Depois de uma semana marcada por desencontros de informações, Planalto decide lançar ‘campanha de conscientização’ pela reforma
Após uma semana marcada por informações desencontradas sobre os planos para ajustar as contas públicas no País, o governo Michel Temer decidiu afinar as ações de comunicação e decidiu lançar uma campanha de conscientização popular a fim de aprovar a reforma da Previdência no Congresso.
Interlocutores do presidente consideram que, mais importante do que fixar uma data para enviar as mudanças das regras previdenciárias ao Legislativo, é fazer uma campanha de esclarecimento para atuais e futuros beneficiários. O governo vai bater na tecla de que as regras do Brasil são muito generosas em relação a outros países e que, sem uma reforma, não haverá recursos para pagar benefícios concedidos a aposentados e pensionistas em razão do aumento dos déficits previdenciários.
Na terça-feira passada, o ministro da Secretaria de Governo, Geddel Vieira Lima, havia informado que a proposta seria remetida ao Congresso ainda neste mês. A iniciativa atendia à pressão do PSDB, principal aliado de Temer, mas desagradava a parte da base que defendia o envio da proposta depois das eleições municipais, temendo prejuízos na campanha.
O texto deve estabelecer, entre outras mudanças, uma idade mínima para a aposentadoria de 65 anos para homens e mulheres.
Na sexta-feira, Geddel mudou o discurso: disse ser contra estipular um prazo para o envio da reforma. Defende que é preciso fazer um trabalho de conscientização antes de remeter a proposta. “A decisão do presidente é essa, mas é claro que, em tema dessa complexidade, é sempre prudente ouvir os aliados”, disse. O ministro revelou que o governo prepara uma campanha para orientar a população sobre a necessidade de se mudar as regras da aposentadoria para garantir o pagamento de benefícios futuros: “Vamos analisar tudo com tranquilidade.”
Timing. O secretário de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda, Mansueto Almeida, concorda que o importante não é o momento do envio da proposta, se antes ou depois das eleições, mas sim a forma como o governo colocará o debate para a sociedade.
“Reforma da previdência não é fácil em nenhum lugar do mundo. Tem de explicar para a sociedade, principalmente para as pessoas mais simples. As pessoas vão querer discutir exaustivamente. Vai modificar um contingente muito grande. O governo está se preparando para uma campanha muito grande de esclarecimento”, disse.
Para Mansueto, mesmo as pessoas com alta escolaridade no Brasil, consideram ser normal se aposentar muito cedo com regras especiais. “Tem que mostrar as regras no resto do mundo para provar que não é normal as pessoas se aposentarem com 49 anos, 54 anos. O Brasil vai envelhecer e se a gente não fizer reforma corre o risco de a gente não ter dinheiro lá na frente para pagar os aposentados”, completou.
Outro integrante da equipe econômica admitiu reservadamente que, sem um esclarecimento maior para a sociedade, vai ser mais difícil aprovar a proposta. Ele disse que, somente após se criar o ambiente de que é imprescindível reformar a Previdência, é que se deve enviar o texto ao Congresso.
Ainda não está fechado quando a campanha de esclarecimento será divulgada. A ação do governo visa a convencer, em dois turnos de votação, ao menos 308 dos 513 deputados e 49 dos 81 senadores, quórum necessário para aprovar uma emenda constitucional, como será a reforma da Previdência.
Um por vez. A maioria dos aliados de do presidente Michel Temer no Congresso ouvidos pelo Broadcast, sistema de notícias em tempo real do Grupo Estado, considera que o governo também precisa concentrar os esforços em cada uma das propostas do ajuste fiscal. Avaliam que, primeiro, o importante é discutir e votar a PEC do Teto dos Gastos (única formalmente apresentada ao Legislativo), depois a reforma da Previdência e, em seguida, a reforma trabalhista.
Há quem avalie que o ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira, tenha se precipitado em apresentar detalhes da proposta da reforma trabalhista, o que poderia dificultar ainda mais a aprovação do ajuste por supostamente passar a impressão de retirada de direitos.
O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), defende que o Executivo aprecie cada matéria individualmente. “Um passo de cada vez, na minha opinião”, disse ele, defensor de uma forte estratégia de comunicação para aprovar o ajuste e que, dias atrás, chamou de “inócua” a decisão do governo de apresentar a reforma da Previdência até o fim do mês. “Ninguém está exigindo que se faça tudo de uma única vez. Se perder a primeira, pode perder as outras”, completou.
A líder do governo no Congresso, senadora Rose de Freitas (PMDB-ES), também apoia a discussão fatiada das propostas. “Tem que ir devagar, tudo no seu tempo”, afirmou ela, ao considerar que, sem um debate transparente, o ajuste poderá não ser aprovado.
O líder do PMDB na Câmara, Baleia Rossi (SP), afirmou que não vê dificuldades em discutir as três reformas ao mesmo tempo, como está ocorrendo.
Ele disse que cada uma das matérias será votada a seu tempo e destacou que a PEC do Teto está com a tramitação “bem adiantada”. “Claro que a votação deverá ocorrer uma de cada vez exatamente porque cada um tem o seu momento”, disse o parlamentar.
O deputado Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP), que participou das votações das reformas da Previdência de FHC e Lula, disse que o governo está “iludido” se considerar que somente por ter um “aparente” grande base parlamentar vai conseguir aprovar todas as reformas.
Segundo o petebista, embora considere que Temer tenha uma aliança no Congresso superior à do tucano e à do petista, ele não tem um apoio popular como os ex-presidentes.
“O governo quer sinalizar para o mercado que está mexendo em tudo, mas não quer dizer que vai conseguir mudar esses direitos”, disse Faria de Sá, ao exemplificar, por exemplo, que a PEC do Teto dos Gastos do jeito que está não vai ser aprovada pelo Congresso.
Rolo compressor. Há parlamentares da base, contudo, que defendem a tese de se aprovar de uma só vez as reformas. Uma linha de atuação chamada por alguns de rolo compressor. A intenção é que, com isso, se reduza o desgaste político do governo e até mesmo dos parlamentares.
Fonte: Jornal O Estado de São Paulo