Moinhos caminham para a concentração

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Totalmente dependentes da Argentina para importação de trigo, os moinhos brasileiros estão acuados. Quase sem alternativas para expandir operações no país, a concentração é um caminho natural para essas indústrias. Pulverizado, o setor ainda conta com 213 moinhos, dos quais mais da metade são considerados ineficientes - muitos operando com capacidade ociosa de até 40%. O setor, com faturamento de R$ 9 bilhões por ano, também amarga há alguns anos estagnação do consumo no país. 

 

Com exceção da Bunge, líder nesse mercado no Brasil, e uma das mais verticalizadas, as maiores moageiras trabalham pela regionalização de seus negócios e em nichos de mercado para ganharem mais espaço. As seis maiores empresas brasileiras processam mais de 50% da produção. E esta estratégia tem surtido efeito. Já os pequenos, a maioria no setor, têm um atuação com prazo de validade considerado curto pelo mercado. "Os pequenos não têm vocação e vivem em função do trigo nacional", disse uma fonte do setor. 


 
Com dois moinhos - um em Curitiba (PR) e outro em São Paulo (SP) -, o grupo Anaconda atua em áreas diferentes em cada Estado para se adaptar ao perfil do consumidor. Em São Paulo, o Anaconda negocia farinha e pré-misturas para indústrias de panificação, um mercado com potencial. Já no Paraná, o moinho atende o consumidor no varejo, um mercado considerado duvidoso. "O consumidor do Sul do país, boa parte formado por imigrantes europeus, costuma comprar farinha para preparar alimentos em sua casa. As vendas no Sul são em embalagens maiores, de 5 quilos, ante as de 1 quilo vendidas em São Paulo", disse Luiz Martins, presidente do grupo.

 

Segundo Martins, o grupo não quer se aventurar em outros mercados. "Priorizamos a compra de trigo de qualidade superior para diferenciarmos nossos produtos." Com faturamento de R$ 400 milhões, o Anaconda é o quinto maior no país, com processamento de 500 mil toneladas por ano. 

 

A dependência da matéria-prima da Argentina, a estagnação do consumo de produtos derivados de trigo - o consumo anual oscila entre 9,5 milhões e 10,5 milhões de toneladas -, e a grande concorrência no mercado interno inibem pesados investimentos no país. Por conta da necessidade de importação - que gira em torno de 5 milhões a 7 milhões por ano, muitos moinhos estão instalados próximos aos portos do país. 

 

Nesse setor de poucos aportes, a Bunge se destacou nos últimos meses. Em agosto, a gigante anunciou a compra da divisão de trigo da Cargill no Brasil por R$ 33 milhões. O negócio incluiu a moagem de trigo e comercialização de farinha e pré-mistura para atender à indústria de massas, biscoito e panificação no país., segmento do qual a gigante é líder, com 20% de participação. O grupo possui sete unidades: Recife (PE), recém-construída, Brasília, duas no Rio, Santos (SP), Ponta Grossa (PR) e Joinville (SC). 

 

Em 2003, a gigante fechou parceria com a J. Macêdo, a segunda maior indústria do país, com faturamento de R$ 1,2 bilhão e importante penetração no varejo. Pelo acordo, a Bunge assumiu as linhas de farinhas industriais e pré-misturas do moinho brasileiro, que, por sua vez, passou a controlar as linhas de massas e farinhas domésticas da múlti. Em 2006, as duas empresas unificaram as vendas de seus produtos no país. No mercado, essa união foi interpretada como um possível passo consolidador da Bunge. As empresas negam. Ao Valor, o J. Macêdo informou que está focando suas estratégias em produtos de consumo. 

 

A Bunge afirmou, por meio de sua assessoria, que o grupo "prioriza ações estratégicas e acredita nas grandes oportunidades do Brasil em uma categoria que é fundamental no setor de alimentação". 

 

Com uma média de 30% de capacidade ociosa no país - algumas chegam a 40% -, os moinhos concentram investimentos em renovação do parque industrial. Dos 213 moinhos, dois terços são controlados por grupos familiares, sobretudo no Paraná e Rio Grande do Sul. "Muitos moinhos do Sul operam somente durante o período de colheita", disse Martins, que também é presidente do Sindustrigo (Sindicato das Indústrias do Trigo no Estado de São Paulo). 

 

"A tendência são os negócios regionais", disse Christian Mattar Saigh, presidente do Moinho Santa Clara, de São Caetano (SP), que processa 18 mil toneladas de trigo por mês. O moinho atua em um raio de 400 quilômetros a partir de onde a fábrica está instalada. "Atuamos basicamente na Grande São Paulo." Segundo o empresário, o mercado de massas para pizza é interessante e tem crescido. 

 

O pãozinho é considerado uma instituição no país. No entanto, seu consumo está muito aquém se comparado com outros países. O brasileiro consome 30 quilos de pão por ano. É pouco. A Argentina consome o dobro e o Chile o triplo. Na Alemanha, o consumo é de 80 quilos/ano. 

 

Com sete moinhos, o grupo Predileto prometia um grande salto ao vender por US$ 53 milhões sua divisão de aves, a Pena Branca, para o grupo Marfrig em março deste ano. Segundo Antenor de Barros Leal, presidente do grupo, a crise "pegou todos de surpresa". Com faturamento de R$ 900 milhões, a companhia, a quarta maior no ranking do país, tem uma forte atuação no Nordeste, concorrendo com outro peso pesado na região, o M. Dias Branco, o terceiro no ranking, considerado um dos mais capitalizados do setor. 

 

Altamente endividado, com um quarto de sua receita comprometida, o Predileto é conhecido por ser agressivo em preço no mercado. Além do Nordeste, atua no Norte e Centro-Oeste do país. 

 

Também pego de surpresa pela crise, o Moinho Pacífico, presidido pelo empresário Lawrence Pih, engavetou um projeto ambicioso de R$ 100 milhões para a construção de sua segunda unidade no país e de um parque industrial em Guarulhos (SP), em um terreno de 105 mil metros quadrados. Com faturamento de R$ 300 milhões , a idéia de Pih era verticalizar seus negócios para a produção de massas, pães e biscoitos. Seu segundo moinho seria erguido em Santos (SP), onde o grupo já possui uma fábrica. 

 

No ano passado, Pih também planejava abrir o capital da empresa para tocar seus projetos. Os planos foram adiados. "O setor está ficando cada vez mais frágil. Investe-se pouco em renovação dos parques industriais. A alternativa é a verticalização", disse. 

 

Veículo: Valor Econômico


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