O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) arquivou ontem, por unanimidade, um processo contra a fabricante de bebidas Ambev por supostas barreiras no mercado de cerveja. A companhia era acusada pela concorrência por "abuso de posição dominante" ao colocar sua marca nas garrafas de um litro, o chamado "litrão". Para os seis conselheiros do órgão antitruste, a prática não fere a livre concorrência.
O advogado da Ambev, Gabriel Dias, defendeu que a garrafa com capacidade de um litro é "uma inovação", uma estratégia e um "desenvolvimento da companhia no sentido de trazer múltiplas embalagens ao consumidor". O novo casco, diz ele, é uma "diferenciação do produto", e a empresa tem direito a usar esse instrumento.
Dias destacou que outras cervejarias já lançaram versões de seus produtos em garrafas de um litro. O mercado "litrão" cresceu, principalmente, nas classes de mais baixa renda, por oferecer maior quantidade de cerveja por um preço menor, lembrou. Além disso, ele afirmou que a inovação promovida pela Ambev tornou o mercado mais "competitivo", já que surgiram promoções de cervejas 600 ml e em lata.
Relator do processo, o conselheiro Emmanuel Joppert Ragazzo afirmou que o uso de garrafas "litrão" é mais eficiente, mas não é anticompetitivo. Outros conselheiros do órgão complementaram, ainda, que outras embalagens do setor também não são "padronizadas", como as garrafas do tipo "long-neck", geralmente com capacidade de 355 mililitros (ml).
Os conselheiros concordaram que não há impedimento para outras empresas atuarem no mercado de "litrão", tanto é que há concorrência nesse nicho. Ainda cabe recurso da decisão.
A Ambev, detentora de 70% do mercado de cerveja do Brasil, "impede", de acordo com a Associação Brasileira de Bebidas (Abrabe), que suas garrafas com a logomarca da empresa possam ser trocadas e usadas pelas demais cervejarias.
Com isso, a empresa fere o sistema de intercâmbio de cascos de cervejas, como ocorre, por exemplo, com garrafas de 600 ml da bebida, alegam a Abrabe e a cervejaria Kaiser, que entraram com o processo administrativo contra a prática da Ambev.
"Uma empresa com 70% do mercado, é óbvio que faz o hábito do consumidor. E é óbvio que as outras têm que seguir", afirmou a advogada da Abrabe, Paula Forgioni, no Cade. A Ambev, segundo ela, criou barreiras à entrada de novos competidores, aumentou o custo do rival, o que "reforça a posição de [empresa] dominante".
Segundo o Ministério Público Federal (MPF), o problema não é o "litrão", mas a prática de "marcar" os cascos de cerveja. Essa ação "traz efeitos de concentração" de mercado, disse o representante do MPF no Cade, Luiz Augusto Santos Lima. "É uma intenção de influir na escolha, na fidelização do ponto de venda e minorar o poder de escolha do consumidor", declarou. Lima disse também que a prática "detona" o sistema de compartilhamento de garrafas, que é uma "tradição" no país.
A advogada da Abrabe informou que vai analisar o processo para tomar as medidas cabíveis.
Veículo: Valor Econômico