Um projeto recém-lançado em Santos vem mudando a forma como muitas pessoas encaram o consumo de orgânicos. Elas não vão mais a feiras e nem a supermercados à procura de verduras, legumes e frutas sem agrotóxicos e ainda conseguem preços mais acessíveis.
A possibilidade começou em março deste ano, quando o Grupo Livres passou a fazer a intermediação entre produtores de orgânicos e consumidores para criar uma rede de consumo consciente.
“Há alguns motivos por que essa iniciativa é necessária. Primeiro que o Brasil é um país que utiliza muito agrotóxico e as pessoas estão se alimentando de veneno. Depois vem a exploração do trabalho dos agricultores, que por falta de condições logísticas vendem os produtos para atravessadores, que revendem para as grandes redes, que acabam vendendo três, quatro vezes mais caro para o consumidor final”, explica Guilherme Prado, um dos responsáveis pelo Livres Baixada Santista.
O projeto funciona assim: a cada semana e quinzena os produtores enviam listas diferentes com os produtos disponíveis para venda. Os membros da comunidade, que hoje reúne 35 famílias, escolhem quais desejam consumir, com um valor mínimo de R$ 20.
Como a maioria dos agricultores participa da Feira de Orgânicos do Orquidário, que ocorre todos os sábados, a equipe do Livres vai até lá e retira os produtos escolhidos. Na sede, a equipe do projeto monta a cesta de cada consumidor, que pode optar por retirá-la no local ou recebê-la pelo delivery, com os ecobikers.
As listas, que somam quase 70 itens, também possuem produtos como arroz, feijão, geleia, mel, sucos, vinhos e café, todos orgânicos. O valor médio das compras semanais costuma ser de R$ 50 e a diferença de preços em comparação aos orgânicos das grandes redes de supermercados pode chegar a 30%.
“Os produtores conseguem uma política de preço diferenciada porque a comunidade garante a eles uma renda fixa, o que é muito importante. Na feira eles nunca sabem se vão vender muito ou pouco”, relaciona Lucas Mattos, outro responsável pelo Livres, que tem uma equipe de quase 15 pessoas.
O projeto trabalha com a Associação dos Produtores Orgânicos do Vale do Ribeira (Aovale); a Associação dos Produtores Orgânicos do Alto Tietê (Aproate); com o Movimento dos Sem Terra (MST), maior produtor de arroz orgânico da América Latina; e pequenos agricultores de café do sul de Minas.
Breno Almeida, associado da Aovale e produtor orgânico desde 2010, lamenta que as pessoas achem que produtos hortifruti devem ser baratos e não saibam quanto custa produzir alimentos.
“O maior problema do produtor é plantar toda uma safra, investir dinheiro e não conseguir vender. Os grandes, que trabalham em escala de produção, têm um custo unitário barato e ainda conseguem vender se perderem parte da safra. Já o pequeno, se plantar cem pés de alface e perder 25 por causa do clima, já são 25% de prejuízo. Com o Livres, sabemos que vamos plantar uma quantidade que está vendida, então não há prejuízo”, afirma.
Antes de se tornarem membros efetivos do projeto, os interessados ingressam numa pré-comunidade para testar essa forma de consumo programado. Neste mês será lançada a segunda comunidade fixa, que espera atender mais 35 famílias.
“Pedimos um compromisso moral de seis meses de permanência para que os produtores tenham uma segurança. É importante ter essa consciência”, antecipa Lucas.
A jornalista Beth Soares conheceu o Livres por uma amiga. Para ela, essa forma de consumo envolve muito mais do que não se alimentar de veneno. “Há o respeito à sazonalidade dos alimentos. Não tem exploração da terra porque o plantio é programado e nem produtor e consumidor são desrespeitados. O sabor é sempre mais acentuado, dando uma a sensação de que estamos comendo algo vivo”, conta.
Para aumentar cada vez mais a variedade de produtos oferecidos, o grupo mapeia a preferência dos membros da comunidade a fim de descobrir o que consumiriam no mercado orgânico. Com as respostas, os produtores ganham motivação para variar a base produtiva e as pessoas ampliam os alimentos que consomem, sabendo que o que colocam em suas mesas envolve um processo muito mais complexo do que ir ao supermercado e escolher o que se quer comer.
Fonte: Diário do Litoral