Vinho: Malbec, Bonarda e Torrontés, trunfos da Argentina

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Um trunfo da vitivinicultura argentina são suas uvas "autóctones": Malbec, Bonarda e Torrontés. Coloco entre aspas a palavra autóctone (natural do país ou região), pois tecnicamente estas castas não são comprovadamente originárias da Argentina, mas tornaram-se um símbolo da enologia do país do tango.

 

Malbec

 

Num momento em que o mercado internacional busca, cada vez mais, vinhos que possuam alguma distinção, a Malbec transformou-se numa assinatura argentina. Sua origem é o sudoeste da França onde é chamada de Cot ou Côt no sudoeste. Também é plantada no vale do Loire e no Cahor (onde também é chamada de Auxerrois). Em Bordeaux, onde pode ser chamada de Pressac, mesmo nunca tendo sido muito plantada, marcava sua presença até o final do século XIX, quando a praga Filoxera atacou a região. Hoje em Bordeaux são raros os châteaux que usam Malbec, e os que usam raramente ocupam mais que 5% de seus vinhedos com esta casta.

 

A verdade é que a Malbec (com algumas exceções) nunca atingiu a grandeza na França, onde não chega a atingir a maturidade ideal. É na Argentina que a Malbec chega ao esplendor, gerando líquidos frutados, estruturados e escuros.

 

A Argentina conta com condições naturais favoráveis ao cultivo da vinha. Com escassa matéria orgânica, os solos são pedregosos e secos. A exposição solar é excelente e o clima semi-árido, de pouca umidade e chuvas escassas, dispensa agrotóxicos. O sistema de irrigação, suprido pelo degelo dos Andes, garante o complemento ideal de água para as parras. A altitude dos vinhedos, que pode passar dos 2 mil metros, e a grande amplitude térmica diária, com dias quentes e noites frescas, também são fatores fundamentais para a produção de grandes Malbecs.

 

As mudas da Malbec chegaram à Argentina vindas de Bordeaux em 1852. Hoje há mais variedade clonal de Malbec na Argentina que na França.

 

Um Malbec argentino em seu melhor tem cor muito escura, aromas de fruta negra muito madura, além de violetas, (agregados eventualmente aromas de seu amadurecimento em madeira), paladar encorpado e macio, largo com taninos doces, acidez moderada, alta graduação alcoólica (entre 14 e 15%).

 

Bonarda

 

Até os anos 1990 a casta Bonarda reinava absoluta na Argentina, quando passou o cetro para a Malbec. A Bonarda, contudo, continua sendo expressivamente plantada e gerando vinhos inconfundivelmente argentinos. Até pouco tempo, mesmo sendo a casta mais plantada do país, dificilmente a Bonarda aparecia nos rótulos. Hoje seu prestígio está renovado através de ótimos vinhos. Esta casta se dá bem na zona mais quente, um local que não é adequado para a Malbec, o que garante o convívio destas duas castas.

 

A história da Bonarda na argentina começa com a chegada dos imigrantes italianos no final do século XIX, que teriam trazido mudas de várias castas. É preciso ter cuidado ao comparar a Bonarda italiana com a Argentina. Na Itália existem ao menos três tipos principais de Bonarda, no Piemonte (Bonarda propriamente dita), na Lombardia e Emilia-Romagna (também chamada de "uva rara") e em Oltrepó Pavese (onde é outro nome da Croatina). Na Itália existem muitos subtipos da Bonarda e muito apelidos, como Bobabrda di Gattinara, Bonarda di Cavaglia, Bonarda Grossa, Bonarda Piccola, Bonardadi Pignola, Bonarda Novarese.

 

Na Argentina é difícil ser preciso sobre de qual Bonarda falamos. Alguns autores mencionam que a Bonarda argentina simplesmente não tem parentesco com as variações italianas e que seria a uva Charbonneau do Savoie (França), também chamada de Douce Noir, ou a Corbeau do Jura (França), ou Charbono (da Califórnia).

 

Seja como for os vinhos da Bonarda argentina tem definitivamente sabor bem distinto dos homônimos italianos. Na Itália a Bonarda dá normalmente vinhos correntes, sem grandes destaques, enquanto na Argentina esta casta pode gerar desde vinhos frutados, agradáveis, alegres e com boa acidez, que podem ser provados jovens, até exemplares de grande estrutura, concentrados, barricados e para boa guarda em adega.

 

Torontés

 

Uma das melhores novidades em surgidas em nosso mercado nos últimos anos são, sem dúvida, os vinhos brancos argentinos elaborados com a casta Torrontés.

 

Como acontece com inúmeras outras castas, a Torrontés tem sua origem não totalmente conhecida, gerando controvérsias. Como ex-colônia da Espanha (onde existe uma casta homônima), uma teoria bem aceita é que a Torrontés tenha sido introduzida na Argentina por imigrantes bascos. Por outro lado alguns argentinos reivindicam a Torrontés como autóctone. Enquanto isso cientistas sugerem que a Torrontés argentina nada tem a ver com a espanhola e que seria um cruzamento genético da italiana Moscato de Alexandria com a nativa Criolla Chica.

 

Seja como for, não há apenas um tipo de Torrontés na argentina. Ao menos três variações bem distintas são conhecidas, a Torrontés Riojano (a mais plantada e mais aromática), Torrontés Sanjuanino (um meio termo) e a Torrontés Mendocino (menos aromática, mais comum na Patagônia).

 

O estilo geral do vinho Torrontés, que tem agradado em cheio aos brasileiros, é de líquidos muito perfumados, algo entre um Moscatel e um Gewurztraminer. Os aromas mais típicos são de muitas flores (rosas), pêssegos e lichias. Na boca pode ir do totalmente seco, passando pelo suave (com algum açúcar residual) e chegando ao totalmente doce, para a sobremesa. A região de maior expressão da Torrontés na Argentina é em Cafayate, na província de Salta, norte do país. Lá a altitude de mais de dois mil metros, com sol forte e temperaturas que podem variar 30 graus do dia para a noite, garantem a maturidade e o grande frescor destas uvas.

 

Os brancos da uva Torrontés devem ser apreciados na juventude, com um ou dois anos de idade e são uma opção mais em conta em vinhos aromáticos (notadamente os Gewurztraminers franceses e alemães, excelentes, mas que podem custar caro).

 

Veículo: Gazeta Mercantil


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