Em defesa do "cliente secreto", ex-empreendedora retoma negócio

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A história de Stella Kochen Susskind com o varejo vem da Segunda Guerra Mundial. Os avôs, judeus poloneses, no alvo da fúria nazista, vieram se refugiar na década de 30 no bairro do Bom Retiro, em São Paulo. Fundaram uma confecção, a Imperor, que mantiveram até morrer. O pai enveredou pelo comércio de tapetes e carpetes. Abriu uma loja no Shopping Iguatemi em dezembro de 1966, quando Stela tinha apenas um mês de vida. Na família dela, o irmão e a irmã se tornaram consultores de varejo, enquanto Stela é reconhecida hoje como uma das maiores autoridades do país em uma técnica cada vez mais adotada pelas grandes empresas para ganhar competitividade: a do "cliente secreto". Nela, um consumidor de verdade é contratado para avaliar o atendimento de maneira sigilosa.

 

"Meu pai costuma dizer que não somos uma família, mas uma gangue", brinca Stella, que até dezembro de 2008 deu expediente na multinacional de pesquisas TNS InterScience como diretora de planejamento, vaga que ocupava desde 2004 quando vendeu para a InterScience a sua agência, a Buy & Test, especializada na pesquisa via "cliente secreto". No ano seguinte, a InterScience foi comprada pela TNS, que por sua vez acabou incorporada, no final de 2008, pelo conglomerado de comunicação e publicidade WPP. "Eles estão focados em grandes estudos, para clientes globais, e a ferramenta de pesquisa via 'consumidor secreto' se tornou só mais uma", diz. 

 

Mas para Stella essa é uma metodologia valiosa. "Os resultados da avaliação do 'cliente oculto' já servem até para determinar a remuneração variável dos gerentes", diz ela, que decidiu retomar o antigo empreendimento e investiu R$ 1 milhão para abrir a agência de pesquisas Shopper Experience. Com dois meses de vida, o negócio conta com uma rede de 20 mil "consumidores espiões", cadastrados ao longo dos 18 anos da sua atuação na área, e 20 clientes - 17 deles oriundos da TNS InterScience, de onde Stella também trouxe a equipe de 15 profissionais. Na carteira da Shopper, estão multinacionais como C&A (cliente desde a Buy & Test) e grandes grupos locais, como o Bradesco. 

 

"Não concordo com esse modelo de pesquisa que se concentra em estatísticas para definir tendências, sem levar em conta a experiência pessoal", diz Stella. Com a Shopper, a proposta é mergulhar ainda mais nos anseios do consumidor e trazer à tona sensações que não costumam estar presentes nos relatórios. "Não basta saber se a vendedora sorriu, se a temperatura da loja estava adequada e se a dúvida foi respondida com presteza", diz ela. "É preciso atentar para o que o consumidor sentiu quando estava no ponto-de-venda, que tipo de emoção aquele atendimento despertou nele". 

 

Na C&A a impressão de que as diferentes filas para cada caixa não eram muito "justas" com quem estava na espera, fez a empresa adotar a fila única no final de 2008. "O 'cliente oculto' nos ajuda a melhorar o nível de profissionalização da nossa equipe, que costuma ser muito jovem, boa parte deles inclusive no primeiro emprego", diz o diretor de marketing da C&A, Élio França e Silva. 

 

A cada semestre, cada uma das 170 lojas C&A são visitadas por pelo menos três "clientes ocultos", que se apresentam em horários e dias diferentes. São consumidores que têm o cartão C&A, selecionados pela Shopper e não conhecidos pela varejista. Todo mês, os relatórios dos "espiões" chegam aos 15 gerentes regionais da C&A em todo o Brasil. A pesquisa passou a ser determinante até para a remuneração variável dos gerentes das lojas. "A companhia define no início do ano uma métrica de atendimento de boa qualidade, e para verificar se ela está sendo cumprida envia os 'clientes ocultos'", diz. 

 

O hotel Transamérica, com operações em São Paulo e em Comandatuba (BA), quer detectar qual é o atendimento dado a crianças, casais, idosos, adultos solteiros etc. Um time de seis hóspedes, em média, visita cada hotel e responde a um "check list" com mais de 70 itens - da avaliação da recepção à higiene do quarto. Segundo o diretor Cláudio Bonuccelli, falhas básicas costumam ser identificadas e corrigidas. "Tivemos que reforçar qual deve ser, por exemplo, a postura do garçom, de oferecer a carta de vinhos junto com o cardápio, e não só quando o cliente pede". 

 

O Bradesco, por sua vez, está interessado em saber como sua equipe nas três mil agências espalhadas por todo o país aborda um cliente na hora da venda - na abertura de conta ou na oferta de produtos a correntistas. O resultado é considerado na avaliação da eficiência da rede. 

 

Além do "cliente oculto", a Shopper Experience oferece pesquisas de satisfação do consumidor, com indicadores que medem o quanto ele é capaz de recomendar a marca, está comprometido com ela ou lhe é potencialmente fiel. 

 

Sobre a concorrência, Stella garante ter um forte diferencial: atendimento 24 horas - a despeito da vida pessoal com marido, dois filhos pequenos e três cachorros. "Todo mundo sabe que pode me encontrar a qualquer hora, em qualquer lugar, que eu vou atender", diz ela na sexta-feira à noite, enquanto dá bronca na cachorra que morde a almofada da sala, divide espaço com as crianças assistindo Peter Pan e esboça uma proposta para um novo cliente. 

 

Veículo: Valor Econômico


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