Em meio a turbulência financeira mundial, paira uma dúvida: o vinho e a champanhe que estarão na mesa do brasileiro nas festas de fim de ano serão nacionais ou importados? Por um lado, a alta do dólar está animando as vinícolas brasileiras, que já detectam crescimento nas vendas e esperam recuperar, nos próximos meses, parte dos negócios perdidos para os vinhos franceses, argentinos, chilenos, italianos, alemães, africanos, entre outros. Na outra ponta estão as importadoras, que anteciparam as compras devido ao Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). Em maio, o governo anunciou que aumentaria a alíquota do tributo em 30%. As empresas, para fugir da mordida, partiram para as compras de junho a setembro, com dólar a R$ 1,60. No início do mês, o governo postergou o reajuste do IPI para janeiro. Mas as adegas já estavam cheias e o reajuste de preço poderá ser postergado.
No Sul do país, onde está a maior parte das vinícolas do país, o clima é de otimismo. A Miolo, uma das maiores empresas do setor no Brasil, está fechando a primeira quinzena de outubro com encomendas 30% superiores às do mesmo período do ano passado, constata o diretor nacional de vendas Márcio Bonilha. Com o novo cenário, a Miolo está revisando de 19% para até 24% a estimativa de crescimento nas vendas de vinhos e espumantes neste ano em relação às 740 mil caixas de seis garrafas vendidas em 2007. "Estávamos esperando um crescimento de 20% nas vendas de fim de ano, mas agora elas podem avançar 30%."
Em São Paulo, a Expand, uma das principais importadoras de vinhos do país, graças ao medo de um IPI maior, tem 5 milhões de garrafas em estoque compradas nos meses em que o dólar estava em baixa. "Se depender da gente, o vinho do Natal e do Ano Novo vão ser importados", diz Otávio Piva de Albuquerque Filho, diretor de operações da importadora. Com preços sem aumento até o fim de 2008, o empresário continua mantendo a expectativa de vendas 15% maiores em volume que em 2007. Em outubro, inclusive, ele diz que a procura foi 20% maior. "Tem muita gente aproveitando o preço velho e fazendo estoque também."
Nos supermercados, a situação é a mesma. "A maioria das redes fez compra adiantada", afirma Martinho de Paiva Moreira, vice-presidente de Comunicação da Associação Paulista de Supermercados (Apas). Diante desse cenário, Martinho acredita que não haverá alteração nas previsões de vendas, tanto para os nacionais, quanto para os importados. "Quem compra vinho importado, vai continuar comprando. E o consumidor de nacional também não vai mudar."
Já o presidente da União Brasileira de Vitivinicultura (Uvibra), Henrique Benedetti, diz que "o fim de ano será dos vinhos nacionais". A participação dos produtos estrangeiros, segundo ele, era de 48,8% do mercado em 2002. No ano passado, chegou a 73,3%, com 78,6 milhões de litros de vinhos consumidos.
Com a desvalorização do real, Benedetti acredita que ainda este ano a participação dos importados pode cair a 70%. "O dólar na faixa de R$ 2 a R$ 2,20 é adequado para as vinícolas", diz ele. Acima disso, o câmbio prejudica a importação de equipamentos e insumos dolarizados que vão desde fertilizantes até rolhas, de leveduras a enzimas.
De qualquer maneira, existe uma tensão com relação às vendas do quarto trimestre, período que representa a maior concentração de vendas para o setor. Na Miolo, cerca de 45% dos negócios anuais da empresa são feitos nessa época. Em importadoras de luxo, como a Grand Cru de São Paulo, os preços dos argentinos (forte da casa) devem continuar iguais. Mas os vinhos tipo "bordeaux" subiram 20%. "Mesmo que os preços fiquem estáveis, boa parte de nosso público é formado por pessoas que investem no mercado financeiro", diz a gerente Flávia Rocha.
Na Vinhos do Mundo, importadora e varejista de Porto Alegre, o compasso também é de espera. A empresa, que trabalha com cerca de 1,5 mil rótulos de 15 países, ainda não reajustou as tabelas de preços para não perder clientes, mas na semana passada decidiu segurar o embarque de cerca de 3,5 mil caixas de vinhos chilenos e argentinos, o equivalente a 30 a 40 dias de vendas. Conforme o diretor Leocir Vanazzi, a intenção foi esperar uma definição melhor do câmbio para evitar remarcações. "Estamos administrando a situação", explicou ele, que tem um estoque para até 40 dias de vendas, o que não engloba as festas.
De qualquer maneira, existe um produto que deve se sobressair no Natal e Reveillón: o espumante brasileiro. Para o diretor da Apas, o produto terá vantagem sobre o importado, com ou sem reflexos do dólar nos preços. "É uma bebida de qualidade reconhecida. Com aumento ou não do importado, aposto que o espumante terá vantagem."
Veículo: Valor Econômico