Uma tubaína com ambições de Coca-Cola

Leia em 4min 40s

Depois de perder espaço no mercado, fabricantes regionais de refrigerante se unem para criar a concorrente Ice Cola

 


Antes de lançar o refrigerante Ice Cola numa região, a estratégia de marketing da marca estabelece que um vídeo de 15 segundos seja exibido na TV local e enviado por e-mail para o maior número possível de consumidores. A propaganda mostra apenas a boca de uma garrafa de refrigerante e não revela o nome do produto. Ao final do anúncio, diz o locutor: "Mate sua sede de curiosidade. Vá ao supermercado mais próximo e experimente."

 

A tática é repetida entre os varejistas. Quando vai apresentar o produto ao dono de um mercado ou ao diretor de uma loja, o representante da nova marca promove um teste cego para comparar Ice Cola e Coca-Cola. "Queremos que as pessoas provem a qualidade do nosso produto primeiro para criar uma opinião depois", diz Milton Dias, gerente de comunicação e marketing da Amazon Flavors, empresa que criou a Ice Cola. "A marca Coca-Cola é muito forte e os que ousam ser parecidos podem virar motivo de chacota."

 

Os concorrentes da Coca-Cola no Brasil são, de fato, poucos. As tubaínas - como ficaram conhecidos os produtos mais baratos e de alcance regional - chegam a incomodar os líderes em categorias como refrigerante de guaraná e laranja. Em seu quintal, porém, a Coca-Cola reina absoluta. Segundo a consultoria Euromonitor, no ano passado a marca acumulou 82% das vendas de refrigerante de cola no Brasil e a Pepsi, 12%.

 

As dificuldades não estão reservadas às tubaínas. A multinacional Pepsico tenta, há décadas, diminuir o fosso que a separa da líder. Há seis anos, a estreia da americana RC Cola (Royal Crown Cola) no País foi um fracasso. A marca, trazida para o Brasil por empresários locais com a ajuda de um ex-presidente da Coca-Cola, ficou apenas três anos no mercado. Sua fábrica acabou sendo vendida para a própria Coca-Cola.

 

Pois é exatamente esse o desafio da novata Ice Cola, criada há dois anos pelo empresário catarinense Cláudio Bruehmueller, sócio da fabricante de refrigerantes Marajá, do Mato Grosso, e presidente da Amazon Flavors, empresa de corantes e concentrados com sede em Manaus que organizou o projeto do novo refrigerante. "Mercados em que há monopólio não são interessantes para o consumidor nem para o País", diz Bruehmueller. "O segmento de cola é enorme e tem poucos concorrentes. Essa é uma grande oportunidade."

 

Tubaína nacional. Depois de observar a experiência tanto de marcas locais como das estrangeiras, Bruehmueller montou uma estratégia baseada no modelo de franquias. Sua intenção é fazer uso das fábricas e estruturas de distribuição já estabelecidas pelos fabricantes regionais espalhados pelo País. A isso, soma-se um plano de marketing único para os franqueados, que inclui, além das propagandas de TV, outdoors e até a distribuição de refrigerante no trânsito.

 

Trata-se de uma espécie de tubaína de alcance nacional. "A briga baseada apenas no preço mata a gente. Com a Ice Cola, passamos da guerra do preço para a guerra da marca", diz Marcel Dore, da fabricante Dore, do Rio Grande do Norte e Paraíba.

 

Ao todo, 12 fabricantes já vendem Ice Cola em nove Estados do nordeste, sudeste e sul. Até o ano que vem, a meta é chegar a 40. Em média, o refrigerante custa 15% mais barato na comparação com a líder e está presente, na maior parte, em lojas de pequeno e médio porte. No que diz respeito ao apelo do produto em si, as referências à Coca-Cola não poderiam ser mais claras: do rótulo vermelho à uma promoção inspirada na Copa em que os consumidores são convocados a trocar tampinhas por uma bola.

 

Até agora, a participação de mercado atingida pela Ice Cola é irrelevante. No ano passado, foram vendidos 96 milhões de litros do refrigerante, o equivalente a cerca de R$ 100 milhões em um mercado de quase U$ 10 bilhões. Para os pequenos fabricantes associados, porém, o efeito foi grande. "Desde que adotamos a Ice Cola, nossa participação de mercado dobrou. Agora temos 9% no Estado e queremos chegar a 12% até o final do ano", diz Ademar Bragatto, diretor do Grupo Coroa, que fabrica refrigerantes no Espírito Santo.

 

Nova etapa. A experiência da Ice Cola marca uma nova fase na trajetória das tubaínas. Impulsionadas pelo Plano Real e o aumento do poder de consumo das classes mais baixas, essas marcas atingiram seu auge no final da década de 90. Em conjunto, sua participação no mercado de refrigerantes chegou a inéditos 33%. Desde então, porém, a vida dos fabricantes locais de refrigerante começou a ficar mais difícil. A Coca-Cola, por exemplo, reagiu: multiplicou por seis o seu portfólio de embalagens, permitindo o desembolso menor por meio de latinhas minúsculas ou garrafas econômicas. O casco retornável foi ressuscitado nas periferias, em um modelo de vai e vem que quase elimina o gasto do consumidor com a garrafa.

 

Medidas como essas, junto com a consolidação do setor e o aperto na cobrança dos impostos nas fábricas, levaram ao atual cenário. Hoje, as marcas locais possuem 21,6% do mercado. "Queremos recuperar esse espaço", diz Fernando Rodrigues de Bairros, presidente da Associação dos Fabricantes de Refrigerante no Brasil (Afrebras). Por enquanto, a Ice Cola é uma das principais apostas.

 


Veículo: O Estado de S.Paulo


Veja também

A Bud vem aí

A AmBev prepara para 2010 o lançamento no Brasil da Budweiser, a cerveja mais vendida do mundo, que passa a ser f...

Veja mais
La Niña esfria verão, mas venda deve subir

No verão passado, as temperaturas mais quentes provocadas pelo fenômeno meteorológico El Niño...

Veja mais
Vinho ganha mais espaço na mesa do brasileiro

No carrinho do supermercado, dois pacotes de macarrão, duas caixas de molho de tomate, um frango congelado e uma ...

Veja mais
Alta de tributos sobre bebidas será discutida na Câmara

O Sistema de Controle de Bebidas (Sicobe), que instituiu a cobrança de R$ 0,03 sobre as unidades de bebidas envas...

Veja mais
51 é o 4º destilado mais vendido do mundo

A famosa Cachaça 51, da Companhia Müller de Bebidas, está entre os destilados mais vendidos do mundo,...

Veja mais
Foco no Brasil

A busca do Brasil pelos produtores de vinho da Argentina está dando certo. Nos cinco primeiros meses deste ano, o...

Veja mais
Água Bonafont ganhará divisão própria

Perrier é a grife de água da Danone. Bonafont, a água que garante baixo teor de sódio, &eacu...

Veja mais
Eliminação encurta verão fora de época de cervejarias

Acabou mais cedo o "mês de verão no meio do inverno", como as cervejarias gostam de se referir ao pico de v...

Veja mais
Diageo põe ativos realmente líquidos em fundo de pensão

O que o uísque não cura não tem cura, diz um ditado antigo. Será que isso se aplica a um d&e...

Veja mais