A aplicação de juros de mora na fase pré-processual só alcança obrigações trabalhistas líquidas. Este é o entendimento da 1ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 8ª Região (TRT-8) após o colegiado analisar e negar um agravo de petição apresentado por um ex-empregado de uma indústria farmacêutica que teve pedido de indenização deferido em primeira instância.
Ele pedia a compensação dos cálculos para que fossem incluídos nos memoriais de cálculo os juros de mora no percentual de 1% ao mês na fase pré-judicial, correspondendo a outubro de 2015 até o fim de janeiro de 2021, data que a empresa foi citada nos autos. Pedia ainda que a correção monetária pela taxa Selic fosse atualizada a partir do início da fase processual.
O ex-empregado trabalhou como motorista da farmacêutica. Ele entrou com a ação pedindo o pagamento de adicional de periculosidade, reflexo, integração à base de cálculo das horas extras 100% pagas em contracheque e ao benefício previdenciário acidentário. Ele alegava alta exposição ao risco de morte, em razão de exponenciais números de roubo de carga em todo o país.
Nos argumentos apresentados, a defesa do ex-empregado se baseou no julgamento da Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) 58 do Supremo Tribunal Federal (STF). A Corte declarou a inconstitucionalidade da aplicação da Taxa Referencial para a correção monetária de débitos trabalhistas e afastou o critério da data do ajuizamento da ação, previsto no artigo 883 da Consolidação das Leis do Trabalho, como base para o cálculo de juros de mora.
Relatora do caso, a desembargadora Mary Anne Medrado afirmou que somente se afiguram líquidas —e suscetíveis de gerarem a mora ex re do empregador— as obrigações que ele tenha certeza do conteúdo e termo final do prazo para executá-las. Dessa forma, "para as verbas trabalhistas de conteúdo e vencimento indeterminados durante o pacto laboral, o silêncio resignado do empregado tem o condão de excluir a mora do empregador no período que o STF, nas ADCs 58 e 59, denominou de pré-processual".
A magistrada lembrou a legislação prevista no artigo 39 da Lei 8.177/1991. "Uma vez que é constitucionalmente válida e está vigente, a regra deve ser observada para verbas trabalhistas. Esse preceito, aliás, compartilha do mesmo fundamento ético-jurídico da regra preconizada para os contratos em geral disposta no artigo 397 do Código Civil. Afinal, respeitadas as especificidades materiais alusivas ao domínio social e econômico em que se insere o objeto pactuado no contrato de trabalho, as obrigações derivadas da relação de emprego sujeitam-se às mesmas exigências éticas, extraídas da teoria geral das obrigações, concernentes à boa-fé objetiva e à segurança jurídica."
A relatora diz no voto que atualização monetária como mera recomposição do valor corroído pela inflação deve ser realizada para definir o montante sobre o qual recairão os juros de mora a partir do ajuizamento da ação. "Para esse fim, vem prevalecendo o entendimento que o IPCA-E é o índice que melhor reflete as perdas inflacionárias, sendo certo que este não pode, em hipótese alguma, ser cumulado com a Selic, que, já incorporando a função de índice de atualização monetária, agrega também juros moratórios."
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Processo 0000638-61.2020.5.08.0009
Fonte: Revista Consultor Jurídico – 21/04/2023