O Casino e Abilio Diniz, sócios do Grupo Pão de Açúcar, estão envolvidos em um segundo processo arbitral. O empresário brasileiro deu entrada ontem à noite num pedido de arbitragem na Câmara de Comércio Internacional (CCI), em São Paulo, a respeito de uma possível violação de seus direitos como presidente do conselho de administração do Pão de Açúcar.
Em maio de 2011, o Casino entrou com procedimento arbitral na mesma câmara para que Abilio respeitasse o acordo de acionistas e a transferência do controle aos franceses, acordada em 2006 e prevista para junho deste ano - o que ocorreu dentro do previsto.
Segundo nota oficial, Abilio quer assegurar que o Casino cumpra o acordo de acionistas da holding Wilkes, assinado em 2006, de forma que o controlador não aja com o intuito de "violar" o cargo de Abilio, informa a nota.
Consultado, o Casino informou que ainda não tem uma posição oficial, pois não viu o conteúdo do processo por conta da diferença de horário entre os países.
O processo arbitral não tem nenhum pedido liminar e a instalação dos comitês e seu funcionamento devem prosseguir. Com o prazo necessário para solução da contenda, de no mínimo dois anos, é possível que Abilio já tenha exercido seus direitos de saída do Pão de Açúcar, o que pode fazer a partir de 2014.
Abilio entende que as últimas iniciativas do sócio controlador Casino violam o acordo de acionistas, no que diz respeito ao seu papel na companhia. O empresário tem o direito vitalício à presidência do conselho de administração, e sua permanência está atrelada ao bom desempenho dos negócios.
Três ações tomadas pelo controlador determinaram a postura do empresário e são alvo da arbitragem. A primeira foi a proibição da participação de Abilio na reunião de Paris, na sede do Casino, no dia 26 de novembro. No encontro, que contou com a presença de executivos da varejista, foi discutido o planejamento estratégico do grupo para o período de 2013 a 2015.
O segundo motivo foi a não aceitação da participação do empresário em dois recém-criados comitês, o de governança corporativa e de finanças. Ele apresentou seu nome para integrar os órgãos, mas teve a autoindicação vetada na reunião do conselho de administração realizada na sexta-feira - o Casino foi contra, os membros de Abilio a favor e os independentes se abstiveram.
O terceiro e último ponto foi a criação do que os advogados de Abilio chamam de um "supercomitê" de governança corporativa com um regimento que, segundo entendimento do empresário, viola o poder do próprio conselho de administração e, em especial, seu papel como presidente.
Na leitura do sócio brasileiro, essas ações do controlador afetam o acordo de acionistas assinado com o Casino em 2006. Está definido no documento que a atuação de Abilio depende do bom desempenho da companhia. Na arbitragem, o empresário vai sustentar, por exemplo, que os comitês têm papel fundamental no debate dentro da empresa e, se o Casino estiver no controle desses comitês, mesmo sendo presidente do conselho, o seu poder de decisão seria afetado. O Casino não concorda pois entende que o conselho tem o poder deliberativo e os comitês apenas papel de assessoramento.
A decisão da entrada do processo arbitral não foi surpresa para o Casino. A medida foi tomada depois de o empresário acreditar que já tinha dados para isso - o que só se tornou possível após a reunião do conselho na semana passada, com o aval às medidas que supostamente violam seus direitos.
Na reunião, Abilio perguntou a Arnaud Strasser, membro ligado ao controlador, a razão dos vetos, mas o Casino entendeu que não precisaria se justificar.
Na mesma reunião foi votada a proposta de regimento do comitê de governança. Abilio foi à reunião munido de comentários e parecer de Nelson Eizirik, jurista e ex-diretor da CVM, contrário a pontos da proposta. Ali, o clima pesou. Abilio queria dar quinze minutos para membros do conselho avaliarem o parecer e suas sugestões de alterações e o Casino não aceitou.
As discussões geraram duas cartas do Casino a Abilio, com queixas a respeito de sua conduta no conselho, alegando que ele estaria defendendo seus interesses e não os da companhia, e também alertando para o tom passional do empresário. Todos os membros do colegiado receberam a correspondência.
A convivência difícil na companhia deve ter uma trégua neste começo de ano, quando Abilio entrará em férias. O empresário retomará suas funções apenas em fevereiro e espera, quando voltar, deixar a disputa para os advogados e focar seus esforços na gestão do negócio.
Veículo: Valor Econômico