O Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) condenou a Ambev a pagar uma autuação fiscal bilionária relativa à amortização de ágio gerado em operações relacionadas à tomada de controle da empresa brasileira pela belga Interbrew, em 2004. No balanço de 2013, a Ambev vincula à autuação o valor de R$ 3,9 bilhões, mas fontes ligadas ao caso destacam que o montante ultrapassa os R$ 5 bilhões.
O processo foi julgado no último dia 26 pela 3ª Turma da 1ª Câmara da 1ª Seção do Carf. Da decisão ainda cabe recurso à Câmara Superior do Conselho - responsável por unificar o entendimento do órgão quando há decisões divergentes entre as turmas - ou ao Judiciário.
A autuação julgada quarta-feira foi aplicada em dezembro de 2011. O auto de infração diz respeito à amortização de dois ágios, aproveitados pela companhia a partir da incorporação da InBev Holding Brasil pela Ambev, em 2005. A operação foi realizada no contexto da fusão entre a Ambev e a Interbrew.
O ágio é gerado quando uma empresa adquire outra por um preço maior do que o de mercado, contando com uma valorização futura. A Lei nº 9.532, de 1997, permite que o ágio seja registrado como despesa nos balanços e amortizado em, no mínimo, cinco anos. Assim, a operação reduz o valor a pagar do Imposto de Renda (IR) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL).
No caso da Ambev, a fiscalização entendeu que haveria o chamado ágio por meio de empresa veículo. Para o Fisco, a incorporação da InBev Holding Brasil não teve outro motivo senão o aproveitamento do ágio.
De acordo com o procurador da Fazenda Nacional Marco Aurélio Zortea Marques, o Fisco defende no processo que a incorporação não é uma decorrência natural do processo de fusão. "Não foram consideradas operações que tinham propósito negocial, que não fosse fiscal", afirma.
A argumentação foi acolhida pela maioria dos conselheiros do Carf. Os integrantes da turma mantiveram a autuação, mas reduziram para 75% a multa aplicada à Ambev. Originalmente, a autuação contava com uma penalidade de 150%, imposta quando há dolo ou fraude.
Marques diz que a Fazenda Nacional vai recorrer do processo em relação à multa. "A Fazenda entende que a exclusiva finalidade fiscal da operação acarreta operações artificiais, e essa artificialidade caracteriza fraude", afirma o procurador.
Ele ainda destaca que a fusão entre a Interbrew e a Ambev não é questionada pelo Fisco. "Em nenhum momento é questionada a fusão. O problema são as operações que ocorreram após a fusão ou em decorrência dela", acrescenta Marques.
Em seu balanço de 2013, a Ambev considera a probabilidade de perda do processo administrativo como "possível". A empresa informa no demonstrativo que não constituiu provisão e que, em caso de perda, a Anheuser-Busch Inbev (ABI), controladora da Ambev, reembolsará a companhia.
O advogado Luiz Paulo Romano, do Pinheiro Neto Advogados, diz que atualmente não é possível definir qual é o posicionamento do Carf sobre a amortização de ágio pelas empresas. "É muito difícil hoje dizer como Carf pensa, porque as turmas não têm uniformidade", afirma.
Para Romano, o entendimento definitivo do Conselho sobre os diferentes tipos de ágio poderá ser tomado em 2015, quando a Câmara Superior provavelmente começará a analisar processos relativos ao tema.
Por meio de nota, a Ambev informou que a incorporação tratada no processo "observou estritamente toda legislação aplicável, razão pela qual a Ambev entende que a sua posição prevalecerá administrativa ou judicialmente e, portanto, entende ser desnecessária a constituição de provisão para contingências".
Veículo: Valor Econômico