Tese genérica deixa no ar incertezas para quem já conseguiu benefício
-BRASÍLIA E RIO- O Supremo Tribunal Federal (STF) definiu ontem uma tese para ser aplicada pelos juízes em todo o país no julgamento de ações referentes à desaposentação, que foi proibida pela Corte ontem. Genérica, a tese não informa o que acontece com quem já conquistou o direito ao benefício na Justiça — se o perde automaticamente, ou se pode mantê-lo. Os ministros também não decidiram se será necessário devolver o dinheiro recebido a mais. As questões serão discutidas caso a caso, em ações de iniciativa do INSS.
O ministro Ricardo Lewandowski chegou a sugerir que o tribunal detalhasse as consequências práticas do julgamento para quem recebe a desaposentação hoje, seja por liminar. seja por decisão judicial final. Segundo ele, muitos segurados estavam preocupados com as “situações pendentes”. Mas os demais ministros argumentaram que o julgamento não poderia mais ser reaberto.
— Nós não teremos, agora, como vislumbrar todas as situações que um ou outro acha que pode ser cuidada. Se a gente tivesse que resolver variadas situações, reabriríamos o julgamento que finalizou — disse a presidente do tribunal, ministra Cármen Lúcia.
Pela decisão tomada anteontem pelo STF, o trabalhador que se aposenta proporcionalmente, mas continua contribuindo, não pode renunciar à aposentadoria concedida para pedir um benefício em valor mais alto no futuro. O julgamento tem repercussão geral — ou seja, o entendimento será aplicado em processos similares que aguardam solução em tribunais de todo o país. A decisão terá validade depois que o acórdão for publicado, o que costuma demorar cerca de dois meses. ADVOGADOS TÊM DÚVIDAS Depois de publicado o acórdão, o INSS e as partes interessadas poderão entrar no STF com embargos de declaração, um tipo de recurso destinado a solucionar dúvidas ou omissões deixadas no julgamento. Ao analisar esse recurso, o tribunal poderá especificar consequências práticas da decisão. A advogada-geral da União, ministra Grace Mendonça, disse que o INSS vai estudar a possibilidade de obter de volta o dinheiro pago a mais pela União aos aposentados.
A falta de detalhamento do Supremo deixou advogados e aposentados em uma nuvem de incerteza. Ontem, alguns escritórios informaram que aguardariam pelo menos até segunda-feira para informar os clientes que pleiteavam a desaposentação.
A maior dúvida é sobre o tratamento que será dado àqueles que já conseguiram o direito à desaposentação na Justiça. Desde 2013, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem entendimento favorável aos aposentados. Para advogados, deve valer a tese de que a aposentadoria é um benefício de natureza alimentar, ou seja, serve para comprar o essencial. O maior risco seria para os que estão recebendo o benefício revisado em decisão liminar.
— O aposentado que ganhou o benefício, transitou o julgado, não tem mais recurso e se passaram dois anos, o direito dele se tornou líquido e certo. Todos os que estão recebendo benefício via liminar, esses correm o risco, não imediatamente, mas o juiz pode suspender — explica o advogado previdenciário Geovani Santos.
Para Luiz Felipe Pereira Veríssimo, sócio do Instituto de Estudos Previdenciários, também não está claro se o INSS terá fôlego suficiente para tratar de tantos casos. A AGU estima que cerca de 180 mil pessoas tenham processos na Justiça requerendo o direito à desaposentação. Veríssimo conta que chegou a ganhar alguns processos porque o INSS perdeu o prazo, o que ilustra a falta de estrutura do órgão para lidar com a enxurrada de casos:
— Acho que eles (o INSS) vão fazer uma força-tarefa. Meu receio é fazerem algo sem respaldo legal. Não há decisão publicada, não foram feitos os embargos.
O governo não sabe quantas pessoas já conseguiram a desaposentação na Justiça.
Fonte: Jornal O Globo