Crise em países desenvolvidos e alta do real diminuem vendas externas e forçam entrada de produtores no varejo
O nome Acqua Brasil foi cuidadosamente pensado para chegar ao coração das italianas em um assunto em que a especialidade brasileira é incontestável: biquínis.
Inventados pelos franceses, são sinônimo de ousadia, criatividade e modelagem minúscula, quando fabricados por aqui.
A aposta em exportar essa fórmula feita por Marcelo Chuairi, criador da marca, e dezenas de outros produtores de Cabo Frio (RJ) vem esbarrando, de 2008 para cá, em duas questões que passam longe do glamour da moda praia brasileira.
As crises nos EUA e na Europa esfriaram a demanda, e a valorização do real tornou o maiô de duas peças mais caro no exterior.
"Investimos para conseguir que nossas peças tivessem qualidade internacional. Hoje, ninguém mais exporta aqui em Cabo Frio. Quem voltou a focar as vendas para turistas no varejo na hora certa sobreviveu. Quem não fez isso fechou as portas", diz o empresário.
Nos tempos de vendas externas aquecidas, a Acqua Brasil chegou a produzir 100 mil peças por ano. Hoje, fabrica entre 20 mil e 30 mil unidades anualmente.
LOJAS
O presidente da Acirb (Associação Comercial da Rua dos Biquínis), de Cabo Frio, Sílvio César Rodrigues, calcula que a queda nas vendas foi de 30% nos últimos três anos. "A nossa saída para sobreviver foi a abertura de lojas", diz Rodrigues, dono da marca Toccare.
Histórias como as de Chuairi e Rodrigues ajudam a entender os números da balança comercial do setor.
Neste ano, até julho, foram exportados 480,8 mil maiôs e biquínis. Em 2010, 614,4 mil peças. Números muito inferiores aos 3,6 milhões de unidades compradas por outros países em 2005, auge das vendas externas.
Em valores, o movimento é parecido: as exportações do produto somaram US$ 19,8 milhões em 2005, montante que caiu para US$ 7,4 milhões em 2010. Até julho deste ano, foram US$ 6 milhões em produtos vendidos ao exterior.
"Quando houve a crise imobiliária americana, a exportação já caiu. Depois, países da Europa, como Espanha e Itália, também começaram a sofrer. E agora nova crise nos Estados Unidos", afirma Rodrigues.
As vendas para os EUA caíram de 1,2 milhão de peças em 2005 para 147,3 mil unidades neste ano, até julho.
Escala e recursos para promoção fortalecem empresas maiores
Os remanescentes das exportações de biquínis são principalmente as marcas maiores e mais conhecidas. Apesar de também terem sentido o impacto da crise internacional e do câmbio, elas têm maior poder de barganha com fornecedores e condições financeiras de promover seus produtos no exterior.
Um exemplo é a Poko Pano, que hoje exporta para mais de 40 países e conta com três franquias da marca em Portugal. "O maior inimigo das exportações tem sido a valorização do real", afirma a estilista Paola Robba.
O impacto da crise, diz, aparece indiretamente. "O mercado interno está temeroso da nova realidade mundial", afirma.
A Salsa Beachwear é outro caso de empresa que mantém suas exportações. Katja Uszkurat, dona da marca, diz que a empresa participou de uma feira em Paris e está fechando contrato para vender para países como França, Itália, Espanha e Portugal.
Para conseguir entrar nesse mercado, segundo Uszkurat, é necessário adaptar as peças ao gosto, ou ao pudor, das estrangeiras.
"As calcinhas precisam ser maiores e os bustos também. O nosso G representa o P deles", diz.
A empresa vende também para Luanda, em Angola. Nesse caso, sem nenhuma adaptação, afirma a empresária, pois o biotipo das africanas é mais parecido com o das brasileiras.
A despeito da animação, ela adverte que a crise internacional vem prejudicando os negócios. "Sentimos uma pressão muito grande nos preços, e os pedidos também estão mais moderados."
Veículo: Folha de S.Paulo