Como apresentar a informação nutricional de forma clara ao consumidor brasileiro? A questão é complexa e tem preocupado associações representativas das indústrias de alimentos e bebidas, técnicos da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e representantes da sociedade civil, que se debruçam há cerca de dois anos na elaboração de um novo modelo para o rótulo nutricional.
Coordenado pela Anvisa, o movimento resultou na Rede Rotulagem, iniciativa de 22 entidades ligadas ao setor de alimentos e bebidas, entre elas a Confederação Nacional da Indústria (CNI), a Associação Brasileira das Indústrias de Refrigerantes e de Bebidas Não Alcoólicas (ABIR) e a Associação Brasileira das Indústrias da Alimentação (ABIA). A Rede Rotulagem apoia um rótulo que tenha clareza e informações completas. "O novo modelo permitirá ao consumidor levar para casa aquele produto que melhor se adeque ao seu estilo de vida, para que ele possa tomar suas decisões de forma autônoma e consciente", defende João Dornellas, presidente-executivo da ABIA.
A urgência para reformular o modelo vigente pode ser explicada por diversos motivos. Atualmente, as tabela nutricionais apresentam ambiguidades e inconsistências, acarretando problemas de leitura e entendimento. Há também ausência de informações nutricionais em vários produtos.
Outro fator que impulsionou a discussão do novo modelo de rotulagem é o aumento significativo das chamadas doenças crônicas não transmissíveis, como o diabetes e a hipertensão arterial. Essas doenças têm causas multifatoriais e uma delas está relacionada ao consumo de alimentos processados.Por conta disso, a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), braço da Organização Mundial da Saúde (OMS), estipulou um conjunto de ações para enfrentar as doenças crônicas em seu Plano de Ação, lançado em 2014. Entre elas está um modelo de rotulagem inserido na parte da frente das embalagens dos alimentos.
O setor produtivo defende a chamada rotulagem frontal, modelo adotado por mais de 40 países. Nesse modelo, a apresentação gráfica é o "semi-interpretativo", conhecido como "modelo do semáforo". Essa representação já é adotada por diversas nações, como Reino Unido, Canadá e Equador e sua eficácia está baseada em estudos científicos. "Quando a gente fala em rotulagem, a primeira pergunta que nos vem é: o que a ciência de leitura de rótulos, que é a semiologia, nos diz a respeito disso? Temos artigos importantes e validados dizendo que as pessoas, em qualquer parte do mundo, entendem o código dos sinais. No Brasil temos mais de 11 milhões de analfabetos, mas ainda que as pessoas não saibam ler, quando elas veem o código de cores, o semáforo, elas conseguem entender", explica Henrique Lian, diretor de relações institucionais da Proteste Associação de Consumidores, entidade que atua na defesa e no fortalecimento dos direitos dos consumidores brasileiros.
A proposta de rotulagem frontal associada ao modelo do semáforo foca em uma qualificação gradativa do teor dos nutrientes, seguindo as cores do semáforo: verde, amarelo e vermelho. Além disso, o novo modelo traz outra novidade: propõe uma indicação pela porção usualmente consumida, que varia de acordo com cada produto, ou seja colher, unidade ou gramas. A ideia é que não haja mais uma padronização fixa para 100 gramas ou 100 mililitros. "É um jeito de apresentar as informações de forma mais didática. O novo modelo passa a informação fazendo com que o consumidor seja empoderado, para que ele possa fazer uma decisão de compra consciente e duradoura", defende Márcia Terra, diretora da Sociedade Brasileira de Alimentação e Nutrição (SBAN), que, apesar de não integrar a Rede Rotulagem, também defende o modelo do rótulo frontal de semáforo.
Ela lembra, ainda, que é preciso enfatizar, na discussão sobre a nova rotulagem, que não existem nutrientes per se que sejam nocivos para a saúde. O novo modelo possibilita a compreensão dos principais atributos nutricionais dos alimentos, de forma individualizada. Deve facilitar, também, uma comparação nutricional entre produtos.
"É um sistema de rotulagem adequado à realidade brasileira e que vai beneficiar o consumidor, permitindo que ele decida o quanto quer ingerir e não demonizando a priori nenhum produto", afirma a diretora de Relações Institucionais da CNI, Mônica Messenber
O trabalho regulatório da Anvisa ainda está em andamento. O estudo efetivo da mudança começou com a elaboração do Relatório Preliminar de Análise de Impacto Regulatório sobre Rotulagem Nutricional, publicado em maio de 2018. Uma vez aprovado internamente, o relatório foi aberto a comentários da sociedade civil, por meio da Tomada Pública de Subsídios (TPS), instrumento de consulta para coletar dados e críticas. A TPS, finalizada em novembro, coletou mais de 30 mil contribuições, segundo William Dib, diretor-presidente da Anvisa.
Os próximos passos serão uma análise técnica das sugestões advindas da TPS e, a partir desse resultado, a preparação de uma medida provisória para nova consulta pública. Depois disso, a proposta ainda será avaliada pela diretoria colegiada da agência antes de virar norma. A meta da Anvisa é concluir todo esse processo depois de março de 2019. "É uma grande oportunidade de oferecer à população não só o direito à informação, mas o direito à escolha", declarou Dib durante a mesa redonda Direito à informação na rotulagem de alimentos, organizada pelo jornal Valor Econômico no dia 29 de novembro de 2018, em Brasília.
Fonte: Portal da Indústria