Após melhora da qualidade, trigo nacional ganha liquidez

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Num passado recente, há dois ou três anos, sobrava trigo nacional nos armazéns. Uma falta de liquidez aparentemente irracional em se tratando de um país que precisa importar ao menos metade do cereal que consome anualmente. De um lado, os moinhos alegavam que o trigo nacional não era adequado para fabricar farinha de panificação, destino de mais de metade do cereal processado no país. De outro, os produtores argumentavam que se tratava de estratégia da indústria para baixar os preços.

Mas essa falta de liquidez crônica do trigo brasileiro está acabando ou, pelo menos, diminuindo de maneira importante, acredita o novo presidente do conselho consultivo da Associação Brasileira do Trigo (Abitrigo), o empresário Marcelo Vosnika. "A tendência é de a liquidez do cereal nacional melhorar", afirma Vosnika.

O trigo brasileiro, sem tradição exportadora, está há pelo menos três anos consecutivos em lua de mel também com o mercado internacional. Após o pico de embarques de 2,5 milhões de toneladas em 2010/11 - motivado pela quebra de safra dos produtores da região do Mar Negro -, o cereal nacional vem conseguindo manter um volume de exportação acima de 1,5 milhão de toneladas ao ano, na esteira de uma demanda maior do que a oferta pela commodity no mundo. As importações continuam elevadas, uma vez que a produção brasileira, na casa dos 5,5 milhões de toneladas, não é suficiente para atender à demanda nacional por trigo, de aproximadamente 11 milhões de toneladas.

Dono de um moinho no Paraná - a Moageira Irati -, Vosnika diz que o aumento da liquidez do trigo no Brasil não é uma questão pontual, decorrente dos preços elevados do cereal no mercado internacional e nem da instabilidade do fornecimento do cereal argentino: o produto brasileiro está avançando em qualidade. "A indústria e o produtor estão conversando mais. Os moinhos estão dizendo que classe de trigo precisam e o campo está buscando se adequar à demanda", afirma.

Há um ano entrou em vigor uma nova classificação do trigo (para efeito de aplicação na política federal de garantia de preços mínimos) que elevou os padrões de qualidade nacional. Intensificou-se, então, a corrida para a produção de sementes adaptadas a essa nova classificação. E já neste ciclo se verifica um aumento importante do cultivo de variedades das classes "pão" e "melhorador", consideradas ideais para uso na panificação, afirma Vosnika.

O empresário estima que, a partir do que é plantado atualmente pelo produtor, os moinhos têm condições de comprar 70% da safra brasileira (basicamente do Paraná e do Rio Grande do Sul) para uso na panificação, caso não haja nenhum problema climático. Há três anos, estima ele, esse percentual não passava de 40%.

Outras questões, antes barreiras à liquidez, também estão sendo transpostas. É o caso do custo de carregamento de estoques. "O produtor colhe em três meses e a indústria consome o cereal em um ano. Ninguém quer pagar o custo de carregar o cereal", explica Vosnika. A solução vem sendo encontrada nos Empréstimos do Governo Federal (EGFs), que concedem empréstimos a indústrias com taxas de juros subsidiadas exclusivamente para compra de trigo antecipadamente. "Esse instrumento tem ajudado a equacionar esse problema", explica o executivo.

Mas, independentemente, dos desafios ainda existentes no relacionamento entre produtor e indústria, o pior já passou, diz. Até a década de 90, lembra, processar trigo era quase uma concessão pública. "O governo comprava o trigo e distribuía a quantidade que considerava necessária aos moinhos. A indústria não tinha contato com o produtor. Sequer escolhia o trigo que moía".

Após a abertura do mercado, o governo manteve uma política de remuneração por preços mínimos - no entanto, com padrões de qualidade aquém da realidade do mercado. "Quando o produtor trazia uma safra ruim e a indústria não absorvia, o governo comprava a produção. Ao produtor, portanto, o importante era produtividade, quantidade de trigo, e não qualidade". Agora com a nova classificação, continua, o padrão aumentou e o produtor não tem mais esse 'comprador' garantido. Precisa produzir um cereal melhor para conseguir preços melhores ainda que para vender para o governo em casos de queda dos preços de mercado abaixo do mínimo".



Veículo: Valor Econômico


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