Produtos orgânicos e frescos nas prateleiras não é mais exclusividade de feiras. Hoje, varejistas investem na união com a agricultura familiar para melhorar os serviços e impulsionar os negócios. A parceria da rede de supermercados Walmart com pequenos produtores completa dez anos em 2012. Somente no Rio Grande do Sul, mais de mil famílias participam do programa. Porém, a pequena produção gaúcha ainda resiste em se relacionar com grandes indústrias e enfrenta dificuldades em competir com o resto do mercado brasileiro.
O Clube dos Produtores foi criado pelo Walmart Brasil, em 2002, para viabilizar a comercialização de produtos cultivados pela agricultura familiar nas 500 lojas da rede. Inicialmente, o programa contava com 14 famílias gaúchas, hoje são 9,5 mil famílias de pequenos produtores em 12 estados do País. “Buscamos exatamente esse público para desenvolver localmente todas as regiões de atuação do grupo”, esclarece Ari Biondo, gerente de agronegócios do Walmart Sul. De janeiro a junho deste ano, o valor das compras realizadas pelo mercado através do clube somou R$ 93,3 milhões. Em 2011, o investimento foi de R$ 150 milhões.
Mais de 1.050 itens diferentes são comercializados nos supermercados gaúchos da rede multinacional. Os produtos do clube podem ser comprados na padaria, fiambreria (queijo, salame, presunto), açougue, padaria, peixaria e mercearia. “Conseguimos nos posicionar muito bem dentro da loja”, afirma Biondo. No Brasil, 48% das mercadorias do programa são encontradas na seção de hortifruti, que movimenta 75% dos valores faturados. O engenheiro-agrônomo do Walmart também defende que a agricultura familiar é beneficiada no momento em que há compromisso por parte dos compradores, com prazos de pagamentos diferenciados e abonados por contrato.
Há 15 anos, Adriane Bittencourt e o marido, Itamar Barbosa de Campos, plantam hortaliças para o comércio. Em 2008, o casal firmou parceria com a empresa e iniciou as vendas para o Nacional de Guaíba, mesma cidade de sua propriedade. A proximidade facilita o transporte, diminui os custos e possibilita o consumo de folhagens frescas pelos fregueses.
Atualmente, cerca de 70 dúzias de alfaces são fornecidas por semana para abastecer as gôndolas do supermercado. Em 2009, a família vendia apenas seis variedades de folhosas para o Walmart, porém, a melhora da produção resultou em investimentos que elevaram este número para 18. Antes de participar do clube, a família vendia para fruteiras e mercancias locais. O receio de trabalhar com o varejo teve que ser superado.
A dificuldade de conseguir compradores e de estabelecer um preço justo motivou a busca por novos negócios. Com isso, a renda de Adriane e Campos melhorou e, hoje, lucram até R$5 mil por mês. “Conseguimos melhorar a propriedade, o setor do trabalho e a nossa casa”, relata. O casal conta com a ajuda do filho mais velho, Igor, que é formado em técnico-agrícola. Antônio Conte, coordenador de
fruticultura e olericultura da Emater, defende que a nova forma de cooperação é uma proposta bastante evoluída e tende a expandir em longo prazo.
Produtos gaúchos enfrentam concorrência com outros estados
Iniciativas como o Clube dos Produtores do Walmart possibilitam uma nova relação de negócios para a agricultura familiar, porém, pequenos e médios agricultores ainda enfrentam a concorrência com outros estados do Brasil. As mercadorias bem aceitas pelos consumidores são vendidas em todo o País. “Os produtores adquiriram um mercado que eles não tinham antes”, afirma o gerente de agronegócios do Walmart Sul, Ari Biondo.
De acordo com o coordenador de fruticultura e olericultura da Emater, Antônio Conte, os hortigranjeiros do Rio Grande do Sul possuem poucos canais de comercialização. Entre eles, estão a negociação direta com redes de supermercados, o fornecimento para atacadistas que servem de intermediários para o varejo e a venda em feiras. Porém, os negócios regionais com o comércio ainda são muito instáveis.
Muitas vezes, a agricultura gaúcha desfruta de uma excelente safra com boas condições climáticas, mas as superofertas de outros estados prejudicam a venda dos produtores locais. Segundo Conte, as redes de mercados que atuam no Estado tentam estabelecer um vínculo contínuo com cultivadores locais, “mas no momento que aparecer uma laranja de São Paulo com o preço inferior, eles reduzem a compra regional e passam a trazer de lá”, exemplifica o engenheiro agrônomo.
Os agricultores gaúchos concorrem com os baixos preços do Sudeste e Centro-Oeste. “A nossa condição geográfica é desvantajosa”, justifica Conte. Para o representante dos hortigranjeiros da Emater, a dificuldade de desbravar outros mercados no Brasil reforça a necessidade de fortificar o comércio interno do Estado.
A necessidade de políticas públicas que possibilitem expandir nichos e melhorar a lucratividade dos produtores é muito importante. Por enquanto, uma solução é estimular a comercialização direta com o consumidor. A venda em feiras e quitandas possui a tendência de agregar valores aos produtos frescos e orgânicos. Essa nova forma de negociar é mais fácil e necessária de ser executada no Interior, que tem um mercado ainda mais limitado. No entanto, a mudança exige alterações na rotina e disciplina por parte dos envolvidos.
Veículo: Jornal do Comércio - RS