Pesquisa do Idec mostra que 6 maiores redes brasileiras transferem a responsabilidade para fabricante
No país em que há leis que pegam e outras que não, pesquisa feita pelo Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) mostra o desrespeito contumaz das seis maiores redes varejistas do Brasil — Casas Bahia, Fast Shop, Insinuante, Magazine Luiza, Ponto Frio e Ricardo Eletro — ao Código de Defesa do Consumidor (CDC), quando o assunto é produto com defeito. Pela lei, é escolha do consumidor procurar o lojista ou o fabricante no prazo de 60 dias para bens não duráveis e 90, para os duráveis defeituosos. No entanto, o varejo só dá ao cliente essa possibilidade durante um período que varia de dois a sete dias.
A gravidade da situação levou o Ministério Público do Rio de Janeiro a mover uma dezena de ações civis públicas contra empresas do varejo e também de outros setores por descumprimento da lei. O promotor Julio Machado, do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Defesa do Consumidor, diz que há uma grande resistência ao cumprimento da obrigação:
— O relacionamento do consumidor é com o varejo, ele é mais acessível. E é mais fácil para o lojista exigir a solução do fabricante do que para o cliente. E há casos em que não há sequer assistência técnica na cidade.
CONSUMIDOR DEVE RECLAMAR
O promotor destaca que não há dificuldades para obter provas nesses casos. Há inclusive, diz Machado, empresas que estabelecem na nota fiscal prazos aleatórios para troca, que consideram válido também para o caso de produto com defeito:
— A atuação do MP é dirigida à Justiça. E é a Justiça que precisa dar uma resposta adequada a essa questão. Já o consumidor precisa ter consciência de seu direito e não aceitar docilmente os prazos impostos por lojistas.
Christian Printes, advogado do Idec, recomenda que o consumidor faça reclamação por escrito e encaminhe-a à empresa pelos Correios com aviso de recebimento (AR) ou vá à loja e exija visto do gerente.
— Assim, o consumidor terá como provar que fez a reclamação dentro do prazo previsto pelo CDC. E a partir da data de reclamação ao fornecedor, não sendo produto essencial, o prazo é de 30 dias para o conserto. Caso isso não ocorra, o cliente pode exigir troca do item ou ressarcimento do valor pago — explica o advogado, que alerta sobre a importância de registrar queixas no Procon. — Se não houver solução, há o Judiciário.
PRÁTICA ESTÁ DISSEMINADA
Após quase cinco meses de embate com o Ponto Frio para a troca de um fogão que chegou amassado, Fábio Medeiros ainda analisa se entrará ou não na Justiça contra a varejista:
— Ganhei o fogão de presente de casamento da minha mãe em outubro. E, só depois que escrevi para a DEFESA DO CONSUMIDOR, a empresa decidiu me atender. Já tinha até comprado um outro e estava preparando a ação, o que ainda não descartei.
O Ponto Frio informa que foi autorizada a troca do produto.
O desrespeito a prazos não é exclusividade das seis grandes do varejo. Vitor Bernardo Arantes comprou um ar-condicionado na Tele-Rio e também não pode contar com o auxílio da empresa quando o item deu defeito:
— Comprei o ar-condicionado no fim de dezembro e quando o testei, em janeiro, ele não funcionou. Na loja, fui informado de que o prazo para troca era de 72 horas e orientaram- me a buscar a assistência técnica, que, aliás, me prestou um péssimo serviço.
O Serviço de Atendimento ao Consumidor da Tele-Rio, no entanto, afirma que poderia ter intermediado o conserto para o consumidor. A varejista diz ter linha direta com fabricantes para casos como o de Arantes.
Em resposta à pesquisa do Idec, a Fast Shop afirma que em caso de produto com defeito, “por mera liberalidade”, em prazo informado na nota fiscal, que varia de acordo com o produto e a promoção, faz a troca do item, após confirmação do vício. Em caso de reparo de defeitos cobertos pela garantia, diz não exigir a avaliação técnica. Segundo a empresa, a política é suplementar à garantia estabelecida pelo CDC, que afirma cumprir.
EMPRESAS DIZEM CUMPRIR CDC
Os sites CasasBahia.com.br e Pontofrio.com afirmam agir de acordo com a lei e destacam que informam sobre a política de trocas nas páginas iniciais, no item “Trocas e Devoluções”. Com relação às lojas físicas, a Viavarejo — que responde por Casas Bahia e Ponto Frio — também garante cumprir o CDC e afirma que recomenda acionar o fabricante “para a tentativa de reparo do produto no prazo de 30 dias”. A Viavarejo destaca “que não possui qualificação técnica para constatar o vício ou realizar reparo de produto, e que eventual tentativa poderia invalidar a garantia de fábrica”.
A lei, no entanto, não fala que o lojista deve fazer o conserto, mas se responsabilizar para que o item volte ao consumidor pronto para o uso. A rede varejista diz ainda oferecer a troca imediata de item com problema funcional aparente até 72 horas após a compra.
Segundo o Magazine Luiza, em compras pelo site, o consumidor tem sete dias, a partir do recebimento da mercadoria, para se arrepender da compra. O advogado do Idec explica que não há relação entre o prazo de arrependimento, previsto em lei, com o período para reclamação de defeito. Nas lojas físicas, são concedidos quatro dias para troca de produtos com vício de fabricação. A empresa acrescenta que tal prática é “um benefício ao consumidor, uma vez que não possui previsão legal”. Após este procedimento, diz, o produto dentro da garantia será encaminhado à assistência técnica.
A Máquina de Vendas, das marcas Ricardo Eletro e Insinuante, diz investir para melhorar o atendimento e acelerar a solução das reclamações.
Veículo: O Globo - RJ