Medicamentos perdem descontos e preços sobem até 20%

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                                                                                      Setor enfrenta alta de custos por causa de dólar.

O preço dos remédios está sofrendo uma alta inesperada neste fim de ano, que pode pesar até 20% a mais no bolso do consumidor. Esses produtos têm o valor controlado pelo governo federal, que autorizou reajuste médio de 5,68% em abril. Agora, nesta segunda onda de aumentos, os preços sobem porque os fabricantes vêm reduzindo os descontos que ofereciam às farmácias. As redes, por sua vez, também acabam dando abatimentos menores aos clientes. Segundo fabricantes, a alta do dólar pressiona os custos de produção, então os descontos são cortados para manter as margens de lucro.

Representantes do setor ouvidos pelo GLOBO dizem que os descontos nas farmácias variam muito de produto para produto, dependem da quantidade que elas compram dos fabricantes (quanto maior a compra, menor o preço) e da concorrência do segmento. Mas não era difícil encontrar abatimentos de até 60% nos produtos de marca oferecidos nas redes até alguns meses atrás. Entre os genéricos, dizem esses representantes, o percentual alcançava até 80%, principalmente entre produtos com muita competição no mercado. Atualmente, a faixa média de descontos para medicamentos de marca se deslocou para patamares mais baixos, chegando até a 40%. Nos genéricos, um desconto de 50% já é considerado muito bom negócio.

— Se havia um desconto e ele é reduzido, na prática há um aumento de preço. No caso de uma redução de um desconto de até 60% para até 40%, o reajuste é de 20% — explica Miguel Ribeiro de Oliveira, diretor de pesquisas econômicas da Associação Nacional dos Executivos de Finanças (Anefac).

Em levantamento informal feito em farmácias, O GLOBO encontrou descontos de 15% a 30% em medicamentos genéricos de uso contínuo, como a Atovarstatina, usada para baixar o nível de colesterol. Para o cliente que leva mais de três caixas do medicamento, o desconto sobe para 40%. Para a Finasterida, que previne a calvície, a caixa com 30 comprimidos sai por R$ 52,08. Quem leva três caixas ganha desconto de 38,86%, já que o valor de cada uma cai para R$ 31,31. Em medicamentos de marca, como o Lasix, para controle da hipertensão, O GLOBO encontrou descontos entre 7% e 25%.

Troca por genérico

A dona de casa Márcia Bueno, de 41 anos, percebeu que os descontos no preço dos medicamentos encolheram há pelo menos dois meses. Ela toma remédio de uso contínuo para hipertensão e trocou o medicamento de referência pelo genérico para economizar. Márcia pagava R$ 13,09 pela caixa de 40mg do Lasix, que com desconto chegava a R$ 9,70, baixa de 25,89%. No mês passado, só encontrou o produto por R$ 14,38. O desconto oferecido foi de apenas 4,7%, levando o preço a R$ 13,70. Descontos acima de 40% não foram encontrados.

— Comprei o genérico, a R$ 5, em uma farmácia popular. Dos R$ 13,09 que eu pagava para os R$ 5 que gastei, tive uma redução de 64%. Agora, vou fazer uma maratona à procura do melhor desconto. Nem todas as farmácias oferecem os descontos generosos de antigamente — diz ela.

De acordo com Telma Salles, presidente da Pró-Genéricos, entidade que representa os fabricantes destes produtos, em média, a diferença de preços entre os genéricos e os medicamentos de marca ficava em 50%. Agora, a diferença caiu para 40%, o que indica que a redução dos descontos também acontece nos genéricos. Por lei, os genéricos devem ser pelo menos 35% mais baratos que os medicamentos de marca.

— A pressão de custos está muito grande, e o varejo começa a ser penalizado. Por isso, acaba reduzindo o desconto — afirma Telma.

Números da Pró-Genéricos mostram que a venda deste tipo de medicamento, em unidades, cresceu 10,7% no terceiro trimestre do ano, enquanto o setor esperava expansão de 15%. Segundo ela, esse é o reflexo da conjuntura econômica ruim, com impacto da alta da inflação no poder de compra das famílias. Mas, em valores, as vendas cresceram 21% no período, atingindo R$ 5,2 bilhões, frente aos R$ 4,3 bilhões registrados no terceiro trimestre de 2014.

O Sindusfarma, entidade que representa empresas fabricantes da indústria farmacêutica, explica que os custos de produção tiveram alta entre 30% e 40%, considerando o dólar, que acumula alta em torno de 46% no ano, o aumento da energia e os gastos com mão de obra. Como o preço dos remédios é controlado pelo governo e só aumenta uma vez no ano, não há como repassar esse gasto maior.

— A indústria reduz o desconto ao distribuidor e às farmácias como forma de manter margens de ganho. Isso acaba chegando ao consumidor — diz Nelson Mussolini, presidente do Sindusfarma, lembrando que quase 90% da matéria-prima usada nos medicamentos é cotada em dólar.

Segundo Antônio Britto, presidente executivo da Interfarma, associação da indústria farmacêutica de pesquisa, pelo menos 92% dos medicamentos no Brasil têm concorrentes. Em alguns casos, a concorrência é tanta que os competidores nem conseguem dar desconto. Mesmo assim, com base em dados da IMS Health, a Interfarma calcula que o desconto médio no mercado geral de medicamentos subiu de 36% para 38% entre 2014 e 2015.

— Mas essa política de descontos é afetada. Com a inflação, o que a indústria está faturando não cobre o aumento de custos. A redução do desconto ajuda a manter as margens — diz Brito.

Brasil cai em ranking

Sergio Mena Barreto, presidente da Abrafarma, que reúne as maiores redes do varejo do setor, informa que o desconto médio nas 71 farmácias associadas tem se mantido estável em 25,16%. Segundo ele, a margem de lucro líquido é muito estreita, de 3%, e o aumento de custos de alguma forma terá que ser repassado. Já a Associação Brasileira do Comércio Farmacêutico (ABCFarma), que reúne as farmácias de menor porte e independentes, não se pronunciou sobre a política de descontos de seus associados.

O economista-chefe da Azimut Wealth Management, Paulo Eduardo Nogueira, lembra que os dados do IBGE apontaram retração de 1,1% nas vendas de artigos farmacêuticos, medicamentos e perfumaria em setembro frente a igual período de 2014. Esse segmento do varejo era o único que vinha mantendo desempenho positivo em relação ao ano anterior, enquanto as vendas de alimentos, vestuário e eletroeletrônicos já despencavam.

— Acredito que, neste grupo, a perfumaria tenha puxado as vendas para baixo. No caso dos remédios, o consumidor troca o medicamento de marca pelo genérico. E pode ter comprado quantidade menor do que comprava antes, privilegiando itens essenciais, como alimentos — avalia Nogueira.

Outra consequência da valorização do dólar este ano foi a queda do Brasil no ranking de vendas do mercado farmacêutico global. O país ocupava a sexta posição em 2013, com faturamento de US$ 30,6 bilhões, mas caiu para a sétima este ano, com US$ 28,1 bilhões. A expectativa era que nos próximos dois ou três anos chegasse à quarta posição.

— O mercado interno cresceu cerca de 10%, em média, nos últimos dois anos, mas a alta expressiva do dólar fez o nosso faturamento encolher no ranking mundial — afirma Britto, da Interfarma.

De acordo com a entidade, o varejo representa 75% das vendas no mercado nacional.

 



Veículo: Jornal O Globo - RJ


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