O ministro da Fazenda, Guido Mantega, disse ontem que o governo está acompanhando os preços de todos os setores que receberam benefícios, e que eles podem ser revertidos "em caso de abuso". Entre as medidas governamentais citadas por Mantega estão a elevação do Imposto de Importação e reduções tributárias. O acompanhamento é feito pela Secretaria de Acompanhamento Econômico (Seae), que levanta os preços dos produtos. "No caso de alimentos, o próprio Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) mede. A alimentação é um componente importante, facilmente verificado", disse.
Segundo o ministro, a principal contrapartida à desoneração de tributos federais da cesta básica, anunciada na sexta-feira pela presidente Dilma Rousseff, é o repasse da redução dos impostos para o preço final do produto. Além disso, Mantega citou o aumento das vendas e expansão dos investimentos do setor como benefícios da desoneração da cesta básica. "O setor apresentou um plano de expansão da produção de alimentos no país", afirmou.
"Eles faturaram R$ 425 bilhões no ano passado, o setor está indo bem e não sentiu a crise", disse. Mantega afirmou ainda que "o setor é importante para o governo porque gera muito emprego e atende necessidades básicas da população".
Mantega se reuniu ontem com representantes da Associação Brasileira de Supermercados (Abras), Associação Brasileira da Indústria de Alimentos (Abia), Associação Paulista de Supermercados (Apas) e de empresas dos segmentos. "Para nós do governo é importante que essa medida chegue logo às prateleiras dos supermercados para beneficiar a população brasileira", disse.
O ministro acredita que as empresas do setor de consumo, como supermercados e indústria de alimentos, crescerão mais neste ano e, com isso, contribuirão para a expansão da economia em 2013, que resultará num "bom" resultado para o Produto Interno Bruto (PIB).
Ele disse que não notou "cansaço" no consumo interno e deu como exemplo os próprios empresários de supermercados que "estiveram animados" na reunião que tiveram com ele. Esse setor, segundo o ministro, cresceu nos últimos anos puxado pela inclusão social - aumento da classe média, que ao receber uma elevação na renda passou a consumir mais, principalmente, alimentos. Mantega espera mais investimentos dessas empresas neste ano e afirmou que, em 2012, elas "queimaram estoques".
Segundo o ministro, as desonerações de tributos neste ano, já considerando a cesta básica, devem somar R$ 53 bilhões ante R$ 45 bilhões do ano passado.
O impacto da desoneração da cesta básica será de R$ 5,5 bilhões neste ano e R$ 7,4 bilhões em 2014. O ministro ressaltou ainda que está "generalizando a redução de tributos", destacando a desoneração da folha de pagamentos.
Mantega disse também que está "examinando vários setores" para serem atendidos com a desoneração da folha de pagamentos. "Estamos analisando a importância econômica e disponibilidade de recursos do governo. Existem outras necessidades de redução de tributos prontas para serem feitas", destacou. O governo, no entanto, avalia se a mudança é vantajosa para todas as empresas do setor e se há espaço fiscal para anunciar a ampliação da desoneração da folha de pagamentos.
De acordo com Mantega, há outras desonerações prontas para serem feitas, mas elas não foram anunciadas porque, segundo disse, "não temos o orçamento".
O governo ainda não sabe o impacto da desoneração da cesta básica nos índices de inflação. Mantega citou que economistas anunciaram cálculos de que a medida vai reduzir índices de inflação de 0,2 ponto percentual a 0,6 ponto percentual. "Não sabemos exatamente. Vamos saber depois que o IPCA captar essa redução", afirmou.
Ele afirmou que as desonerações aumentam a competitividade e a produtividade da indústria brasileira. "O consumidor também é beneficiado por isso", disse, lembrando que a população pode fazer "mais investimentos, com menos tributos e juros mais baixos".
Impacto da medida é maior para baixa renda
A medida provisória que desonera alimentos e produtos de higiene da cesta básica tem um caráter de "justiça tributária", disse ontem o diretor-técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), Clemente Ganz Lúcio. "A cesta básica tem um impacto progressivo. Quanto menor o salário da família, maior seu peso na renda", disse. "As desonerações têm uma dimensão estrutural, de justiça tributária, já que os impostos sobre esses produtos pesam mais para aqueles com renda menor."
Segundo o diretor, os alimentos tomam pelo menos um quarto da renda das famílias das faixas salariais mais baixas, proporção que vai ganhando folga conforme aumentam os rendimentos. "A redução de impostos deve conferir maior disponibilidade da renda para quem tem salário menor, para poder gastar com outras coisas", disse ele. "Mas depende da proporção em que isso será repassado para o consumidor."
Nos cálculos da LCA Consultores, o impacto para a baixa renda deve ser maior. A estimativa da consultoria é que, considerados apenas os produtos alimentícios que receberam desoneração (café, óleo, manteiga e açúcar), a medida responda por uma redução total de 0,44 ponto percentual no Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), o indicador do IBGE que calcula a inflação para a as famílias com renda de 1 a 40 salários mínimos. Já no Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), em que são consideradas apenas as famílias com até cinco salários mínimos, o impacto deverá ser de 0,63 ponto.
A cesta básica calculada pelo Dieese, nos 12 meses encerrados em fevereiro, acumula alta superior a 10% nas 17 capitais analisadas, com destaque para Salvador (32,03%), Natal (29,82%) e Fortaleza (29,29%), onde estão os menores salários. Em Salvador, por exemplo, a renda média é de R$ 1.086 por mês, enquanto no resto do país chega a R$ 1.583. Em São Paulo, que tem a cesta básica mais cara, o valor chegou a R$ 326,59 em fevereiro, 18% mais que em fevereiro de 2012. (JE)
Veículo: Valor Econômico