Os prejuízos dos balanços em 2008 e 2009 ajudaram a gerar deduções que afetaram a arrecadação do Imposto de Renda (IR) das empresas e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) no ano passado. As deduções geradas ainda devem manter efeito semelhante na arrecadação deste ano.
Essa é a conclusão de um levantamento do escritório Machado Associadoscom base no balanço das 88 maiores companhias de capital aberto. Em 2008, quando os balanços já refletiram os efeitos da crise financeira, esse grupo de empresas gerou R$ 19,6 bilhões em ativos fiscais diferidos. No ano seguinte foram mais R$ 6,6 bilhões. Esses valores resultam da forma de cálculo do IR e da CSLL e funcionam, na prática, como deduções que podem abater os dois tributos em períodos seguintes.
Para o consultor do Machado Associados, Luís Rogério Farinelli, coordenador do levantamento, os ativos que propiciam "deduções futuras" foram gerados principalmente por prejuízos fiscais e também por ágio pago em aquisições. Os dois itens, acredita, já foram usados para dedução tributária pelas empresas a partir do ano passado, o que pode explicar o crescimento abaixo da expectativa da arrecadação do IR e da CSLL em 2010. Ao divulgar o resultado de arrecadação durante o último trimestre do ano passado, a Receita Federal anunciou que estava investigando a razão de a evolução da arrecadação do IR e da CSLL estar abaixo do crescimento da arrecadação total.
De janeiro a novembro de 2010 a arrecadação de IR das pessoas jurídicas e de CSLL somou R$ 122,3 bilhões, um aumento nominal de 1,69% em relação a igual período de 2009. Usando o mesmo critério de comparação, a arrecadação da receita total administrada pela Receita cresceu 14,62%. Parte do descompasso pode ser explicado pelos ativos fiscais gerados com os dois impostos em 2008 e 2009. Esses ativos são consequência da metodologia de cálculo dos tributos.
Existe uma diferença entre o lucro contábil (aquele divulgado pelas empresas em seus balanços) e o lucro tributável (calculado segundo os critérios da Receita somente para a apuração do IR e da CSLL). O quadro conjuntural, com a crise financeira fazendo maior diferença a partir dos últimos meses de 2008 e provocando prejuízos, ajuda a explicar a grande divergência entre o lucro contábil e o lucro usado como base tributária não só daquele ano como dos períodos seguintes.
Farinelli lembra que os resultados contábeis totais de 2008 e 2009 foram afetados por várias empresas que registraram prejuízos nos balanços. Uma empresa que tem prejuízo contábil num ano deixa de pagar o IR e a CSLL daquele período. De acordo com as normas tributárias, porém, a perda gera um ativo, o chamado prejuízo fiscal, que poderá ser deduzido de parte do lucro tributável a partir do exercício seguinte.
Outro fator que afetou os balanços de 2008, diz Farinelli, foram as despesas de ágio nas aquisições, que reduziram o resultado contábil, mas não foram consideradas despesas para redução do lucro tributável. O consultor Pedro César da Silva, da ASPR Auditoria e Consultoria, explica que as aquisições podem gerar despesa de ágio para o cálculo do IR e da CSLL, mas isso não acontece sempre no momento da aquisição. Acontece em casos como a incorporação formal da empresa ou com a venda do investimento. Ainda assim, essa dedução do lucro tributável não é feita de uma só vez, mas de forma amortizada. Os balanços ainda foram afetados, lembra Farinelli, por perdas que não são dedutíveis no lucro tributável ou são dedutíveis com restrições, como os prejuízos apurados no exterior e as perdas financeiras com a variação do dólar.
"Tudo isso ajudou a gerar uma carga tributária corrente alta de IR e CSLL em 2008 e 2009", diz Farinelli. Segundo o estudo, a alíquota efetiva corrente média com os dois tributos no universo das 88 empresas em 2008 foi de 30,9% (sobre o lucro contábil) e a de 2009, de 31,5%.
Everardo Maciel, ex-secretário da Receita Federal, acredita que a explicação acontece caso a caso, mas, segundo ele, os prejuízos fiscais provavelmente foram a razão mais generalizada para a geração de ativos que garantem deduções futuras. Para ele, é preciso relativizar o menor crescimento de arrecadação do IR e da CSLL em 2010. Ele lembra que o aumento de recolhimento do dois tributos em períodos anteriores foi maior do que o da arrecadação total.
Veículo: Valor Econômico