Falta de terras e de mão de obra encarece produção de comida

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Produtores de alimentos sofrem com dívidas e pouco espaço para crescer e se queixam de falta de incentivo

Agricultores e economistas dizem que problemas estruturais mais profundos afetam o preço dos produtos

O Brasil, uma superpotência agrícola com terras férteis em abundância, ainda econtra problemas para fornecer alimentos a uma classe consumidora crescente, a preços acessíveis.

A produção do Brasil de commodities de exportação como soja, milho, açúcar e café está crescendo mais rápido do que em qualquer lugar do mundo, e ninguém considera o risco de uma iminente escassez de alimentos em um país tão rico em recursos naturais.

Mas a maior economia da América Latina está se tornando um conto de duas contrastantes políticas agrícolas.

Culturas de exportação são um modelo de capacidade tecnológica e alta rentabilidade, enquanto as fazendas responsáveis por alimentar uma classe crescente de consumidores permanecem quase nas mesmas condições há décadas: em sua maioria pequenas e familiares.

Oprimidos por dívidas, vulneráveis a danos do tempo e espremidos para fora de suas terras pelas culturas de commodities, essas fazendas são o primeiro elo de uma longa cadeia de ineficiências que fizeram os preços dos alimentos subirem em um país ainda marcado pela sua longa história de inflação.

"O governo não sabe o que é agricultura, ele só sabe o que é agricultura na balança comercial", disse o agricultor Cyro Cury, que cultiva dez tipos de tomates em uma fazenda em Salto (SP). "Não temos nenhuma estratégia de trabalho, nenhum levantamento de dados das regiões... A gente não pode ser chamado de celeiro do mundo."

O governo federal em grande parte culpa o recente aumento de preços a fatores sazonais que não pode controlar. "Houve alguns problemas em função da clima. Mas é uma política bem definida para essas culturas através de linhas de crédito, intervenção por preço mínimo", disse o secretário de Política Agrícola do Ministério da Agricultura, Neri Geller, sugerindo que os preços irão cair em breve.

Há um consenso crescente entre agricultores e economistas, no entanto, de que problemas estruturais mais profundos, e não apenas chuvas irregulares, deixam o Brasil vulnerável à oscilação dos preços dos alimentos.

Como em muitos países em desenvolvimento, a comida ainda é responsável por uma grande fatia do índice de preços ao consumidor do Brasil (22%) e frutas e vegetais frescos são amplamente consumidos por todas as classes.

PROBLEMA ESTRUTURAL


Dentre os fatores que estimulam o alto preço dos alimentos está a falta de trabalhadores agrícolas em um país agora desfrutando de quase pleno emprego.

As empresas de serviços têm atraído os trabalhadores não qualificados, oferecendo-lhes melhores regalias e uma carga de trabalho mais leve. "Hoje, o tipo mais escasso de trabalhadores no Brasil é o não qualificado", diz o engenheiro agrônomo Mauro Lopes, da FGV-RJ.

Diferentemente de plantações de soja e açúcar de grande porte, que são em sua maioria mecanizadas, bem capitalizadas e muitas vezes administradas por empresas estrangeiras, cerca de 60% das fazendas do Brasil ainda são familiares e contam com o trabalho manual.

Cury, o agricultor de tomate, diz que gostaria de plantar tomates em mais oito estufas nesta temporada, mas não conseguiu encontrar novos trabalhadores por um salário de R$ 1.000/mês.

Terras para culturas destinadas ao mercado interno também são cada vez mais escassas. Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que a área plantada com arroz e feijão --alimentos básicos da dieta nacional-- caiu cerca de 30% desde 1990, quando a população era 25% menor.

Há uma outra parte da história da inflação de alimentos no Brasil: a grande diferença entre os preços no atacado e ao consumidor.

"O poder de compra mais forte fez as companhias passarem todos os aumentos de custos para os consumidores", disse o economista Mauricio Nakahodo, do Bank of Tokyo-Mitsubishi, em São Paulo.



Veículo: Folha de S.Paulo


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