“Não será retirada uma linha sequer do que o código já tem. Só se acrescentará aquilo que há 20 anos não existia.” O diretor do Instituto Brasileiro de Política e Direito do Consumidor (Brasilcon), Bruno Miragem, sintetizou assim os três anteprojetos encaminhados para tramitação no Congresso Nacional para atualizar o Código de Defesa do Consumidor (CDC), em vigência desde 1990. As necessidades de mudanças no texto foram defendidas durante a 3ª Conferência Estadual de Defesa do Consumidor, encerrada sexta-feira.
Nesse esforço de aproximar o código da realidade atual brasileira, os textos tocam em questões referentes ao comércio eletrônico e ao endividamento dos consumidores. “São fatos novos na sociedade de consumo. Em termos de comércio eletrônico, basicamente se tenta especificar os deveres de informação para o consumidor, para dar efetividade aos direitos que já existem no código, como o de arrependimento. Os anteprojetos procuram resolver questões práticas, como quem paga a devolução e para que endereço a mercadoria deve ser enviada. São questões simples, mas importantes”, disse Miragem.
Também informação é o centro da mudança, que tem por objetivo minimizar o grau de endividamento dos consumidores. Segundo o diretor do Brasilcon, a ideia é trabalhar de forma preventiva, esclarecendo o consumidor e dando limites à publicidade. Anúncios do tipo “crédito sem juros”, “crédito na hora” ou “sem consulta ao SPC e Serasa” passarão a ser considerados enganosos.
Já o terceiro ponto diz respeito a um aperfeiçoamento das ações coletivas. Para o procurador de Justiça do Ministério Público do Estado, Paulo Valério Moraes, nada mais é do que um esforço para proteger a condição de cidadania dos consumidores. Ele explicou que, ao longo dos mais de 20 anos de vigência do Código de Defesa, várias tentativas foram feitas para retirar ou minimizar esse direito. São os casos das exigências de listagem, na petição inicial, de nomes e endereços de todas as pessoas afetadas em ações coletivas e, também, da restrição geográfica dos efeitos da decisão judicial mesmo quando o efeito prejudicial ao consumidor se estende por todo o território nacional. “Imagine o caso de uma ação movida por um sindicato que tem 80 mil profissionais filiados. Só para citar nome e endereço de todos eles, a petição teria de ser entregue de caminhão”, exemplifica.
Essas situações estão entre as eliminadas pela proposta de revisão do CDC. Segundo Moraes, até esse momento, o Brasilcon está revisando a redação e fazendo sugestões aos parlamentares para que o texto não deixe margem a entendimentos que prejudiquem o acesso à Justiça.
Com isso, detalhou, se evitaria a criação de câmaras exclusivas para tratar de questões recorrentes, como as que contemplam questões bancárias. Para o procurador, é o poder de influência política que vem impedindo a transformação imediata de uma decisão favorável ao conjunto dos consumidores em norma regulatória.
Entidades acompanham tramitação para manter garantias
O diretor do Procon estadual, Cristiano Aquino, afirmou que todas as diretrizes debatidas na conferência e entendidas como necessárias para o avanço do Código de Defesa do Consumidor foram incluídas em uma carta. Nesse documento público, ainda segundo Aquino, foram traçadas metas para que os órgãos de Defesa do Consumidor as executem já no próximo ano. A ideia é garantir articulação nacional para acompanhar a tramitação dos projetos e evitar a aprovação de qualquer emenda que represente um retrocesso no conjunto de leis.
A diferença das propostas de atualização, conforme apontou Miragem, é a visão sistêmica sobre o Código de Defesa do Consumidor. “O risco de sofrer alguma alteração negativa é permanente. Hoje, além dessa proposta, existem mais de 600 projetos de lei para mudar o código. São projetos avulsos, sem visão sistêmica. Que existe perigo de descaracterização, existe”, disse o diretor do Brasilcon Bruno Miragem. Ele espera que até o final de 2013 os três textos tenham sido aprovados no Senado e, também, na Câmara dos Deputados.
Veículo: Jornal do Comércio - RS