Efeito dominó

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Empresas têm nas novas mídias uma ferramenta para soluções socioambientais.

 

Antes de jogar fora a embalagem de um iogurte, o headhunter paulistano Renato Andrade, especializado em vasculhar redes sociais em busca de talentos profissionais para empresas, não hesitou em procurar no espaço virtual uma orientação para aquele descarte. Postou no Twitter perguntas sobre o que poderia fazer com o pote de plástico vazio em vez de depositar na lixeira. Não demorou para o fabricante detectar o questionamento, identificar na rede os contatos pessoais do consumidor e, via telefone, explicar como destinar aquele resíduo para reciclagem.

 

"As redes sociais permitem contato dinâmico, aberto e espontâneo com consumidores, ajudando a prospectar desejos com relação a produtos e ações corporativas, inclusive na área socioambiental", diz Marcia Abreu, gerente-executiva de comunicação ao consumidor da Nestlé, empresa que incorporou a interação na internet à sua plataforma Criação de Valor Compartilhado, destinada a resultados de longo prazo.

 

O verbo "compartilhar" torna-se jargão nos negócios, sobretudo quando o assunto é sustentabilidade, envolvendo diferentes setores que precisam se relacionar, como o econômico, o ambiental e o social. Empresas começam a investir na estrutura para monitorar o que dizem on- line sobre elas e seus produtos, não se limitando a ações reativas diante de queixas e dúvidas. "É preciso ser pró-ativo com planejamento, porque as mídias sociais têm alto poder de mobilizar pessoas, mas a pegada marqueteira sem substância pode ser um tiro pela culatra", diz Luiz Carlos Dutra, vice-presidente de assuntos corporativos da Unilever.

 

Em sua última campanha institucional, para além de anunciar o que faz, a empresa propôs uma causa: "Cada um deve fazer a sua parte em favor das questões ambientais e sociais", diz o executivo. O desafio foi estimular o debate para mudança de hábitos, quando se sabe que "a maior parte das emissões de carbono pelos produtos industrializados (cerca de 70%) ocorre no consumo e a menor parcela na produção e distribuição."

 

Em lugar da televisão, pela primeira vez a empresa encontrou nas redes sociais o espaço mais apropriado para disseminar um novo conceito. "Desde junho de 2010, a campanha teve 41 milhões de interações com 14 mil seguidores fazendo comentários e espalhando ideias e críticas", conta Dutra. O propósito de mobilizar e compartilhar experiências carrega riscos pela exposição da imagem em um mundo de conexões ainda pouco conhecido. Mas, segundo Dutra, o resultado tem sido positivo.

 

Disseminam-se comentários sobre como utilizar sabão em pó com economia de água. Entre os exemplos, a empresa postou em sua página no Facebook: "Antes de comprar qualquer móvel de madeira, verifique se a matéria-prima é certificada. Só assim você terá certeza de que não colaborou com a degradação do meio ambiente e causou o mínimo impacto em alguma floresta". Uma usuária comentou: "E como podemos saber quem nos fornecerá essa garantia?."

 

A experiência brasileira serve de piloto para as operações da companhia no mundo. "Hoje os relatórios de sustentabilidade estão sendo reformulados com base no retorno que temos nas mídias sociais", diz Dutra. "A tendência é esses insights influenciarem a inovação, com mudanças e novos projetos de produtos em busca de melhorias ambientais".

 

Em nível global, a Unilever suspendeu o uso de animais nos testes para produção de chás, após protesto que envolveu 14 mil mensagens eletrônicas via redes sociais. Por outro lado, a companhia viu repercutir positivamente na internet a notícia de que começará a gerar energia a partir de resíduos de sorvete em uma de suas fábricas, na Holanda.

 

Empresas aprendem a lidar com um mundo onde as pessoas se relacionam cada vez mais entre si. "São ferramentas que ajudam a perceber se o discurso corporativo está alinhado à prática socioambiental", diz o blogueiro Roberto Leite. Seu blog "Testando os Limites da Sustentabilidade", criado em 2010, recebeu quase 10 mil visitas. É frequentado por empresas de grande porte que respondem a cobranças construtivas sobre a questão. Algumas entendem a proposta do diálogo na internet e prestam esclarecimentos consistentes, como ocorreu com a Natura, questionada sobre os mecanismos que adota para evitar que atravessadores explorem a comunidade amazônica para obtenção de matéria-prima a custos baixos. A empresa de celulose Fibria contribuiu para o debate, respondendo 21 questões sobre o que escreveu em seu último relatório de sustentabilidade.

 

Hoje, segundo o Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), nos Estados Unidos, cerca de 57% dos usuários falam mais on-line com as pessoas do que na vida real. "As empresas precisam investir nesses mecanismos, evitando surpresas desagradáveis multiplicadas pelo boca-a-boca virtual", recomenda Vera Lúcia Vieira, diretora da consultoria Costumer Sat. "A abertura para críticas e esclarecimentos contribui para um capitalismo mais moderno", destaca.

 

"As redes permitem estratégias diferenciadas", avalia Kami Saidi, diretor de sustentabilidade da HP Brasil. Entre seus produtos, um aparelho multifuncional que contém 35% de material reciclado participa do Prêmio Green Best, com votação na internet. A cada click e comentário que se replica entre as páginas dos amigos, questões como reciclagem e economia de recursos naturais são debatidas. "O monitoramento do que acontece por lá deve ser permanente", diz Saidi. A ferramenta pode ser chave para estruturar a logística reversa - a coleta de equipamentos fora de uso para reciclagem, conforme determina a legislação.

 

Oportunidades chegam ao varejo. "A sustentabilidade, além de necessária, mexe com o desejo das pessoas", ressalta Marcos Wettreich, diretor da Greenvana - loja virtual de produtos com atributos sustentáveis. São vendidos 1 mil artigos, de mochila com placa solar para carregar notebook a sabonete embalado em papel-semente que se transforma em flor quando enterrado. Criada em 2010, a empresa cresce ao ritmo de 1 mil fãs por dia na rede. Em outra iniciativa, a eBike Store, chegou ao Facebook para comercializar bicicletas elétricas. Com US$ 150 investidos em anúncio na rede, recebeu 1,1 mil visitantes em um mês. "Apostamos no efeito cascata para decolar as vendas de um produto que não polui e diminui o problema do trânsito", afirma o diretor Ricardo Uchôa.

 

Veículo: Valor Econômico


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