Correção da tabela foi de 4,5% (meta de inflação), mas, na hora da negociação, as centrais sindicais defendiam uma alta de 6,47%
O reajuste da tabela do Imposto de Renda (IR) da pessoa física em 4,5%, em vigor desde abril, promove uma nova alta disfarçada da carga tributária que anula o aumento real de salários conquistado por boa parte dos trabalhadores este ano. Para especialistas, é um reajuste insatisfatório diante da perspectiva de uma inflação bem superior a 6% .
A correção da tabela do IR é baseada no centro da meta de inflação para este ano. As centrais sindicais defendiam um reajuste de 6,47%, o valor da inflação do ano passado, mas o governo convenceu os sindicalistas a aceitarem 4,5%. Em troca, a equipe econômica incluiu na recém-aprovada medida provisória que trata do assunto uma política que fixa a correção da tabela pelo centro da meta nos quatro anos de mandato de Dilma Rousseff. As centrais já falam, no entanto, em rediscutir com o governo a correção da tabela, diante da evolução dos índices de preços (leia texto abaixo).
Os sindicalistas sabem que, sempre que é corrigida abaixo da inflação, a tabela do IR impõe prejuízos aos trabalhadores, principalmente aos que ganham menos. Quem tem rendimentos superiores a R$ 4 mil, por exemplo, não sofre aumento de carga, porque todas as demais faixas de incidência do imposto são inferiores a esse valor.
Tome-se o caso hipotético de um trabalhador que recebe um salário bruto de R$ 1.761,00 por mês, sem nenhum dependente. Considerando o desconto de 11% do INSS, a base de cálculo para o desconto do imposto na fonte será de R$ 1.567,29.
Pela tabela de 2011, corrigida em 4,5%, a alíquota do imposto para essa faixa de rendimento é de 7,5%. Segundo o Sindicato das Empresas de Serviços Contábeis e de Assessoramento no Estado de São Paulo (Sescon-SP), significa que o trabalhador terá descontado todo mês no seu salário R$ 117,55 de IR retido na fonte.
Isenção. Entretanto, se a tabela fosse reajustada pela projeção da inflação, esse trabalhador estaria isento de recolher o IR e não sofreria desconto no salário. Ao longo de 12 meses, isso representaria um acréscimo de R$ 1.410,60 em sua renda disponível para consumo.
"O governo faz capital de giro com o dinheiro do contribuinte", diz o presidente do Sescon-SP, José Maria Chapina Alcazar. "O governo tira dinheiro do bolso do brasileiro e, se há imposto a ser restituído, só devolve depois de um ano, sem a devida correção monetária." Para ele, trata-se de "confisco do dinheiro do brasileiro".
O presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Paulo Skaf, também não poupa críticas. "Quando o governo diz que só vai conseguir alcançar o centro da meta de inflação na melhor das hipóteses em 2012, ele confessa ao contribuinte que está corrigindo errado a tabela do Imposto de Renda".
Pior, ressalta Skaf, "corrige errado uma coisa que já foi corrigida errado no passado e que está com uma baita defasagem". Segundo cálculos do Sindifisco, o sindicato dos auditores fiscais da Receita Federal, em 2010 a tabela já apresentava defasagem de 64% frente os valores de 1995.
Carga tributária. O aumento da carga tributária implica redução de renda disponível e, portanto, redução de demanda. "Nesse momento de crise global, diminuir demanda pode eventualmente resultar em menor pressão sobre a inflação, que é o objetivo perseguido pelo governo, mas à custa de desemprego", diz o consultor tributário Clovis Panzarini.
O especialista acha "esquisito" o governo reduzir a carga tributária de setores como o automotivo, ao mesmo tempo em que aumenta a carga sobre as pessoas físicas.
Clemente Ganz Lúcio, diretor técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômico (Dieese), diz que o Banco Central e o Ministério da Fazenda consideram mais fácil controlar a renda num momento de pressão inflacionária.
"É mais fácil colocar a coleira no cachorro, mas isso apenas administra o problema." O que resolve, segundo ele, é a economia ter capacidade de produzir bens e serviços para atender ao aumento da demanda impulsionado pelo crescimento da renda.
Veículo: O Estado de S.Paulo