Mesmo com uma vantagem adicional trazida pela valorização do dólar frente à moeda brasileira, o setor está de olho no avanço dos asiáticos na disputa pelo mercado de maior valor agregado.
O avanço da qualidade dos calçados asiáticos já preocupa as fabricantes brasileiras. O setor teme perder mais espaço diante dos investimentos da concorrência em produtos de maior valor agregado .
"Aos poucos vemos os [fabricantes] asiáticos se especializando cada vez mais e não duvidamos que, em pouco tempo, estarão prontos para competir conosco também em qualidade", avaliou o presidente do Sindicato da Indústria de Calcados de Franca (Sindifranca), José Carlos Brigagão do Couto, em entrevista ao DCI.
Segundo ele, embora as fabricantes do polo calçadista de Franca (SP) não enfrentem uma concorrência expressiva com importados, estão atentas para a melhora na qualidade dos concorrentes de outros países, principalmente as indústrias asiáticas, fortes no segmento de sintéticos.
"O produto de Franca é, na maioria, de couro e nós trabalhamos para atender as exigências específicas de cada cliente. Já os asiáticos, ganham na venda em grande escala e baixo preço. São produtos diferentes para públicos diferentes", disse ele.
Na avaliação do presidente da Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados), Heitor Klein, a mudança no perfil dos concorrentes asiáticos é natural. "Assim como a nossa indústria, o caminho esperado para essas empresas é buscar nichos de maior valor agregado."
A estratégia para não perder espaço no segmento de maior valor agregado, defendeu Klein, é estar sempre à frente das empresas de outros países.
"Estamos trabalhando há quase 10 anos para o setor investir em desenvolvimento de produto, design diferenciado e construção da marca", lembra.
O sócio diretor da consultoria Iemi Inteligência de Mercado, Marcelo Prado, fez avaliação similar em entrevista recente ao DCI. Para ele, o caminho para a indústria nacional ser competitiva no País e também avançar em outros mercados consumidores passa, necessariamente, pelo trabalho de construção de marca das fabricantes.
"As empresas que investem na construção de uma marca própria, que se diferencia da concorrência, têm sempre mais chances de terem melhor desempenho", lembrou Prado.
Exportação
Para Couto, do Sindifranca, a alta do dólar nos últimos meses, além de ajudar o setor a reduzir a presença de importados no mercado brasileiro, tem levado a indústria a concentrar esforços nas exportações.
O reflexo dessa mudança na estratégia, de acordo com o dirigente, deve aparecer apenas nos números do setor no último trimestre deste ano.
"Isso acontece porque o mercado externo trabalha com programas de compra maior prazo. Os negócios têm programação de seis meses, um ano ou dois. Além disso, estamos tendo de reaprender a buscar os negócios e os clientes fora do País", detalha ele.
Couto explica que, para ajudar as fabricantes, o Sindifranca tem desenvolvido projetos de apoio aos exportadores, como uma parceria firmada com a Câmara de Comércio e Indústria Brasil China, que visa a formação de um grupo para explorar oportunidades de negócio no mercado chinês.
Embora beneficie as vendas para outros países, o real mais barato também impacta o caixa das indústrias, lembra ele. "Muitos calçadistas importam matéria-prima e, se o aumento [dos custos] persistir nesse ritmo, isso pode pesar no preço do produto e o calçado pode voltar a perder competitividade lá fora", destaca Couto.
O custo com mão de obra, mais elevado em comparação com os asiáticos, também é uma queixa constante do setor quando o assunto é competitividade. Mas Klein, da Abicalçados, lembra que a produtividade da mão de obra brasileira melhorou nos últimos anos. "Ainda pode melhorar, mas os incrementos serão menores, porque a mão de obra já tem bom nível de produtividade."
A principal pauta do setor no próximo ano, observa o dirigente, será a exportação de calçados, mesmo que a quantidade comercializada permaneça inferior ao mercado local.
"As vendas internas sempre foram muito fortes, mas devemos recuperar parte do mercado externo que, nos anos de real valorizado, a indústria perdeu. Com o importado mais caro, o produto nacional avança também no mercado interno. Mas o consumo local continua retraído", ressalta ele.
Veículo: Jornal DCI