Hortifruti, uma feira de 500 milhões de reais

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Fundado por dois feirantes, o varejista carioca Hortifruti é recordista de vendas por metro quadrado. Mas, para continuar a crescer, terá de sair da zona (sul) de conforto


Todo mundo sabe quem são os protagonistas do varejo de alimentos no Brasil: os franceses do Pão de Açúcar e do Carrefour, os americanos do Walmart, os chilenos do Ceconsud. Todos com faturamento de bilhões de dólares, presença em dezenas de países e muito poder de barganha.

Na teoria, é a combinação ideal para cobrar menos, atrair mais clientes e ganhar mais dinheiro. Volta e meia, porém, aparece um concorrente pouco conhecido que chama a atenção não por seu gigantismo, mas por estar fazendo alguma coisa diferente — e certa.

Um exemplo recente é o carioca Hortifruti, fundado por dois feirantes nos anos 80, que hoje, com 23 lojas no Rio de Janeiro e uma no Espírito Santo, vende 42 000 reais a cada metro quadrado. Nenhuma outra empresa com receita acima de 500 milhões de reais consegue vender tanto.

É mais do que o dobro da marca do Pão de Açúcar, de 19 000 reais por metro quadrado. O feito chama ainda mais atenção porque o Hortifruti tem 60% de sua receita baseada na venda de frutas, legumes e verduras, produtos que custam pouco e apodrecem rápido. Suas lojas, localizadas principalmente na rica zona sul carioca, lembram feiras livres — muito limpas, organizadas e climatizadas, é verdade; mas, ainda assim, feiras livres. Qual é o segredo?

O Hortifruti foi fundado por Gilberto Lopes e Tadeu Fachetti, que há 23 anos abriram um sacolão (daqueles que vendem frutas e legumes com preço único) em Colatina, no interior do Espírito Santo. Na época, Lopes trabalhava como faz-tudo no sacolão de outro empresário local, Paulo Hertel, que também virou sócio do Hortifruti.

Em poucos meses, eles perceberam que vender todos os produtos pelo mesmo preço não era o caminho. Os clientes levavam os itens de maior valor e deixavam os mais baratos para trás. Os sócios então decidiram inverter a lógica.

Apostaram na qualidade, e não no preço, para atrair clientes interessados no frescor de produtos de uma feira livre com o conforto de um supermercado, como ar-condicionado e estacionamento. Em 1990, a dupla levou o negócio para o Rio de Janeiro e passou a abrir uma loja por ano.

Apesar do crescimento, o Hortifruti se mantém fiel ao estilo feira livre de ser. A começar pela logística. Diferentemente de seus concorrentes, tem uma frota própria de 211 caminhões que abastecem as lojas cinco vezes por dia com frutas e legumes frescos comprados de 960 pequenos e médios produtores.

O Hortifruti vende também pães, sucos e frios. Mas não oferece as linhas populares dos grandes fabricantes — apenas produtos artesanais e orgânicos comprados de pequenos fornecedores. Ou seja, daqueles que o pessoal­ do Leblon gosta de levar para casa depois da praia.

Com essa estratégia, consegue cobrar até 13 reais por 1 quilo de uva, quase o dobro do que os concorrentes da porta ao lado cobram pela uva da mesma variedade. “Ocupamos de propósito um espaço entre a feira livre e o supermercado”, diz Tiago Miotto, sobrinho de Fachetti e presidente da empresa. Para manter o atendimento personalizado típico das feiras, o Hortifruti tem 140 funcionários por loja — 50% acima da média do mercado.

Vender muito por metro quadrado é uma necessidade. As lojas do Hortifruti ficam em endereços nobres, como os bairros cariocas Leblon e Ipanema, e  70% dos clientes são das classes A e B. Encontrar imóveis nessas regiões é cada vez mais difícil — e caro. A última loja, inaugurada em Ipanema, demandou dois meses de negociação e um investimento de 4,5 milhões de reais.

“Precisamos estar em bairros nobres. Como o preço do aluguel sobe e falta espaço, temos de vender mais com menos”, diz Miotto. As despesas do Hortifruti com aluguel passam de 20 milhões de reais ao ano. Por isso, a média de vendas por metro quadrado precisa continuar a subir. A meta é chegar a

45 800 reais neste ano. É o único jeito de manter a margem de lucro — calculada por analistas em torno de 4%, pouco acima da margem da área de alimentos do Pão de Açúcar, de 3,8%. 

Do Rio para o Brasil?

O maior desafio do Hortifruti é conseguir esses números também longe do Rio de Janeiro — já que está em meio ao maior plano de expansão de sua história. A BR Investimentos, do economista Paulo Guedes, comprou, em 2010, 30% do capital da empresa. Pagou estimados 70 milhões de reais e montou uma estratégia para chegar a novas cidades.

Só em São Paulo, prevê investir 160 milhões de reais até 2016 para abrir de seis a oito lojas por ano. Outras capitais também estão no radar. Neste ano, a meta é elevar o faturamento de 540 milhões para 650 milhões de reais. “Nossa expectativa é que a companhia esteja pronta para abrir o capital em dois ou três anos”, diz Priscila Rodrigues, sócia da BR Investimentos e conselheira do Hortifruti.

Ao chegar a novas cidades, a empresa vai bater de frente com redes locais já estabelecidas — o mercado carioca é mais pulverizado do que o paulista, por exemplo. Grandes varejistas como o Pão de Açúcar, agora sob o comando do francês Jean-Charles Naouri, também investem em unidades menores, de até 1 000 metros quadrados, como o mini Extra. 

“O modelo de lojas de vizinhança é o que mais cresce no país, já que os consumidores fazem cada vez mais visitas aos pontos de venda”, diz Flávio Tayra, da Associação Brasileira de Supermercados. Sair da zona de conforto é difícil. Sair da zona sul do Rio também vai ser.


Veículo: Revista Exame





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