Controladas, coligadas e o direito tributário

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A definição dos conceitos societários de controladoras, controladas e coligadas dentro do direito societário já é, por si só, uma questão relevante se levado em conta o que dispõe o tão citado artigo 110 do Código Tributário Nacional (CTN). Uma vez estabelecido o conceito societário de controladora, controlada e coligada, será defeso ao direito tributário requalificar tal conceito ou fazer nele inseridas situações não contempladas pela tipologia legal societária. 
 


A Lei das Sociedades Anônimas entabula, em seu artigo 243, parágrafo 2º, o conceito de controlada: considera-se controlada a sociedade na qual a controladora, diretamente ou através de outras controladas, é titular de direitos de sócio que lhe assegurem, de modo permanente, preponderância nas deliberações sociais e o poder de eleger a maioria dos administradores. Assim, de acordo com Tavares Borba, a sociedade que, de forma direta ou indireta, tem o poder de conduzir uma outra sociedade, terá nesta uma controlada, ainda que não exerça de fato esse poder. Conforme observa o referido autor, a tipificação de controle para a pessoa física e para a pessoa jurídica varia. Segundo ele, a distinção inspira-se na constatação de que uma sociedade, considerado o profissionalismo que rege sua atuação, não poderá deixar de exercer o poder de que dispõe. E assevera ainda mais, ou seja, que a eventual omissão não excluirá nem reduzirá as suas responsabilidades e deveres, sem prejuízo de um igual comprometimento daquele que eventualmente for o efetivo agente de controle, muito embora reconheça o autor que esse poder, todavia, se não envolver o controle majoritário, que se afirma por si mesmo, dependerá de um exercício efetivo. 

 

O mesmo artigo 243, em seu parágrafo 1º, explicita o que vem a ser empresa coligada. Ainda segundo Tavares Borba, há sociedades que, embora não sujeitas ao controle, encontram-se a outras ligadas em virtude da relação de participação entre elas existentes. Quando, consideradas duas sociedades, uma detenha 10% ou mais do capital da outra, essas companhias serão consideradas coligadas. Assim, a coligação que seja correspondente a um nível de participação igual ou superior a 10% - desde que essa participação seja incapaz de conduzir ao controle, haja vista a possibilidade de controlar-se uma companhia (controle minoritário) com 10% do capital -, ou ainda a uma participação inferior, deve ser objeto de uma análise cautelosa pelos órgãos competentes. 

 

Comentando o referido artigo 243, assim se posiciona Modesto Carvalhosa: a lei não faz qualquer distinção entre ações com e sem direito de voto para caracterizar o regime de controle e de coligação. Assim, para que se configure a coligação, são consideradas tanto as ordinárias como as preferenciais. Por outro lado, para caracterizar o controle, considera apenas as ações votantes. 

 

Quanto ao conceito de coligação, embora haja discussões, como adverte Carvalhosa, sua distinção parta o conceito de controladora-controlada é bastante clara. Uma vez estabelecida a essência da figura tipológica societária do que vem a ser controladora e, conseqüentemente, controlada e coligada, é de se rechaçar qualquer tentativa da legislação tributária de - seja contornando, superando ou, o que é mais comum, alterando tais conceitos - estabelecer obrigações tributárias, sejam principais, sejam as chamadas secundárias (na verdade, deveres instrumentais). 

 

Diante de tais assertivas, algumas determinações da legislação tributária demonstram-se írritas e, dentre tantas, podemos citar algumas. Uma delas, sem dúvida, é aquela que nega a possibilidade de certidão negativa de débitos (CNDs) para uma determinada sociedade empresarial que estiver coligada com outra que tenha débitos, por exemplo, na Receita Federal do Brasil ou já inscritos na Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), ou ainda perante algum outra autarquia. Além, evidentemente, de desconsiderar o princípio multisecular da personalidade da pessoa jurídica, responsabilizada por débitos de outrem que não têm ingerência nos negócios daquela. É querer - por obra de um instrumento que não tem tal aptidão, como a lei tributária - transformar uma coligada em controlada, partindo da premissa de que uma (a que solicita a CND) possui ingerência e, portanto responsabilidade em relação à outra (a que está em situação de débito). 

 

Assim é que o respeito à segurança jurídica, princípio de nosso ordenamento jurídico, bem como à expressa letra do artigo 110 do Código Tributário Nacional, não pode a administração tributária, ainda que em lei amparada, partir de premissas não aceitas pela legislação societária. 

 

Társis Nametala Sarlo Jorge é procurador federal da Advocacia-Geral da União (AGU) e professor do LLM em direito do Ibmec no Rio de Janeiro 

 

Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico. O jornal não se responsabiliza e nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso dessas informações 

 

Veículo: Valor Econômico


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