A francesa Danone SA emitiu um alerta de lucro ontem, citando uma queda no consumo no sul da Europa, especialmente na Espanha, em mais um sinal das consequências para grandes empresas da piora da crise de dívida soberana da Europa
A empresa dona de marcas de renome que incluem os iogurtes e sucos Activia e a água PuraFont informou que a deterioração no sul da Europa tem sido "rápida" e foi "significativamente mais forte do que o esperado" no segundo trimestre. A maior fabricante mundial de iogurtes reduziu a meta de margem operacional para o ano inteiro, mas acrescentou que ainda espera que a receita suba à medida que os mercados emergentes de rápido crescimento ajudem a compensar o quadro desolador na Espanha e em outros lugares.
A advertência é a mais recente evidência de que as deploráveis condições econômicas do sul da Europa estão comendo os lucros. Na sexta-feira, a Carrefour SA anunciou que vai vender suas grandes operações de supermercado na Grécia para seu parceiro local e sair do país depois de acumular prejuízos lá. A gigante varejista emitiu vários alertas de lucro, à medida que luta para recuperar seus resultados em meio aos desafios que seus negócios enfrentam nos principais mercados, incluindo Espanha.
A Unilever, fabricante anglo-holandesa de produtos para o lar e cuidados pessoais, sua rival britânica Reckitt Benckiser Group PLC e a suíça Nestlé SA também alertaram que o comércio tem se tornado cada vez mais difícil na Espanha, Grécia, Itália e partes da periferia da Europa.
"O alto desemprego e aumento de impostos estão diminuindo o poder de compra das famílias, especialmente nos países da zona do euro mais expostos à crise de dívida soberana", disse Clemente de Lucía, economista da zona do euro do BNP Paribas, citando Espanha e Itália como os casos mais graves. "Este vai ser um ano ruim para o consumo."
De Lucía prevê que o consumo pode sofrer uma contração entre 0,3% e 0,4% este ano, a primeira queda desde o declínio de 1% registrado em 2009, quando a crise financeira começou a causar danos.
A Danone informou que sua margem operacional de 2012 ficará meio ponto porcentual abaixo dos 14,72% alcançados no ano passado. A empresa antes previa que sua margem operacional ficaria estável este ano.
A Danone afirmou que ainda espera que a receita total cresça de 5% a 7% e que o fluxo de caixa livre chegaria a 2 bilhões de euros (US$ 2,5 bilhões), à medida que as vendas em mercados emergentes e nos EUA ajudam a compensar a situação na Europa.
A Danone apontou para a queda de confiança do consumidor na Espanha, onde sua participação no mercado de produtos lácteos frescos caiu de 53,6% um ano atrás para 51,2% este ano. O país é "importante para a Danone [...] por causa da história do grupo e em termos de tamanho", disse em uma teleconferência o diretor financeiro da Danone, Pierre-André Térrisse. A Espanha é responsável por cerca de 7% das vendas da Danone, disse ele.
Em meio à recessão, os consumidores espanhóis foram fechando a carteira. A taxa de desemprego subiu para 24%, e essa taxa dobra para os trabalhadores mais jovens. A economia do país deve se contrair 1,8% este ano. Os gastos no varejo vêm caindo acentuadamente, tendo perdido quase 10% em abril em relação ao ano anterior, segundo o Instituto Nacional de Estatísticas da Espanha, o 22o mês consecutivo de queda.
A Danone está mais exposta à Espanha do que alguns de seus pares e sua gama de produtos não é tão diversificada como a dos rivais. Com cerca de 58% de suas vendas globais provenientes de sua divisão de produtos lácteos frescos, os analistas dizem que a empresa está sendo atingida por consumidores que estão migrando para produtos mais baratos devido à crise. "O iogurte é um produto supérfluo e a Danone tem uma diferença de preços bastante grande com relação às marcas próprias" de supermercados, diz Eric Scher, analista da Sanford C. Bernstein.
A Danone disse que vai lidar com o ambiente na Espanha e no sul da Europa "com uma combinação de suporte para suas marcas e medidas para tornar seus produtos mais competitivos".
A empresa também culpou o aumento do custo de matérias-primas por sua perspectiva mais pessimista, dizendo que a inflação "tem sido mais forte do que o esperado desde o início do ano", em particular para o soro, proteínas do leite e embalagem.
A notícia provocou uma queda nas ações da Danone, que terminaram o pregão em Paris com queda de 6%, para 48,70 euros. O alerta não é a primeira decepção gerada pela empresa nos últimos anos. Em 2009, a Danone abalou a confiança dos investidores ao divulgar resultados piores que o esperado e uma surpreendente emissão de 3 bilhões de euros de novas ações. Scher disse que os investidores estão nervosos sobre "o potencial de algo mais acontecer".
Andrew Wood, analista da Sanford C. Bernstein, previu que as ações seriam golpeadas pela previsão de queda nos lucros e pela sensação de que "surpresas negativas são sempre uma forte possibilidade".
Térrisse, o diretor financeiro, disse que a Danone não está nem excessivamente otimista nem tentando esconder a situação. "Decidimos comunicar isso agora porque achamos que esta é uma informação relevante e a credibilidade e honestidade da administração exige que a gerência comunique as más notícias quando elas existem", disse ele.
Veículo: Valor Econômico