C e D, ou A e B. Hoje, dos 20 principais polos comerciais de rua existentes em São Paulo, ao menos 70% estão em áreas periféricas (bairros de São Mateus, Guaianazxes, Capão Redondo, Nova Cachoeirinha e Itaquera). Porém, há perspectiva de crescimento do segmento de calçados e vestuário também no consumo de alto padrão, a exemplo da região da Rua Oscar Freire, na zona sul, além do mercado especializado, como a Santa Ifigênia, com foco em eletrônicos.

 

As informações foram apresentadas em evento recente, o seminário "Polos Comerciais de Rua - uma estratégia para expansão", promovido pelo Centro de Excelência em Varejo da Escola de Administração da Fundação Getúlio |Vargas (FGV). Segundo pesquisas atuais, os polos comerciais de ruas conjugam fatores importantes e podem se tornar uma alternativa de expansão das lojas e de alavancagem de novos negócios. De acordo com José Luiz Cunha, diretor de Vendas da rede Lojas Marisa, uma das maiores no segmento de vestuário, o setor está forte no mercado interno. Além disso, atualmente 48% das lojas da rede estão localizadas na rua.

 

De acordo com ele, uma das grandes vantagens das lojas Marisa é a maior capilaridade em permear um e outro segmento o que propicia vantagens competitivas. "Diferentemente de outros concorrentes, como Renner e C&A, transitamos muito bem entre os dois modelos. Desenvolvemos uma expertise, que se aplica, tanto para o canal de rua, quanto para o shopping e isso nos traz vantagens em relação aos nossos concorrentes", diz. Segundo ele, atualmente não há quase diferenças nas despesas geradas com os alugueis de lojas e os de shopping centers. A empresa, cujo posicionamento estratégico situa-se na consumidora de classe C, acaba de inaugurar uma nova concepção de vitrines em suas loja da avenida Paulista, onde a iluminação escura permite enfocar, com maior intensidade, os produtos da vitrine. "Uma das vantagens da rua é, que, ao contrário dos shoppings, ela já nasce maturada, pois sempre vão haver pedestres transitando".

 

Periferia

 

No caso, do empresário Marcelo Dória, do Depósito das Lingeries, rede de lojas de moda íntima localizada em São Mateus, extremo leste de São Paulo, o comércio de rua é a essência do seu negócio. "Ocorre que a visão que se tem da periferia ainda é de preconceito, como se fosse apenas um lugar de pobreza e de insegurança. Mas, ao contrário do que se pensa, a periferia ainda é o local onde existe o maior nível de solidariedade entre as pessoas. Costumo dizer que investir na periferia é show", disse ele, arrancando risos da plateia presente ao evento da FGV .

 

"São muitas vantagens competitivas como a proximidade com o cliente e a oportunidade de servir 'quem sempre foi acostumado a servir'. Mas, talvez, a característica mais importante seja a de contribuir para a maior mobilidade social e atuar como instrumento de transformação da realidade de moradores, muitas vezes, em situação de risco".

 

Investimentos

 

Apesar da expectativa das redes de voltar atenção aos polos comerciais, ainda faltam melhorias em várias regiões, em termos de infraestrutura. "É preciso repensar a rua. E isso requer uma maior atenção dos poderes público e privado. Em geral, o peso do comércio de rua ainda é maior, embora os shopping centers cresçam a velocidades mais constantes", aponta Tadeu Masano, professor da Escola de Administração da Faculdade Getúlio Vargas, (EASP-FGV), ao traçar uma visão mais panorâmica do setor em São Paulo. Conforme o especialista, isso ocorre porque as maiores queixas para quem compra na rua "ainda se referem à pouca oferta de transporte público, falta de vagas para estacionamento, insegurança e necessidades de revitalização de pontos degradados".

 

Para ele, se isso não for feito, nos próximos anos haverá uma migração do consumidor da classe C para os shoppings. Ao abordar a evolução do comércio de rua ao longo do tempo, na capital paulista, Ana Maria Biazzi, do Instituto Brasileiro de Avaliações e Perícias de Engenharia de São Paulo (Ibap) aponta que, futuramente, deve ocorrer a migração de marcas preferencialmente encontradas em shoppings, caso de Chili Bean's e Hering, para os polos de rua. "Essas marcas estão descobrindo o potencial desse filão e devem apostar suas fichas nele", acredita Ana Maria.

 

Autora de uma pesquisa de amostragem realizada com 159 lojas da rua 12 de outubro, no centro de São Paulo, a professora constatou que o setor de calçados e de confecções ainda responde pela maior parte dos negócios encontrados nos centros comerciais abertos. Há ainda, na visão da professora, uma tendência em se continuar aplicando investimentos em áreas de comércio especializado, como é o caso da Santa Ifigênia e da Oscar Freire.

 

Ao abordar a dicotomia entre polos de rua e os shopping centers, Juracy Parente, também professor da EAESP-FGV e autor de estudo sobre o assunto, diz que conforto e maior número de serviços , além de fatores ambientais e visuais, são os maiores empecilhos para o desenvolvimento do comércio de rua.

 

Variedade

 

Outros itens, como acesso, atendimento e variedade de lojas praticamente receberam o mesmo grau de avaliação nos dois modelos. "Isso só denota que o índice de satisfação maior ainda predomina shopping centers. Mas prova que a procura por esse estabelecimento ainda encontra mais presença no consumidor de alta renda, sinalizando que se houver mais investimentos no comércio de rua, haverá potencial para novos negócios."

 

De acordo com o professor, diferentemente dos centros planejados de compras, os polos de rua não têm apostado na sua reinvenção e perderam prestígio, face à evolução dos shoppings. "Mesmo assim, o crescimento da renda média do brasileiro tem propiciado bastante dinamismo nessas regiões", acentua.

 

Ele diz que é preciso gerar uma maior sinergia entre o modelo encontrado nos shoppings e o de comércio de rua. Da mesma forma, o setor de shoppings deve buscar alternativas, para dialogar com a rua, abolindo os muros e barreiras que impedem a visão do consumidor.

 

Segmento demanda tempo para se recuperar

 

Enquanto o segmento de shopping centers avança 20% ao ano no País, impulsionado, principalmente pela construção de empreendimentos em cidades de pequeno e médio porte, o comércio de rua, mais comum nas regiões centrais das cidades, e que ficou esquecido por vários anos, agora necessita de investimentos robustos para recuperar a vitalidade e a identidade perdidas. -

 

De acordo com Ana Maria Biazzi, do Ibape, o modelo de negócio encontrado nos shoppings é mais comum na cultura norte-americana, mais avessa ao estilo planejado e à comodidade de encontrar comércio e serviço em um só lugar. "Na Europa ocorre justamente o contrário. Existe toda uma cultura de valorização dos espaços urbanos e das ruas comerciais", destaca.

 

Ana Maria relembra que a construção da primeiro primeira unidade de comércio planejado em São Paulo, em 1966, o Shopping Iguatemi, sinalizou para o primeiro deslocamento do consumidor de alta renda - que antes frequentava o polo comercial da Augusta - para esse novo modelo de negócio.

 

Outros aspectos, como a desindustrialização da capital, a abertura da economia na era Fernando Collor e o lançamento do Plano Real, fortaleceram a existência do comércio informal, mudando a configuração anterior do comércio de rua.

 

Veículo: DCI


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