O Walmart Stores planeja lançar sofisticadas etiquetas de identificação eletrônica para seguir calças jeans e roupas de baixo, no primeiro passo de um sistema que controla melhor o estoque, segundo seus defensores, mas levanta questões de privacidade, segundo seus críticos. Nas próximas duas semanas, a varejista vai colocar em peças de vestuário individuais "etiquetas inteligentes" que podem ser lidas por um leitor manual. Funcionários do Walmart poderão descobrir rapidamente o tamanho de jeans Wrangler que está em falta, com o objetivo de garantir que as prateleiras estejam estocadas da melhor maneira possível e que o inventário seja vigiado de perto. Se der certo, as etiquetas de radiofrequência, conhecidas pela sigla em inglês RFID, serão estendidas a outros produtos nas mais de 3.750 lojas da rede nos Estados Unidos.
"A possibilidade de balançar a varinha mágica e ter uma ideia de todos os produtos que estão na loja ou no estoque é algo que achamos que pode transformar nosso negócio", diz Raul Vazquez, diretor do Walmart para o Oeste dos EUA.
Até agora, os varejistas, incluindo o Walmart, vinham usando etiquetas RFID, que armazenam códigos numéricos de identificação únicos que podem ser escaneados a distância, para seguir paletes de mercadoria através da cadeia de suprimento. A adoção ampla pelo Walmart pode ser a maior do mundo, e os defensores da RFID dizem que isso poderia levar outros varejistas a começar a usar o produto, que continua caro. O Walmart galgou o topo do mundo do varejo pela redução constante de custos de suas operações e pelo repasse desses ganhos aos consumidores. Seus métodos são amplamente adotados por seus fornecedores e, portanto, tornam-se prática padrão por toda a cadeia.
Mas essa mais recente tentativa da companhia de usar sua influência - executivos chamam isso o início da "nova geração Walmart" - está fazendo defensores da privacidade levantar questionamentos.
Embora as etiquetas possam ser removidas das roupas e embalagens, elas não podem ser desligadas, e, portanto, são localizáveis. Alguns defensores da privacidade especulam que empresas inescrupulosas ou criminosos poderiam passar de carro ao lado das casas das pessoas e escanear o lixo delas para descobrir o que compraram recentemente.
Eles também temem que os varejistas sejam capazes de escanear os clientes que têm novas formas de identificação para determinar a identidade deles quando entram numa loja, sem o conhecimento dos clientes. Estados americanos começaram a emitir carteiras de motorista mais avançadas, que contêm RFID com informações pessoais.
"Existem duas coisas que você realmente não quer etiquetar: roupas e documentos de identidade, e ironicamente é aí que estamos vendo sua adoção", disse Katherine Albrecht, fundadora de um grupo chamado "Consumidores Contra a Invasão de Privacidade nos Supermercados e Numeração" e autora de um livro chamado "Spychips". "Os caras do estoque podem estar no escuro sobre isso, mas existem vários marqueteiros que estão interessados em seguir as pessoas enquanto elas andam pelos corredores de venda."
Especialistas em RFID dizem que a preocupação com o Big Brother não passa de conjecturas sem razão, mas os ativistas têm pressionado as empresas. Albercht e outros iniciaram um boicote ao Benetton Group na década passada, depois que um fabricante de RFID anunciou planos de fornecer 15 milhões de chips RFID à empresa. Mais tarde, o Benetton esclareceu que estava apenas avaliando a tecnologia e que nunca embutiu um censor em roupas.
O Walmart está exigindo de seus fornecedores que usem a tecnologia em etiquetas ou embalagens que possam ser removidas, ao invés de encaixá-las nas roupas, para minimizar o temor de que elas possam ser usadas para seguir o movimento das pessoas. A rede também está colocando cartazes para informar os clientes sobre as etiquetas.
Alguns grupos que defendem a privacidade dizem que isso não é suficiente porque as pessoas vão sair da loja com sensores ativos que podem, ao menos em princípio, revelar informações sobre o que elas compraram. Não existe uma forma de desligar o sensor RFID no caixa.
Na Europa, alguns varejistas colocam o RFID em etiquetas penduradas, normalmente removidas na hora do pagamento. Ainda assim, as etiquetas RFID oferecem o benefício de controle de estoques, mas não outros usos potenciais de que varejistas gostam, como a capacidade de acompanhar o item em todo o caminho de volta ao fabricante, no caso de um recall, ou garantir que o produto não será falsificado.
A Walmart não diz como planeja se beneficiar desse esforço, mas um piloto da tecnologia RFID na American Apparel, em 2007, concluiu que as vendas nas lojas com a tecnologia subiram 14,3%, em comparação com lojas que não usaram a tecnologia, de acordo com a Avery Dennison Corp., um fabricante do equipamento RFID.
Embora as etiquetas não substituam sensores de roubo bem maiores, a Walmart espera que elas reduzam o roubo por funcionários.
Outros varejistas americanos, entre eles J.C. Penney e Bloomingdale's, começaram a testar as etiquetas RFID em roupas para garantir que as prateleiras continuem estocadas com tamanhos e cores que os clientes querem, e vários varejistas europeus, especialmente o Metro, da Alemanha, aderiram à tecnologia.
Robert Carpenter, presidente do GSI, um grupo sem fins lucrativos que ajudou a desenvolver padrões universais para códigos de produtos quatro décadas atrás e agora está fazendo o mesmo para códigos eletrônicos de produtos, disse que o custo dos sensores caiu de US$ 0,50 há poucos anos para US$ 0,07 a US$ 0,10. Ele prevê que o uso pelo Walmart vá reduzir o preço ainda mais.
"De fato, existem custos. Algumas etiquetas tiveram que ser modificadas", disse Mark Gatehouse, diretor de reabastecimento da VF Corp., fabricante do jeans Wrangler, lembrando que embora o Walmart esteja subsidiando os custos dos sensores, os fornecedores tiveram que investir em novos equipamentos. "Mas nós vemos este como um investimento no futuro do negócio. Todos estão acompanhando de perto porque ninguém quer estar em desvantagem competitiva, e isso realmente poderia elevar as vendas."
O Walmart não revela quanto está gastando nesse esforço, mas confirma que está subsidiando alguns dos custos dos fornecedores.
Embora a preocupação com gastos tenda a limitar o uso das etiquetas de identificação na gestão de estoques de roupas e eletrônicos por vários anos, seus defensores preveem usos futurísticos. Além de fazer programas de recall mais eficientes e prevenir perdas, as etiquetas poderiam acabar com as filas nos caixas.
"Vamos ver compras que não requerem contato na hora de pagar, que usam celulares ou quiosques, e vamos ver novas formas de interação, como poder descobrir se existem outros números e cores disponíveis, enquanto se experimenta algo no provador", disse Bill Hardgrave, diretor do Centro de Pesquisa de RFID da Universidade do Arkansas, que foi em parte financiado pelo Walmart. "É aí que a mágica vai acontecer. Mas isso ainda vai demorar anos."
Veículo: Valor Econômico